Rio de Janeiro, 22 de Dezembro de 2024

A solidariedade internacional no combate à extrema direita no Brasil

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Segunda, 21 de Janeiro de 2019 às 16:56, por: CdB

“Lamentar, enfurecer-se, rejeitar aquelas ou aqueles a responsabilidade da catástrofe, tudo isso é inútil”, diz a mensagem no Théâtre du Soleil.

 
Por Marilza de Melo Foucher - de Paris
  Estive no Teatro do Sol (Théâtre du Soleil) para assistir a uma peça de teatro do canadense Robert Lepage (KANATA). Para minha grande emoção o hall da entrada estava ainda decorado para o baile do Réveillon. Havia um enorme painel na porta de entrada da sala de espetáculo onde se lê: “Não deixe o samba morrer”. E uma placa de rua foi colada na entrada da sala de teatro: Rua de Marielle Franco. Dona do teatro, Ariane Mnouchkine organizou, por ocasião do Réveillon de 31 de dezembro de 2018, um grande baile em solidariedade às forças vivas da cultura brasileira. Toda a receita foi doada a 35 músicos, atrizes e atores brasileiros.
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Ariane Mnouchkine, a diretora do teatro mais popular de Paris
Traduzo aqui um resumo do painel: “Em 1º de janeiro de 2019, o Brasil, um dos países mais queridos do mundo, o maior país da América Latina, entrará em um dos períodos mais perigosos e imprevisíveis de sua história. Jair Bolsonaro será apenas um fantoche nas mãos do capitalismo desenfreado ou de um caudilho, ou mais provavelmente ambos, ainda não sabemos”.

Artistas

Em seguida, eles listam algumas das promessas daquele que acaba de subir ao comando do país, após eleito em uma campanha envenenada pelas mesmas falsas forças que intoxicaram a vitória de Donald Trump e o Brexit. No final, lê-se: “Lamentar, enfurecer-se, rejeitar aquelas ou aqueles a responsabilidade da catástrofe, tudo isso é inútil. Andaimes globais e ações globalizantes não nos pertencem. Nós, artistas de teatro, somos minúsculos. Nós podemos fazer muito pouco, mas não é nada. Não vamos deixar nossos olhos vagar em um horizonte muito vasto e indecifrável. “Isso nos desencoraja e nos dá uma desculpa para não fazer nada. Vamos fazer o que pudermos, aqui e agora. Vamos ajudar alguns artistas brasileiros a viver e trabalhar. Uma semana, um mês, algumas semanas, alguns meses. Então, aqui e agora, veremos o que mais podemos fazer.

Batucada

“É isso que o Théâtre du Soleil decidiu fazer aqui e agora: “Um Baile. Um baile brasileiro. Um baile brasileiro e solidário. Trinta e um de dezembro. Sim, um dia antes da tomada do poder por um ex-capitão do exército, nostálgico notório da ditadura militar e fascista que manteve o Brasil sob o jugo de 1964 a 1985. “Músicos brasileiros virão especialmente para esta ocasião. Atores do Sol, além disso, vão cantar. Uma Batucada nos levará. Vamos tocar, dançaremos a noite toda ou pelo menos enquanto houver bailarinos ainda valentes. “Nós não vamos deixar o samba morrer!” Assina Ariane Mnouchkine, a diretora do teatro mais popular de Paris. Ariane Mnouchkine é diretora de teatro e apresentadora da trupe que ela fundou em 1964, o “Théâtre du Soleil”. Ela também é roteirista e diretora de cinema. Além disso é uma aguerrida defensora dos direitos humanos.

Théâtre du Soleil

Durante as ditaduras do Cone Sul/Brasil muitos artistas da América do Sul tiveram sua solidariedade. O Teatro do Sol foi fundado como uma cooperativa de trabalhadores em um espírito de comunidade e, até hoje, guarda sua estrutura coletiva e goza de uma longevidade especial. Alguns dos princípios que regem o funcionamento deste teatro marcaram os espíritos: mesmo salário para todos, maquiagem dos artistas em público, sopa servida para o público, Ariane que fica na porta recebendo os ingressos fazendo o controle da entrada... Essa fantástica mulher de teatro baseia a ética do grupo em regras elementares: Um teatro pensado como um todo, onde todos participam de tudo, toda a trupe está envolvida no funcionamento do teatro (manutenção diária, recepção do público durante as apresentações). São 75 pessoas 20 nacionalidades! O Théâtre du Soleil é uma das últimas trupes, funcionando como tal, que ainda existe na Europa hoje. Uma aventura que dura quase 50 anos, graças à lealdade e carinho de um grande público, tanto na França como no exterior. A carreira de Ariane Mnouchkine é marcada por um constante questionamento sobre o papel, o lugar do teatro e sua capacidade de representar o tempo presente. Este compromisso de lidar com grades questões políticas e humanas, de um ângulo universal, é misturado com a busca de grandes formas de histórias, na confluência das artes do Oriente e do Ocidente.

