Rio de Janeiro, 22 de Dezembro de 2024

Quais as chances do novo presidente?

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Sábado, 22 de Dezembro de 2018 às 06:29, por: CdB
Amigos perguntam-me sobre o futuro do governo Bolsonaro. Pergunta de um milhão de dólares. Ninguém sabe, e seria temeridade dizer o contrário. Mas algumas reflexões podem ser feitas para nos ajudar a pensar o futuro. Por Elimar Pinheiro do Nascimento, de Recife:
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Como será o governo Bolsonaro?
O primeiro elemento a ser considerado é a forma como o capitão chegou à Presidência. Com poucos recursos financeiros, sem tempo de TV e sem alianças partidárias que lhe dessem capilaridade política. Ganhou na interpretação do momento político, do sentimento popular de rejeição do establishment político, em particular ao PT; da compreensão da demanda das populações quanto à segurança, combate à corrupção e criação de emprego. E, em comunicação moderna: falando direto com as pessoas pelas redes sociais. Sem intermediação, como disse no momento de sua diplomação. É, portanto, uma figura ímpar no cenário político. “O homem é um mito”.[1] Autoreconhecidamente despreparado para o cargo, mas confiante nas relações diretas e “sinceras” com seu eleitorado. “Não sei de economia, mas chamarei os melhores”, diz, com singeleza. E seus eleitores aplaudem: ”O homem é transparente, não fica enrolando”. O segundo sinal é sua figura, natureza e características. De suas declarações antes e durante a campanha eleitoral pode-se afirmar que o capitão é declaradamente defensor da ditadura, admirador de torturadores, contra o aborto, contra o casamento gay, contra a demarcação de terras indígenas, homofóbico, racista e a favor da radicalização da reforma trabalhista (“É melhor ter emprego e poucos direitos do que ter direitos e não ter emprego”). Uma expressão bruta de sentimentos e opiniões disseminadas no âmbito de nossa sociedade, reconhecidamente conservadora. “O homem é sincero, diz o que pensa”. O terceiro traço é a marca maior de seu governo. Conseguiu trazer a si as três instituições dignas de respeito e credibilidade entre a maioria dos brasileiros: as forças armadas, as igrejas e a família. Em todas as sondagens de opinião são estas as instituições campeãs na confiança da população. É uma blindagem extraordinária e de grande resistência. “Esse é que é um ministério. Sem ladrões e sem corruptos, ao inverso do governo da Dilma”. Não importa o quão verdadeiro ou inverídico isso seja. O quarto aspecto refere-se à composição do governo: militares, evangélicos, conservadores, técnicos e uns poucos, muito poucos, políticos. Fez questão de formar seu governo em conversa com setores diversos, menos os partidos. Os políticos foram consultados por meio das bancadas: da bala, do agronegócio, dos evangélicos etc. Quando os 22 ministros estavam firmados, chamou os partidos. O capitão tem um senso de comunicação extraordinária. Seu governo vai caminhar sob três trilhos. Se um deles falhar, engata os outros no caminho do brejo. A economia é o primeiro trilho, para isso criou um superministério, cujo desafio é retomar o crescimento econômico com criação de emprego. E formou uma equipe de não se botar defeito. As críticas adversárias dizem respeito à orientação (liberal) e não à composição. O ministério da Justiça é o segundo, onde colocou a figura jurídica de maior prestígio do País, e deu os meios para responder à demanda de segurança e de combate à corrução. Finalmente, as reformas que dependem dos órgãos da presidência, onde também se montou uma equipe diversa, cruzando militares com políticos tradicionais, e de medidas administrativas que devem provir de origens distintas. Se o emprego começar a surgir; o combate à corrupção apresentar resultados; as medidas no campo da segurança impactarem positivamente, reduzindo a sensação de insegurança das pessoas; e, finalmente, as reformas progredirem, em particular a da Previdência, será um governo vitorioso, e concluirá seu mandato fortalecido o bastante para se reeleger ou fazer seu sucessor. Não se trata de erradicar a corrupção, desorganizar o crime organizado, ou gerar empregos extraordinários, coisas sabidamente impossíveis. Nada disso. Apenas sinais positivos será o bastante. Finalmente, a oposição está dividida e enfraquecida. O Lula até pode ser solto em abril do próximo ano – não se pode ter certeza quanto às decisões do STF – e, embora o PT tenha perdido menos nas eleições comparativamente a outros partidos como o PMDB e o PSDB, sua marca está desgastada. Uma corrente de oposição forma-se sem o PT, ou mesmo duas. A vertente do quanto pior, melhor, tende a ser rejeitada.  O mais grave, porém, é que a maioria da oposição não está, como nós, compreendendo muito bem o momento político. O conservadorismo tem possibilidades de se estabelecer, pelos traços anteriormente citados, mas também pela figura de seu líder. Tudo o que o capitão faz é pensando em seu eleitorado. Convida a Venezuela, depois desconvida. Embora o governo venezuelano já tivesse declarado que não estaria presente (mas isso a opinião pública não ficou sabendo, assim como não soube que o convite tinha sido feito em concordância com sua equipe de transição), propalou o ato de desconvidar. O que ficou na opinião pública, para alegria de seu eleitorado: “O homem é macho”. Porém, se os trilhos não forem percorridos corretamente, o desgaste será evidente, e a perda de coesão social apenas aumentará, com repercussões pouco perceptíveis hoje, mas certamente profundas para o rumo da sociedade. O que virá depois? [1]Todas as frases entre parênteses foram retiradas de meus grupos de conversação familiar no WhatsApp. (Publicado na revista online Será? - https://revistasera.info/quais-as-chances-elimar-pinheiro-do-nascimento/ ) Elimar Pinheiro do Nascimento - Sociólogo, doutor em sociologia, professor associado II da Universidade de Brasília, ex- diretor do Centro de Desenvolvimento Sustentável/UnB (2007/2011)
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