O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) chegou a dizer que a China criou o vírus da covid-19, propositalmente, para lucrar com a pandemia e que também não confiava na Coronavac.
Por Redação - de Brasília
Diretor do Instituto Butantan, o médico e cientista Dimas Covas revelou aos senadores da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, nesta quinta-feira, que os recorrentes ataques do governo de Jair Bolsonaro (sem partido) à China, maior exportador de vacinas do mundo, foram determinantes no atraso no envio de insumos para a produção dos imunizantes. Todo o tempo, o mandatário agiu para dificultar a aquisição dos imunizantes, afirma Covas.
— Cada ataque (do governo contra os chineses) se reflete nas dificuldades burocráticas. O que era resolvido em 15 dias, demorou pelo menos um mês. Negar isso, não é possível — explicou Dimas.
O médico ainda fez uma comparação à CPI, expondo a péssima diplomacia do governo brasileiro.
— A China é o maior exportador de vacinas para o mundo. Ela já exportou mais de 300 milhões de doses para mais de 100 países. Se temos 100 vizinhos, e 99 vizinhos são vizinhos cordiais e um vizinho é mal comportado, na festa de fim de ano, vai chamar aquele vizinho ou os 99? — questiona.
Sem resposta
Bolsonaro chegou a dizer que a potência asiática criou o vírus da covid-19 propositalmente para lucrar com a pandemia e que também não confiava na vacina Coronavac.
Covas informou ainda que a oferta de julho havia sido de 60 milhões de doses da vacina Coronavac para entrega no último trimestre de 2020 e que também pediu ajuda para habilitar uma fábrica, que produziria vacinas em 2021. Disse que não recebeu respostas do governo para nenhuma das ofertas.
Segundo Covas, no início de dezembro, o Butantan tinha mais de 5,5 milhões de doses da Coronavac prontas para iniciar a vacinação e estava processando mais 4 milhões, enquanto o mundo tinha vacinado apenas 4 milhões de pessoas ao fim de dezembro. A primeira a ser vacinada no Brasil, em São Paulo, foi a enfermeira Mônica Calazans, apenas em 17 de janeiro, quando o mundo começou em 8 de dezembro.
— O Brasil poderia ter sido o primeiro a vacinar se não fossem os percalços que tivemos que enfrentar do ponto de vista do contrato [com o governo Bolsonaro] como do ponto de vista regulatório (com a Anvisa) — afirmou o diretor do Butantan.
De acordo com o presidente do Butantan, a oferta de vacinas pela Pfizer em agosto não teria sido a primeira que o Ministério da Saúde recebeu.
— Mandei um ofício no dia 30 de julho de 2020, ressaltando a importância de tomar essa iniciativa num momento que não tinha a vacina. Ofertamos 60 milhões de doses que poderiam ser entregues no último trimestre de 2020. Um pouquinho depois, como não houve uma resposta efetiva, nós reforçamos o ofício. Em agosto, além de reforçar o ofício, solicitamos apoio financeiro do ministério para apoiar o estudo clínico, com previsão de custo de R$ 100 milhões, e para reformar a fábrica — acrescentou.
Desautorizado
Dimas Covas afirmou, ainda, que em 7 de outubro de 2020, o Instituto Butantan fez outra proposta ao Ministério da Saúde, desta vez com a oferta de 100 milhões de doses. O então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, sinalizou favorável à proposta, mas foi desautorizado em seguida pelo presidente Jair Bolsonaro, como foi publicamente divulgado no final daquele mês.
Nesta proposta de outubro, seriam 45 milhões de doses até dezembro de 2020, 15 milhões até fevereiro de 2021 e outras 40 milhões de doses até o fim de maio.
Em um vídeo com declarações de Bolsonaro, durante visita a um centro militar da Marinha no litoral de São Paulo, exibido na CPI, a pedido do vice-presidente da Comissão, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Bolsonaro declara que não compraria a ‘vaxina’ chinesa.
— Já mandei cancelar. Se ele (Pazuello) assinou, já mandei cancelar. O presidente sou eu, não abro mão da minha autoridade. Nada será despendido para comprarmos uma vacina chinesa que desconheço, mas parece que nenhum país está interessado nela — avisou.
‘Um manda…’
No dia seguinte, em transmissão ao vivo ao lado de Bolsonaro, Pazuello afirmou: “senhores, é simples assim: um manda e o outro obedece”.
Além disso, Rodrigues ainda listou uma série de manifestações de apoiadores de Bolsonaro contrários à CoronaVac, ocorridas entre agosto e novembro do ano passado. Nesse sentido, citou também um banner do governo federal contra a vacinação obrigatória.
“Ninguém pode obrigar ninguém a tomar vacina. O governo do Brasil reza pela liberdade dos brasileiros”, dizia a publicidade veiculada a partir de 1º de setembro.
— O governo federal estimulou campanha aberta contra a vacina produzida pelo Instituto Butantan — concluiu Randolfe.