Manter acesa a chama da solidariedade internacional

Podemos criticar os últimos governos franceses que mancharam a reputação da tradição da França como a Terra de Exílio. Todavia, os franceses continuam com o espirito combativo na defesa dos direitos humanos. Além da iniciativa de Ariane Mnouchkine, outras iniciativas estão surgindo para denunciar a prisão injusta de Lula e os atentados ao Estado de direito, no Brasil, e as ameaças que pesam com a chegada do governo da extrema direita de Bolsonaro. Várias associações francesas e franco-brasileiras estão organizando eventos nesse sentido e determinadas em assumir o compromisso de luta pela defesa dos direitos; por um Brasil democrático. Estas associações vêm denunciando a prisão injusta de Lula e pedem sua liberação. O fato de Sergio Moro ser Ministro de Justiça de Bolsonaro comprova o que muitos já denunciam há tempos; e é a prova da parcialidade e perseguição do juiz Moro ao cidadão ex-presidente Lula. Podemos destacar algumas delas:

Mesa redonda

Association pour la Recherche sur le Brésil en Europe (Arbre), France-Amérique Latine, Collectif Alerte France Brésil, Attac, Autres Brésil. Além de grupos que organizam os ‘Saraus do Lula’ com a cantora Mônica Passos; o núcleo do PT de Paris que vem mobilizando os partidos de esquerda na solidariedade. Recentemente a associação Arbre organizou, com grande sucesso, um evento no Instituto de Altos Estudos da América Latina (IHEAL). A mesa redonda contou com a presença de artistas e acadêmicos, jornalistas e representantes da comunidade brasileira e francesa. Eles visam criar uma rede europeia de solidariedade, por um Brasil democrático. A comissão organizadora do último evento, que contou com cerca de 200 pessoas, foi composta por acadêmicos do quilate de Juliette Dumont, Anaïs Fléchet; Silvia Capanema, Maud Chirio, Susana Bleil, Maud Chirio; o cineasta Filipe Galvon e Antoine Acker. Solicitei uma breve entrevista com a franco-brasileira Silva Capanema (1) uma das organizadoras do grande evento “Solidariedade Brasil. Intelectuais, artistas, militantes. Como agir?” no IHEAL-Instituto de Altos Estudos da América Latina (Paris 3- Sorbonne)

Entrevista

— Que outras formas de solidariedade estão previstas? — A ideia não é organizar uma rede de recepção de pessoas, pelo menos não de forma imediata e generalizada, como o artigo da RFI leva a concluir. Mas uma rede de oposição, solidariedade e resistência mobilizando apoios do meio cultural, artístico e intelectual - e militante- francês. Já existem coletivos mobilizados e associações como você já pode constatar (como Autres Bresils, amis du MST, FAL, comitê Lula, alerta França Brasil, etc), e nossa ideia é trabalhar com eles, claro. Então, as ações seriam: promoção de debates, de palestras articulando mundo brasileiro e forças expressivas da resistência na cultura e no mundo intelectual, mas também o mundo francês ou europeu. Eventos podem ser pensados, encontros... já temos algumas ideias. Mas, também: ações de mobilização da rede de solidariedade através do e-mail; comunicação e canal YouTube, escrita de textos, promoção de colóquios...Fazer intervenções em espaços abertos para nós, como pesquisadores.

Solidariedade

E, mais precisamente: trabalhar com outros coletivos para criar uma rua Marielle Franco, em Paris. Atuar pela memória de Marielle; em articulação com outros Movimentos. Também em articulação, contribuir para a campanha Lula Livre. Agir em alguns casos de apoio a pessoas ameaçadas (situações que pudermos agir, como colegas acadêmicos ou junto a entidades dos direitos humanos sobre lideranças políticas eventualmente, também em parceria com outros organismos) — afirma Silvia Capanema. Assim como o samba não pode morrer, a chama da solidariedade internacional tem que se manter acesa mais do que nunca! Hoje a ameaça pesa sobre os trabalhadores, negros, mulheres, jovens, indígenas, camponeses, sem-terra, sem teto, comunidade LGBTI, professoras, professores, cientistas e artistas brasileiros. Todos são alvo das políticas conservadoras neoliberais e autoritárias do novo ocupante do Palácio do Planalto. Marilza de Melo Foucher é economista, jornalista e correspondente do Correio do Brasil, em Paris. (1) Silvia Capanema é de dupla nacionalidade é professora na Universidade de Paris 13 e é Vice-Presidente do Conselho Departamental de Seine-Saint-Denis responsável pela juventude e luta contra as discriminações.
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