Desde a eleição de 2018, essas comunidades têm sido alvos de ataques a direitos, de invasões violentas de suas terras e de crimes que expõem esses povos ao genocídio. A demarcação de terras também foi interrompida – único meio de sobrevivência física e cultural para os indígenas.
Por Redação - de Brasília
O total descontrole de parâmetros básicos para a subsistência econômica do país, com o desemprego em alta e os efeitos causados por um notório descaso com a pandemia do novo coronavírus tem um novo fator agravante. O recordes de mortes e falta de perspectiva por parte do atual governo soma-se, agora, à situação crítica de mais de 900 mil indígenas, de 305 etnias, que habitam o país, segundo o Censo IBGE 2010.
Desde a eleição de 2018, essas comunidades têm sido alvos de ataques a direitos, de invasões violentas de suas terras e de crimes que expõem esses povos ao genocídio. A demarcação de terras também foi interrompida – único meio de sobrevivência física e cultural para os indígenas.
Além dessas ameaças há, ainda, o abandono do governo federal diante dos perigos da covid-19. De acordo com a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), a taxa de mortalidade entre indígenas é o dobro da registrada para o resto da população brasileira. O site da instituição mantém dados atualizados sobre a incidência da covid-19 sobre os povos indígenas.
Pandemia
Em 20 de janeiro, havia 46.190 casos confirmados, atingindo 161 povos e levando à morte 927 indígenas. E segundo estudo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a taxa de 48% de mortes em pacientes indígenas internados pelo coronavírus é a maior do país. A mortalidade supera as populações parda (40%), negra (36%), amarela (34%) e branca (28%).
Essa situação levou a Apib a ingressar com uma Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (a ADPF 709) contra o governo Bolsonaro. A ação foi acolhida pelo Supremo Tribunal Federal em agosto de 2020. Assim, o STF determinou que o governo federal adote medidas de proteção aos povos indígenas durante a pandemia.
O responsável pela ação foi o advogado Luiz Henrique Eloy Amado, da etnia Terena. Coordenador da Assessoria Jurídica da Apib, Terena é mais um jurista a defender o impeachment do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
Golpe de Estado
Doutor pelo Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e pós-doutor pela Escola de Autos Estudos em Ciências Sociais de Paris (EHESS), França, Terena afirma que 1.459 pessoas e organizações assinaram pedidos de impeachment de Bolsonaro até meados de agosto do ano passado.
O documento lista, entre as principais razões para o pedido de impedimento, as violações aos direitos humanos; a violação de princípios de moralidade administrativa na condução da pandemia e a participação em atos antidemocráticos pró-ditadura e em defesa do fechamento do STF. Também constam os prejuízos causados aos beneficiários do auxílio emergencial em virtude da restrição de parcelas; tentativa de golpe de Estado; atentado à soberania nacional; além dos crimes contra o meio ambiente e os povos indígenas e tradicionais.
Os povos indígenas, ressalta o defensor, vivem em situação crítica sob Bolsonaro.
— E à mercê das violações em demasia do atual presidente e seu governo, que vem negando atendimento aos indígenas que estão em áreas ainda não reconhecidas formalmente pelo governo (não homologadas) — disse Amado, à agência brasileira de notícias Rede Brasil Atual (RBA).
Direitos indígenas
Dados do IBGE mostram que as localidades indígenas estão distribuídas em 827 municípios. Desse total, 632 são terras oficialmente delimitadas. Há ainda 5.494 agrupamentos indígenas, 4.648 dentro de terras indígenas e 846 fora desses territórios. Bolsonaro e seus ministros não estariam respeitando a decisão do STF de proteger os indígenas durante a pandemia. Tampouco o cumprimento de um plano de enfrentamento à covid-19 junto a esses povos.
Eloy Terena diz que o relatório de violência do Cimi, de 2020, registrou casos de racismo e discriminação étnico culturais.
— As expressões de racismo manifestam-se por diversos meios, especialmente os virtuais, e alimentam hostilidades de populações das cidades, de vizinhos, de professores nas escolas oficiais. O fundamento mais profundo parece ser a negação dos direitos indígenas, sobretudo o direito à terra, à preservação do habitat próprio de cada Terra Indígena e do modo de vida tradicional — acrescentou.
Égide do ódio
O jurista considera interessante notar que tanto para diversas autoridades quanto para ladrões de madeira e de outros recursos naturais as ideias são as mesmas.
— Indígenas não prestam, são indolentes e malandros e querem criar Estados independentes. Fruto de preconceitos arcaicos, o racismo está ancorado na falta de respeito e na ignorância sobre a diversidade cultural brasileira e sobre a possibilidade de haver modos de vida baseados em sólidos conhecimentos que priorizam o bem-viver de todos. Sob a égide do ódio, as estruturas governamentais sustentam-se ao bel prazer da perseguição histórica aos povos originários e pela tentativa do roubo das narrativas desde a colonização — concluiu.