Rio de Janeiro, 22 de Novembro de 2024

Deus acima de tudo, até no STF

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Sábado, 08 de Junho de 2019 às 15:38, por: CdB
Talvez Sérgio Moro tenha de dar um tempo: antes dele, quem entrará no STF será um homem de Deus. Bolsonaro teve essa iluminação numa mensagem vinda diretamente de Deus, agora empenhado em salvar o Brasil do deboche e do pecado. Por Rui Martins, editor do Direto da Redação:
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Brasil vai deixar de ser país laico
Ao que parece, o presidente Bolsonaro gosta de brincar com seus fiéis seguidores e de mantê-los em suspense. São testados sob pressão e precisam manter a calma para não se tornarem hipertensos e terem um enfarte. Que Sérgio Moro seja forte e não se sinta preterido, pois o presidente deu a entender que seu lugar no STF, embora prometido, não é certo. Talvez funcione primeiro a prioridade religiosa, pois o diabo anda solto e é preciso acabar com os abortos e os homossexuais. Deus precisa ter no STF o primeiro jurista versado nas Santas Escrituras, capaz de punir quem transgride sua Santa Lei – mais importante, é claro, que as leis terrenas. É urgente acabar de vez com os fazedores de anjinhos, colocar nas clínicas os homens e mulheres com distúrbios homossexuais e, enfim, é urgente criar, segundo desejo da ministra Damares, uma geração de jovens capazes de se abster do sexo sem se masturbar. Por isso, talvez Sérgio Moro tenha de dar um tempo: antes dele, quem entrará no STF será um homem de Deus. Bolsonaro teve essa iluminação numa mensagem vinda diretamente de Deus, agora empenhado em salvar o Brasil do deboche e do pecado, quando conversava com o recém-nomeado corregedor do Conselho Nacional de Justiça, Humberto Martins, mesmo sendo ele um evangélico do sétimo dia. Houve um clarão e Bolsonaro ouviu uma voz íntima lhe sussurrar num dos ouvidos: “é esse o novo ministro do Supremo”. “Sim, Senhor Deus, fala que o teu servo ouve”, respondeu o presidente, extremamente feliz e honrado por ter se tornado um instrumento de Deus. “Mas um é pouco”, disse-lhe a voz divina, “você tem perto de você, no Planalto, outro fiel servidor, o irmão André Luiz (não o espírita!) Mendonça, da Advocacia Geral da União, ele é presbiteriano. Foi o Boanerges Ribeiro, aqui ao meu lado, quem me soprou seu nome. O Moro vai entender, ele é um bom juiz mas tem um defeito: segue os idólatras romanos e esse Papa vermelho não me agrada”. “Mas eu já prometi…”, conseguiu o Presidente tirar da garganta num som esganiçado. “Então despromete”, disse-lhe a voz, num tom severo, deixando claro não aceitar contestação. A ideia de se criar um novo Estado teocrático se tornou muito mais viável e possível com o advento das novas tecnologias e dos modernos meios de comunicação do tipo WhatsApp, Instagram, Twitter e Facebook. Os indianos ainda passam horas e dias em meditação, esperando o contato com a divindade. No Ocidente, tudo ficou mais rápido: basta um computador ou um celular. Lança-se a pergunta e logo vem a resposta direta dos céus. E os pastores precisam logo tornar o Brasil um país teocrático evangélico para não sofrer concorrência dos muçulmanos. Quem nos leva a pensar isso é um escritor francês, pichado tanto pela esquerda quanto pela direita, do tipo dos escritores malditos tão caros aos franceses. Trata-se de Michel Houellebecq. Em seu penúltimo livro, Submissão, acusado de islamofóbico, ele começa contando a pacata história de um professor da Sorbonne, em Paris, quando, por um mal arranjo político dos socialistas, é eleito um presidente muçulmano não pertencente ao grupo jihadista, mas um religioso tranquilo que, em pouco tempo, aproveitando da fraqueza dos socialistas e laicos, instaura a religião muçulmana na Sorbonne, na cultura francesa e na França. E, de repente, as mulheres estão todas de véu ou xador nas ruas, sem mostrar um pedaço do corpo ou das pernas, não se come mais carne de porco e a cultura francesa vai se tornando muçulmana em troca de vantagens para os professores que aceitam ir se convertendo, também para não perder o emprego. As igrejas católicas são substituídas por mesquitas e a transição se faz de maneira suave, sem choques. Bye bye Jeová ou Deus, bem-vindo Alá! O professor ganha sua cobiçada cátedra tão logo pronuncia as simples e mágicas palavras da conversão muçulmana, logo depois descobre as delícias da poligamia e sua vida é enriquecida com formosas lolitas, tudo da maneira mais oficial e legal. O sexo deixa de ser o problema opressivo da religião cristã, o pecado é menos presente e as mulheres sabem qual é o seu lugar. Se um dia a Arábia Saudita conseguir passar sua mensagem de Alá no Brasil e na América Latina, ela se alastrará como o fogo destruidor dos pecuaristas e agroplantadores bolsonaristas nas árvores da Floresta Amazônica. Alá é também homofóbico, como Jeová, e tem uma lei severa com punições ancestrais – como cortar as mãos dos ladrões ou matar homossexuais e mulheres adúlteras a pedradas. Os machões e machistas brasileiros se converterão aos milhões. Com esses castigos radicais, nem armas serão necessárias. E haverá sempre aquelas delícias às quais o professor da Sorbonne se rendeu. (Publicado também no Observatório da Imprensa) Para ler outros textos, clique aqui - https://www.correiodobrasil.com.br/Cat/direto-da-redacao/ *** Rui Martins é jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura. É criador do primeiro movimento internacional dos emigrantes, Brasileirinhos Apátridas, que levou à recuperação da nacionalidade brasileira nata dos filhos dos emigrantes com a Emenda Constitucional 54/07. Escreveu Dinheiro Sujo da Corrupção, sobre as contas suíças de Maluf, e o primeiro livro sobre Roberto Carlos, A Rebelião Romântica da Jovem Guarda, em 1966. Vive na Suíça, correspondente do Expresso de Lisboa, Correio do Brasil e RFI. Direto da Redação é um fórum de debates, editado pelo jornalista Rui Martins. O Direto da Redação completou dia primeiro de junho cinco anos de existência dentro do Correio do Brasil. Criado em 2001, pelos jornalistas Eliakim Araújo e Leila Cordeiro, em Miami, era distribuído inicialmente para 300 assinantes, hoje é lido por cerca de cem mil pessoas.
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