Acusado de comandar o Escritório do Crime, grupo de milicianos e assassinos de aluguel sediado em Rio das Pedras, bairro da Zona Oeste do Rio de Janeiro, Adriano era suspeito de envolvimento no esquema conhecido como "rachadinha" dentro do antigo gabinete do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) quando este era deputado estadual.
Por Redação - de Brasília e Rio de Janeiro
A ligação entre o presidente da República, Jair Bolsonaro (PL) e seus familiares com integrantes da milícia armada que domina vastas áreas do Estado do Rio de Janeiro voltaram à tona, nesta quinta-feira, após suspeitas levantadas em áudio mantido, irregularmente, sob sigilo pela Polícia Civil fluminense. O Palácio do Planalto teria oferecido cargos em comissão em troca da morte do ex-capitão da Polícia Militar (PM) do Rio de Janeiro Adriano Magalhães da Nóbrega, segundo mostram ligações telefônicas interceptadas, com ordem da Justiça, há dois anos.
Revelados nesta quarta-feira pelo repórter Ítalo Nogueira, do diário conservador paulistano Folha de S.Paulo (FSP), os áudios mostram uma das irmãs do ex-policial conversando com uma tia dois dias após a morte de Nóbrega, ocorrida em 9 de fevereiro de 2020, após um suposto confronto com a PM da Bahia, Estado no qual o miliciano se foragira da Justiça desde o começo de 2019.
Reunião
Segundo a publicação, Daniela Magalhães da Nóbrega diz à parente que Adriano soube de uma reunião envolvendo o nome dele no Palácio do Planalto e do desejo — que teria sido expresso nesse encontro — de que ele se tornasse um "arquivo morto”.
— Ele já sabia da ordem que saiu para que ele fosse um arquivo morto. Ele já era um arquivo morto. Já tinham dado cargos comissionados no Planalto pela vida dele, já. Fizeram uma reunião com o nome do Adriano no Planalto. Entendeu, tia? Ele já sabia disso, já. Foi um complô mesmo — disse Nóbrega, na gravação interceptada.
Acusado de comandar o Escritório do Crime, grupo de milicianos e assassinos de aluguel sediado em Rio das Pedras, bairro da Zona Oeste do Rio de Janeiro, Adriano era suspeito de envolvimento no esquema conhecido como "rachadinha" dentro do antigo gabinete do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) quando este era deputado estadual na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro.
Esquema
A ex-mulher e a mãe de Adriano eram lotadas no gabinete. O Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) acusou ambas de serem funcionárias fantasmas do gabinete de Flávio. Segundo a promotoria, elas repassavam a maior parte do salário recebido a um esquema de corrupção cujo beneficiário era o filho do presidente Jair Bolsonaro (PL).
Além disso, o próprio Bolsonaro, então deputado federal, defendeu o miliciano no plenário da Câmara dos Deputados em 2005.
A gravação foi colhida durante a Operação Gárgula, do MPRJ, cujo objetivo foi monitorar os passos de Adriano depois que ele se tornou foragido, além de mapear o esquema de lavagem de dinheiro da organização criminosa que ele comandava. A polícia grampeou parentes, amigos e comparsas do ex-PM por mais de um ano.
— Ele falou para mim que não ia se entregar porque iam matar ele lá dentro [do presídio]. Iam matar ele lá dentro. Ele já estava pensando em se entregar. Quando pegaram ele, tia, ele desistiu da vida — disse Daniela, dois dias depois da morte do irmão, à sua tia.
Documento
Após a informação de que cargos em comissão teriam sido distribuídos no Planalto em troca da morte do ex-capitão da PM ligado ao clã Bolsonaro, a tia (cujo nome não foi revelado pelas autoridades) faz um comentário com a outra irmã de Adriano, Tatiana.
— Daniela sabe de muita coisa, hein? — observou.
Ainda de acordo com as apurações do jornalista, “a Polícia Civil do Rio de Janeiro omitiu do relatório sobre as escutas telefônicas da Operação Gárgula a menção ao Palácio do Planalto feita pela irmã do ex-policial militar Adriano da Nóbrega, morto em fevereiro de 2020. A conversa entre Daniela da Nóbrega, irmã do ex-PM, e uma tia é classificada como de prioridade alta. Contudo apenas um resumo do diálogo entre Tatiana, outra irmã de Adriano, e a tia, ocorrido na mesma ligação, é descrito no documento”.
Procurados pela reportagem da FSP, o Palácio do Planalto e a defesa de Daniela não se posicionaram sobre o conteúdo das escutas. A Polícia Civil não comentou o caso até a publicação da reportagem. A conversa de 6 minutos e 51 segundos ocorreu no dia 11 de fevereiro de 2020 por meio do telefone de Tatiana, alvo das escutas.