Um dos alvos preferenciais de chamados à Câmara, o ministro da Fazenda se equilibra entre a necessária articulação e o apetite da oposição por polêmicas.
Por Ana Junqueira – de Brasília
Desde que assumiu o cargo de Ministro da Fazenda no terceiro governo Lula, Fernando Haddad tem sido frequentemente chamado a comparecer à Câmara dos Deputados para discussões econômicas. Se ele vai? Segundo os dados, não tanto.
Os registros da Agenda de Autoridades do ministro, indicam que ele compareceu ao Congresso Nacional apenas 5 vezes desde que tomou posse. Já o sistema da Câmara dos Deputados e do Senado Federal registram 52 chamados ao ministro.
Desses 52 chamados, por meio de requerimentos, a grossa maioria veio da Câmara: 51, contra apenas 1 convite do Senado Federal. A diferença é mais uma evidência de que, na Casa Alta, prevalecem os acordos de bastidores, ao contrário da Câmara, convertida no palco favorito de parlamentares famintos por ‘lacradas’ e polêmicas.
Apesar de não ser presença constante no Congresso, o ministro tem se encontrado com Lira e Pacheco
Convidado ou convocado?
Quem circula pelo Congresso sabe que requerimentos de convocação são uma ferramenta para provocar impacto. Quando a Comissão aprova um requerimento para convocar um membro do governo, a percepção é de que o governo sofreu uma derrota e que o convocado está em uma posição de subserviência e suspeita. Ser convocado costuma criar uma antecipação de culpa na opinião pública. Por isso, as convocatórias também são usadas como instrumentos políticos e moedas de troca em negociações: “Eu não convoco os seus e você não convoca os meus.” E segue o baile.
O resultado é que, normalmente, a oposição tende a tentar convocar. E a base, a convidar.
Qualquer deputado pode apresentar um requerimento de convocação de ministro de Estado. Uma vez pautado, o requerimento deve ser aprovado pela maioria dos membros da comissão ou do plenário. O objetivo desse requerimento é obrigar o ministro a comparecer perante a Comissão ou o Plenário para fornecer informações sobre assuntos de sua competência, sob pena de perda do cargo.
No caso do Haddad, dos 52 requerimentos, 43 são de convocação e apenas 9 são de convites. Há muitos congressistas ávidos para obrigar, de forma educada, o ministro a dar as caras no Congresso.
Quem mais chama
A necessidade da presença do ministro da Fazenda no Legislativo é indiscutível, principalmente em meio à complexidade e à importância das reformas em andamento, como a tributária. O que se observa, contudo, é um jogo de transformar a convocatória em punição, gerando exposição para causar desgaste.
Os requerentes mais insistentes são os deputados Evair de Melo (PP-ES), Junio Amaral (PL-MG) e Kim Kataguiri (União-SP). Junio Amaral se declara opositor ferrenho do governo. O deputado Evair de Melo, do centrão e da bancada do agro, tem expressado constantemente sua insatisfação com o ministro, assim como o deputado Kim Kataguiri. Mas, às vezes, quem fala o que quer quer, ouve o que não quer.
O ‘posto Ipiranga’
Os parlamentares sabem que a economia é um tema transversal e, por isso, querem que Haddad fale sobre tudo. Pede-se esclarecimentos sobre medidas econômicas, ajuste fiscal, estratégias para controle da inflação, críticas de Lula ao Banco Central, aumento de imposto sobre armas de fogo, precatórios, Farmácia Popular, apologia às drogas, agronegócio, aeronave especial, tributação das compras pela internet, produtores de leite, entre outros. Se fosse uma marchinha de Carnaval lançada agora, a versão seria “Quem sabe, sabe, chama o Haddad.” Muitos desses temas, no entanto, seriam muito mais adequados a outras pastas ministeriais. Mas todos sabem que o nome dele tem peso, e sua presença na Câmara é um evento à parte.
Emissário do Planalto
Apesar de não ser presença constante no Congresso, o ministro tem se encontrado com os presidentes das Casas. Desde sua posse, em agendas oficiais, Haddad teve 6 compromissos oficiais com o presidente da Câmara, Arthur Lira, e 8 com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (sendo mais da metade na residência oficial do presidente do Senado).
Além disso, segundo o E-agendas, mais de 180 parlamentares já foram atendidos pelo ministro em agendas oficiais. Com 377 dias úteis de mandato até o dia de hoje, pode-se dizer que o ministro tem sido bem atencioso aos pedidos de agenda dos congressistas, ele só prefere discussões e negociações em um ambiente controlado e menos exposto.
Alguém precisa fazer política
Pairam muitas críticas sobre a atuação do Executivo e seu relacionamento com o Legislativo, muitas delas devido à falta de articulação. No caso de Haddad, essas críticas parecem ganhar ainda mais peso. Talvez porque todos saibam que a política do governo precisa se transformar em benefícios percebidos pela população, e a economia é a peça chave. Tanto a oposição, que quer encurralar o Executivo, quanto a base do governo, que espera uma reversão no quadro de aprovação do governo Lula, têm seus olhos voltados para Haddad.
Ana Junqueira, é cientista política, há 14 anos nos corredores do Congresso e do Planalto, atuando com projetos de relações governamentais e políticas públicas.
As opiniões aqui expostas não representam necessariamente a opinião do Correio do Brasil