Com a nova atribuição, a PF poderá realizar vistorias presenciais nos arsenais dos CACs.
Por Redação, com Agenda do Poder – de Brasília
A Polícia Federal prendeu 63 pessoas com registro de colecionador, atirador desportivo ou caçador, os chamados CACs, que estavam com mandados de prisão em aberto por crimes que vão de homicídio e estupro de vulnerável a estelionato, furto e não pagamento de pensão alimentícia. As prisões ocorreram entre janeiro e julho deste ano, em meio ao processo de migração da base de dados sobre CACs do Exército para a Polícia Federal, que passou a ser oficialmente responsável pela fiscalização da categoria a partir de terça-feira.

— Só de segunda para terça foram 9 presos. Isso se deu a partir do momento que nós recebemos os dados da base do Exército. A nossa ideia é que essa ação seja permanente a partir de agora — afirmou o delegado Fabricio Kerber, diretor de Polícia Administrativa (DPA), setor da PF responsável pela fiscalização de CACs, produtos químicos, vigilância privada e passaportes.
A medida marca a primeira ação prática da transferência de competência definida ainda em 2023 por decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que busca reverter a política de flexibilização do acesso às armas adotada durante o governo de Jair Bolsonaro (PL). A decisão de centralizar na PF a regulação e o controle sobre o armamento civil foi uma das promessas de campanha de Lula.
Com a unificação dos dados no Sistema Nacional de Armas (Sinarm), a Polícia Federal passa agora a ter acesso direto e atualizado às informações de cerca de 978 mil certificados de CACs e 1,5 milhão de armas registradas em seus nomes. A expectativa da corporação é que esse novo controle resulte em um aumento significativo do número de investigações envolvendo o desvio de armas legais para o mercado ilegal.
— Nós prevemos um incremento no número de investigações a partir do momento que esse serviço e base de dados passe a ser processado pela Polícia Federal. Teremos acesso imediato de informações sobre as armas — explicou Kerber.
Vistorias e risco de cancelamento de registros
Com a nova atribuição, a PF poderá realizar vistorias presenciais nos arsenais dos CACs. Caso haja recusa ou qualquer tentativa de obstrução à fiscalização, os registros poderão ser suspensos ou cancelados. O objetivo é identificar possíveis fraudes, desvios de finalidade ou ligações com o crime organizado.
— Há um serviço que é prestado aos cidadãos brasileiros que são CACs. Então, em um primeiro momento, a Polícia Federal vai seguir prestando o serviço que era feito pelo Exército na fiscalização e registro desse público. E, depois, vai utilizar a sua expertise para aprimorar os controles e usar essas informações no âmbito de investigações que temos sobre desvio e tráfico de armas. Essa junção das duas atividades vai gerar frutos no médio e longo prazo — afirmou o delegado.
Segundo Kerber, a meta é reduzir o tempo médio de análise da documentação dos CACs de seis meses para até onze dias, além de digitalizar todo o processo, garantindo mais agilidade e transparência. A migração da base de dados, no entanto, está sendo feita de forma gradual para evitar interrupções no serviço.
As 63 prisões agora divulgadas se somam às 147 já realizadas durante o recadastramento das armas em 2023, no primeiro ano do atual governo.
Especialistas veem avanço no combate ao crime
A mudança de controle sobre o armamento civil é considerada um passo importante por especialistas em segurança pública, que apontam para a falta histórica de uma base nacional de dados confiável sobre armas nas mãos de civis. O acúmulo de registros descentralizados entre Exército e PF dificultava a atuação das autoridades no rastreamento e investigação de desvios.
— Vamos acompanhar de perto como vai ser feita essa fiscalização, mas essa mudança marca um período de inflexão no Brasil. Agora, temos a possibilidade de ter um banco nacional de dados sobre o armamento civil, o que nós nunca tivemos — avaliou David Marques, coordenador de projetos do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
A transferência da fiscalização para a PF permite ainda cruzamentos de dados com inquéritos em andamento, facilitando a identificação de CACs envolvidos com atividades criminosas ou milicianas. Para o governo, trata-se de uma estratégia de reconstrução da política de controle de armas, desmontada nos últimos anos e considerada por técnicos como um fator de risco para o avanço do crime organizado no país.
Nos próximos meses, a Polícia Federal deve intensificar as ações de vistoria e iniciar uma série de investigações com base nas informações que agora passam a integrar sua base nacional. O pente-fino poderá revelar um retrato mais claro, e possivelmente preocupante, do arsenal civil no Brasil.