Rio de Janeiro, 22 de Dezembro de 2024

Proliferam os ataques a Greenwald, desde hackers da ultradireita até nacionalistas de centro-esquerda

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Terça, 10 de Setembro de 2019 às 08:34, por: CdB

Sob um cenário político carregado das partículas de ódio que se disseminam, desde as queimadas na Amazônia até as labaredas que atingem as redes sociais, o apoio ao jornalista Glenn Greenwald encara novos questionamentos.

 
Por Gilberto de Souza - do Rio de Janeiro
  A atuação do jornalista Glenn Greenwald, um dos donos da agência norte-americana de notícias The Intercept Brasil — que tem divulgado o conteúdo de um vazamento massivo de mensagens e áudios do ex-juiz Sérgio Moro, hoje ministro da Justiça e Segurança Pública; do procurador federal Deltan Dallagnol e da equipe que ele coordena, na Operação Lava Jato — está longe de ser uma unanimidade, na esquerda brasileira.
glenn-greenwald.jpgIntercept Brasil
Glenn Greenwald, editor da agência norte-americana de notícias , sofre pressões após denunciar o ex-juiz Sérgio Moro
Onde se pensava que a denúncia de um possível conluio entre o magistrado e os procuradores, para prender o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e interferir no resultado das últimas eleições presidenciais, poderia unir os discursos progressistas na tentativa de restabelecer padrões éticos e republicanos à Justiça brasileira, as redes sociais reproduzem, agora, a toada na qual Greenwald passa de herói a vilão. O trabalho do editor norte-americano, premiado desde a divulgação de conteúdo capturado na Agência Nacional de Segurança dos EUA (NSA, na sigla em inglês) por um de seus oficiais, o analista Edward Snowden; mereceu o aplauso de mais de 400 mil internautas, no grupo Apoio ao Jornalista Glenn Greenwald, coordenado pela internauta paulistana Viviane Righetti. A comunidade, segundo Righetti, pretendia-se acima dos partidos políticos e dedicada a defender a “liberdade de imprensa e a Democracia”. Do dia para a noite, no entanto, hackers assumiram o controle do grupo, que passou a elogiar o presidente Jair Bolsonaro (PSL). Retomado o controle do espaço virtual, no Facebook (FB), a administradora contabiliza a debandada de milhares de apoiadores e pede o apoio de pessoas que possam lhe ajudar a manter a página, o tráfego, e trazer de volta a audiência perdida. “Vamos em frente… Eu quero, preciso de 10 moderadores, urgentemente. Esses 10 têm que ter vontade de trabalhar, porque pode não parecer, mas damos o sangue por esse grupo. Não comemos, não dormimos… É trabalho. É resistência”, escreveu Righetti.

Nacionalismo

A disposição da internauta, em coordenar os esforços de apoio ao trabalho da Intercept, segundo afirmou, deve-se à necessidade de lutar “por um país justo, democrático”. “Lutamos por nós, lutamos por nossos filhos, nossos netos; as futuras gerações que, com certeza, merecem viver em um país democrático; não em uma ditadura em que jornalistas são perseguidos e ameaçados. Lutamos para assegurar a nossa liberdade de expressão, não podemos ficar reféns de um bando de malucos que esta governando o país”, afirmou. Os mais altos ideais da ativista paulistana, no entanto, não passariam de uma tentativa de dominação a mais entre tantas outras ações em curso para colocar o país de joelhos, diante do capital internacional. É o que entende a administradora da página no FB Cibele Laura Nacionalista: “O nacionalismo é a semente para germinar um país soberano e justo socialmente”, autodeclara-se.

Desmonte

"Só tem bobo em grupo de apoio ao Glenn. Um jornalista estadunidense enrolando o gado petista há meses; enrolando com nada que realmente possa fazer a diferença para o Brasil ou para Lula, que continua preso (grifo da autora). Enquanto essa gente, com morte cerebral, fica aplaudindo gringo peso morto, o governo Bolsonaro executa a agenda de total desmonte do Estado”, dispara Laura. Ainda segundo a Nacionalista, “vão eleger o namorado identitário do Glenn, na próxima eleição; o substituto do auto exilado na Time Square, tomando vinho caro, Jean Wyllys. Enquanto o gado se distrai com a enganação, direita e esquerda se alimentando entre si; o Brasil é depenado. Sob argumento de Estado falido, vende-se tudo, cortam-se recursos, o povo não tem emprego decente, não tem perspectiva; a cada segundo a vida fica mais difícil”. “Qual é o nosso futuro, admiradores do Glenn? Nenhum! O endividamento público é gigante, a esquerda finge sua não existência e manipula os sintomas desse câncer para produzir simulacro de oposição. De fato, é oposição ao governo, mas não é oposição ao sistema neoliberal. Se não destruir esse sistema na estrutura econômica, política e social do país, em metástase, nada, nada, absolutamente nada vai mudar”, acrescenta.

Grande capital

E Laura segue adiante: “Vamos apenas eleger um bando de inúteis vendilhões, com glamour, homossexuais, heteros; ex-pobres, ricos, ruralistas, evangélicos, brancos, negros; jovens fingindo nova política, dependurados em Luciano Huck, Mufarej, Lemann. Não importa quem se eleja, chegam lá pelas águas do grande capital e só enrolam. Esses políticos não servem pra nada à sociedade”. “O Glenn vale menos ainda. Direita e esquerda se alimentam entre si há décadas, dentro do establishment, muito bem inseridos pra manter o status quo da nossa colonização. Um país tão rico com um povo tão infantil elegendo lobos eleição após eleição, com raras exceções que ficam isoladas, fazendo pouca ou nenhuma diferença”. E dispara: “Estamos sendo extintos enquanto nação. Somos só grupos divididos, brigando, sem o elo identitário nacional. Somos nada além de gado manso brigando entre si, aplaudindo lixo. Bispo Macedo dizia que pescava seus fiéis com merda no anzol. É assim que o sistema age também. Pesca os bobos com merda. The Intercept é merda pura. Tão merda quanto Moro e a Operação Lava Jato”. Cirista O desabafo que Laura deixou em sua página, no entanto, foi pinçado pela escritora Maria Fernanda Arruda, articulista do Correio do Brasil, e reproduzida em sua linha do tempo, na mesma rede social. Dali partiu a repercussão e começaram as reações mais extremadas, vindas dos segmentos diversos no campo da esquerda brasileira. Não apenas foi alvo de palavrões e ranger de dentes, mas de uma definição que deixa claro o estranhamento que permanece no campo da centro-esquerda, desde a última campanha eleitoral. “Cibele Laura é cirista (seguidora do candidato do PDT à Presidência da República, Ciro Gomes)”. O quadro, no entanto, é mais complexo, segundo resumo de Sergio Bertoni, mestre em Filosofia pela Universidade Moscou (MGU) e ativista do Software Livre e da Liberdade de Conhecimento. — Quem serve mais ao sistema? Este é o motivo da briguinha entreguista. Seguir nesta rede depois de tudo o que já foi noticiado e provado é seguir sendo gado chamando os outros de gado — concluiu. Gilberto de Souza é jornalista, editor-chefe do jornal Correio do Brasil.
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