Levantamento com mais de 14 mil entrevistados aponta maior respaldo à recuperação do território ucraniano, mesmo que a guerra se alongue. Pressão sobre o custo de vida, porém, pode mudar esse cenário.
Por Redação, com DW – de Bruxelas
Uma pesquisa de opinião realizada em dez países europeus indica um apoio generalizado à Ucrânia na guerra deflagrada pela invasão russa em 2022 e uma visão predominante de que a Rússia é um país adversário, mas há fatores que podem alterar essa unidade.
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As conclusões estão em uma pesquisa do Conselho Europeu de Relações Internacionais (ECFR, na sigla em inglês), que identifica uma relativa “fusão” de opiniões sobre o tema entre nacionalistas e liberais e entre esquerda e direita.
Os autores do estudo, os cientistas políticos Ivan Krastev e Mark Leonard, afirmam ser generalizada a percepção de que União Europeia (UE) e os Estados Unidos “estão agora mais fortes do que há um ano”. Além disso, 82% dos entrevistados veem a Rússia como um “adversário” ou “rival”.
Eles advertem que “a pressão sobre o custo de vida e o potencial ressurgimento da migração poderão destruir a posição conjunta da Europa” sobre a Ucrânia e, nesse ponto, a unidade é especialmente vulnerável a mudanças de posição dos americanos.
Nos próximos meses, dizem os autores, a percepção dos europeus “será provavelmente moldada mais pela inflação e pelas questões do padrão de vida do que pelos acontecimentos na frente de batalha”.
Apoio à recuperação do território ucraniano
Desde a invasão da Ucrânia pela Rússia, iniciada em 24 de fevereiro do ano passado, a Europa está demonstrando “uma unidade e determinação surpreendentes em fazer o que for preciso para apoiar a independência de Kiev”, aponta o estudo.
O relatório Unidade frágil: Por que os europeus estão se unindo pela Ucrânia (e o que pode separá-los) foi realizado com base em uma pesquisa aplicada no início de janeiro de 2023 em dez países europeus, Dinamarca, Estônia, França, Alemanha, Reino Unido, Itália, Polônia, Portugal, Romênia e Espanha, e ouviu 14.439 pessoas.
O estudo aponta para a diminuição de divergências entre os aliados ocidentais e que, à esquerda ou à direita, os partidos estão mais próximos no apoio a Kiev.
“Esta posição mostra que a opinião pública na Europa já não pretende acabar com a guerra o mais depressa possível, preferindo esperar pela recuperação do território pelas tropas ucranianas”, indica o documento.
Nos 10 países pesquisados, em média 29% querem que a guerra termine o mais rápido possível, enquanto 38% querem que a Ucrânia recupere todo o seu território, “mesmo que isso seja sinônimo de um conflito mais prolongado”.
Na pesquisa anterior, em maio de 2022, 35% responderam que o mais importante era parar a guerra o mais rápido possível, mesmo que isso resultasse na perda de territórios da Ucrânia para a Rússia.
Rússia cada vez mais vista como adversária
A percepção sobre a Rússia também endureceu: 66% veem agora Moscou como um “adversário” ou “rival” de seu país, 40% consideram que a Rússia está agora mais fraca do que antes do lançamento da sua “operação especial” e apenas 13% a veem como mais forte.
A UE é agora vista como “mais forte” do que há um ano em quase todos os países, com a exceção da Itália. Em Portugal, 58% dos inquiridos expressaram essa opinião, seguido por Dinamarca (55%), Polônia (54%), Romênia (51%), Estônia (48%), Espanha (47%), Alemanha (45%) e França (41%).
Segundo relatório, “a determinação do exército ucraniano, aliada ao sucesso em fazer recuar a ofensiva russa, conquistou apoiadores anteriormente pessimistas”, quando a opinião prevalecente era de que a guerra deveria terminar o mais depressa possível.
A Rússia é vista como um “adversário” ou “rival” por todos os países europeus inquiridos. Esta posição foi mais acentuada na Dinamarca (82%), mas também é sólida e com uma maioria na Estônia (79%), que partilha uma fronteira terrestre com a Rússia, na Polônia (79%), no Reino Unido (77%), na Alemanha (69%), na Espanha (65%), na França (59%), em Portugal (57%) e na Itália (54%) e somente mais branda na Romênia (44%).
Ainda sobre a Rússia, ao contrário da percepção sobre a UE, 47% dos inquiridos, em média, veem-na mais fraca do que há um ano, contra 32% que a consideram forte ou mais forte.
Na ultradireita, menos apoio à retomada de territórios
Essa opinião, porém, dividiu-se na Itália (42% forte ou mais forte, contra 39% fraca ou mais fraca), posição que, segundo os autores, “é menos uniforme”.
Quando lhes é dada escolha, “mais apoiadores do Irmãos de Itália, o partido governista (de ultradireita), preferiam parar a guerra o mais depressa possível, mesmo que isso signifique ceder território da Ucrânia, em vez de um longo cenário de guerra em que a Ucrânia venha a recuperar todo o seu território (42% contra 32%)”.
Esta posição está alinhada com apoiadores de outros partidos de ultradireita europeus: na União Nacional, o partido francês de Marine Le Pen (39% contra 30%), no Vox na Espanha (35% contra 31%) e no Chega em Portugal (42% contra 28%).
Preocupação com custo de vida
As preocupações com o custo de vida estão aumentando, em comparação com a pesquisa anterior, em maio de 2022. “Estes receios de não conseguir fazer face às despesas foram mais acentuados na Itália, onde 34% dos pesquisados (contra 25% na pesquisa anterior) identificaram este fato como a principal preocupação relativa à guerra entre a Rússia e a Ucrânia”. Houve altas acentuadas ainda na Espanha (28% contra 21%), França (31% contra 27%), Portugal (29% contra 25%) e Romênia (21% contra 17%).
As percepções sobre os EUA melhoraram, “com uma maioria em todos os países pesquisados a considerá-los agora mais fortes do que há um ano, ou pelo menos tão fortes como anteriormente”, e vistos como um aliado ou um parceiro necessário pela maioria nos dez países europeus inquiridos.
Segundo os autores, o aumento do apoio dos europeus a Kiev deve-se a êxitos do Exército ucraniano no campo de batalha e, no sentido contrário, de a Rússia ser vista como uma potência global “mais fraca”, e de uma menor preocupação com a perspetiva de uma escalada nuclear.
Os cientistas políticos avaliam, contudo, que esta unidade não deve ser dada como garantida e recomendam aos líderes europeus a utilizar este espaço para alcançar progressos na melhoria da resiliência do bloco.
“Em outras palavras, isso implica fazerem o que podem para equipar a Ucrânia, colocar em prática políticas sobre o custo de vida e a gestão de refugiados e, acima de tudo, aproveitar ao máximo os próximos 18 meses para se tornarem imunes a mudanças políticas do outro lado do Atlântico”, aconselham. “Se conseguirem concretizar estes elementos, poderão constatar que a opinião pública se manterá forte, ao contrário das expectativas do Kremlin.”