Cantor e compositor mineiro deixa um legado de obras atemporais e parcerias marcantes com Milton Nascimento, Beto Guedes e Samuel Rosa.
Por Redação, com Agenda do Poder – de Belo Horizonte
O cantor e compositor Lô Borges, um dos maiores nomes da música brasileira, morreu nesta segunda-feira, aos 73 anos, em Belo Horizonte. A informação foi confirmada por sua família. Internado desde 17 de outubro, o artista estava na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) após sofrer uma intoxicação por medicamentos. Lô passou por uma traqueostomia no dia 25 e não resistiu às complicações.

Fundador do movimento Clube da Esquina, ao lado de Milton Nascimento, Lô Borges construiu uma das obras mais influentes da MPB. É dele a autoria de clássicos como Um girassol da cor do seu cabelo, O trem azul e Paisagem da janela, canções que marcaram gerações e se mantêm vivas no imaginário afetivo do público brasileiro.
Infância e primeiros acordes em Belo Horizonte
Nascido Salomão Borges Filho, no bairro Santa Tereza, em Belo Horizonte, Lô era o sexto de 11 irmãos de uma família que respirava música. A infância no bairro boêmio foi o ponto de partida para uma trajetória que se entrelaçaria à história cultural do país.
Durante uma reforma em sua casa, a família se mudou temporariamente para o centro da capital mineira, onde o destino uniu o garoto de 10 anos ao jovem Milton Nascimento, então com 20. “Sentei na escadaria, dei de cara com um carinha tocando violão, era o Bituca. Eu tinha 10 (anos), e ele tinha 20. […] Fiquei vendo o Bituca tocando violão, e ele assim comigo: ‘Você gosta de música, né, menino?’”, relembrou Lô, em entrevista ao programa Conversa com Bial, em 2023.
Pouco tempo depois, um novo encontro selaria outra amizade fundamental. “Dois meses depois, ao acaso também, andando pelas ruas do Centro de BH, eu conheci o Beto Guedes, que também tinha 10 anos, andando numa patinete. Eu fiquei encantado pela patinete, abordei o cara, o cara era Beto Guedes”, contou o músico.
O nascimento do Clube da Esquina
Com o retorno da família ao Santa Tereza, Lô passou a se reunir com amigos e irmãos nas esquinas do bairro, improvisando harmonias e letras. Milton Nascimento continuava visitando a casa da família Borges e logo se uniu às rodas musicais que dariam origem a um dos movimentos mais originais da MPB.
“Tocou a campainha lá na casa da minha mãe, era o Milton Nascimento falando: ‘Cadê o Lô?’. ‘Ah, o Lô tá na esquina, num lugar que eles chamam de ‘clube da esquina’, ele está lá’. Aí o Bituca veio com o violãozinho dele, comecei a mostrar a harmonia que eu estava fazendo, era uma harmonia do Clube da Esquina, ele começou a fazer a melodia, e aí a gente fez a parceria Clube da Esquina. E na época ele já era famoso, eu era anônimo”, relatou Lô.
O encontro transformou o cenário da música brasileira. Lançado em 1972, o álbum Clube da Esquina, assinado por Lô Borges e Milton Nascimento, é hoje considerado o maior disco da história da música nacional e figura entre os 10 melhores do mundo pela revista norte-americana Paste Magazine.
No mesmo ano, o jovem compositor lançou seu primeiro trabalho solo, o icônico Disco do Tênis, que marcou sua independência artística e o consolidou como um dos principais representantes da nova geração da MPB.
Silêncio e renascimento
Após o sucesso repentino, Lô decidiu se afastar dos holofotes e viveu um período recluso em Arembepe, na Bahia. “Eu estava vivendo a minha vida, tocando violão, eu não parei de compor, as canções foram se avolumando na minha vida, aí eu voltei em 78, com muito mais maturidade e fiz um álbum que eu considero um dos melhores álbuns que eu já gravei, que já compus, que é o Via Láctea”, contou em entrevista.
Nos anos 1980, voltou aos palcos com o disco Sonho Real (1984), em sua primeira turnê nacional. A década de 1990 trouxe uma nova geração de fãs, especialmente após sua parceria com Samuel Rosa, do Skank, na canção Dois Rios, que uniu a poesia do Clube da Esquina ao pop contemporâneo.
Produção constante e legado duradouro
Mesmo com mais de meio século de carreira, Lô Borges nunca parou de compor. A partir de 2019, manteve o hábito de lançar um novo álbum de inéditas por ano. Seu último trabalho, Céu de Giz, lançado em agosto de 2025 em parceria com Zeca Baleiro, reafirma a vitalidade criativa de um artista que jamais se repetiu.
A morte de Lô Borges deixa uma lacuna na música brasileira, mas seu legado permanece entre os mais luminosos da canção popular. Das esquinas de Santa Tereza às playlists digitais, sua obra segue como trilha da vida de milhões de brasileiros.