A lei define que metade dessas vagas deve ser destinada a jovens de famílias com renda inferior a 1,5 salário-mínimo per capita. Além disso, há o filtro étnico que prevê uma proporção de pretos pardos e índios (PPI) equivalente à presença desses segmentos na população de cada estado da federação.
Por Carlos Ferreira Martins - de São Paulo
Aprovada em 29 de agosto de 2012, no governo Dilma Rousseff, a lei estabeleceu a obrigatoriedade de reservar 50% das vagas nas Universidades e Institutos Federais para alunos oriundos das escolas públicas, constituindo, com o Bolsa família, um dos pilares das políticas de inclusão social da história recente do país.Posição antirracista
Mas numa sociedade complexa e profundamente desigual como a nossa, as dúvidas e hesitações não se dão apenas por conservadorismo ou preconceito. Uma posição antirracista ou de defesa de equidade no acesso às oportunidades pode tender a apoiar políticas nuançadas. Pessoalmente, mantive por vários anos a convicção de que cotas socioeconômicas seriam suficientes. Afinal, pensava, negros são impedidos de entrar na universidade pública porque são pobres e não porque sejam negros. O argumento de um deputado republicano, por ocasião dos 40 anos da política de ações afirmativas nos EUA, redefiniu, para mim, o foco da questão. Ele afirmava não saber avaliar quanto teria sido importante para os negros entrar na Universidade, mas ter certeza de que havia sido e continuava sendo importante para a formação dos brancos que houvesse negros sentados a seu lado nas salas de aula. Era uma interessante maneira de lembrar que o racismo estrutural da sociedade estadunidense – e claro que isso vale para o Brasil – não se resolve apenas com a possibilidade de inclusão – ou ascensão social - de um pequeno percentual das pessoas dessas etnias, minoritárias lá, amplamente majoritárias no Brasil.Os cotistas
Negros, pardos, indígenas ou simplesmente pobres, os cotistas já demonstraram que são plenamente capazes de superar suas dificuldades iniciais e apresentar desempenho equivalente, quando não superior, à média dos colegas. Por outro lado, tem indicadores de evasão, isto é, de abandono do curso, superior aos não cotistas e certamente agravados nos últimos três anos com a pandemia e empobrecimento da população. Também é consenso que não basta permitir o acesso, é preciso garantir a permanência. Isto é garantir que o estudante pobre, negro ou não, tenha condição de pagar o transporte para a escola, a alimentação, os livros ou o acesso à internet. Garantir que não seja obrigado a largar os estudos para trabalhar 12 horas por dia em algum aplicativo de entregas. Uma política assertiva de apoio à permanência estudantil por parte das universidades é fundamental. Mas como, se ao menos 17 universidades federais estão ameaçadas de não conseguir sequer concluir este ano letivo?Carlos Ferreira Martins, é Professor Titular do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da USP São Carlos.
As opiniões aqui expostas não representam necessariamente a opinião do Correio do Brasil