Rio de Janeiro, 22 de Dezembro de 2024

Uma corrente da felicidade: Abel Braga, Barjas Negre e José Serra

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Sexta, 25 de Novembro de 2016 às 11:55, por: CdB

A "máfia das ambulâncias" teve sua origem na gestão do então Ministro José Serra e permaneceu em atividade nas gestões de Barjas Negri (ambos do governo FHC), Saraiva Felipe e Humberto Costa (ambos do governo Lula) quando este foi alertado pela CGU em 30 de novembro de 2004

 

Por Maria Fernanda Arruda - do Rio de Janeiro

 

Em 04 de Maio de 2006 a Polícia Federal (PF) deflagrou a Operação Sanguessuga para desarticular o esquema de fraudes em licitações na área de saúde. A quadrilha negociava com assessores de parlamentares a liberação de emendas individuais ao Orçamento da União para que fossem destinadas a municípios específicos. Com recursos garantidos, o grupo - que também tinha um integrante ocupando cargo no Ministério da Saúde - manipulava a licitação e fraudava a concorrência valendo-se de empresas de fachada.

jose-serra.jpgInvestigações da Lava Jato sobre Eduardo Cunha revelam ligações perigosas de José Serra

Dessa maneira, os preços da licitação eram superfaturados, chegando a ser até 120% superiores aos valores de mercado. O lucro era distribuído entre participantes do esquema. Dezenas de deputados acusados. A organização negociou o fornecimento de mais de mil ambulâncias em todo o País. A movimentação financeira total seria de R$ 110 milhões, iniciado em 2001.

Investigados

Na operação foram presos assessores de deputados, os ex-deputados Ronivon Santiago e Carlos Rodrigues, funcionários da Planam (empresa acusada de montar o esquema de superfaturamento e pagamento de propinas) e a ex-assessora do Ministério da Saúde Maria da Penha Lino. O grupo ficou conhecido como a "máfia das ambulâncias" ou também "máfia dos sanguessugas".

A "máfia das ambulâncias" teve sua origem na gestão do então Ministro José Serra e permaneceu em atividade nas gestões de Barjas Negri (ambos do governo FHC), Saraiva Felipe e Humberto Costa (ambos do governo Lula) quando este foi alertado pela CGU em 30 de novembro de 2004. Os 80 deputados e senadores investigados pertenciam a vários partidos, com destaque especial para: PL (17), PTB (16), PP (12), PMDB (8), PFL (6).

Quem é Barjas Negri?

Formado em Economia pela UNIMEP, exerceu a ocupação de professor na Universidade Metodista de Piracicaba e na Unicamp. Em 1977 recebeu o título de Mestre e Doutor em Economia, ambos pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Foi secretário municipal de Educação (1979–1982) em Piracicaba, vereador (1989–1992) e secretário municipal de Planejamento (1993–1994) na gestão Mendes Thame.

Exerceu o cargo de Coordenador de Políticas Sociais e de Planejamento do Estado de São Paulo, na gestão Franco Montoro. Foi secretário-executivo do FNDE no ministério da Educação (1995 e 1996). Em 1997 assumiu a secretaria executiva do ministério da Saúde até fevereiro de 2002, quando tornou-se o ministro da Saúde. Foi secretário estadual da Habitação e presidente da CDHU na gestão Alckmin. Foi eleito prefeito de Piracicaba pelo PSDB com 120.412 votos (68,2% dos válidos) em 2004, e reeleito em 2008 com 173.108 votos (88% dos válidos).

Em 2006 teve seu nome envolvido no Escândalo das Sanguessugas, como suposto braço direito de José Serra, na liberação da compra de ambulâncias superfaturadas. Em depoimento à CPI , negou qualquer envolvimento com o esquema(claro). Porém, durante a gestão do ex-governador, Geraldo Alckmin (PSDB-SP), assumiu a presidência da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano de São Paulo.

Primeira instância

Nesse período, o TCE condenou ou responsabilizou por irregularidades praticadas em 102 contratos firmados pela autarquia. Reportagem, assinada pelo jornalista Alessandro Rodrigues, afirma que a maioria das irregularidades condenadas pelo TCE ocorreu por licitações dirigidas, aditamentos irregulares acima do percentual determinado pela lei - e prejuízo à competitividade e economicidade das unidades habitacionais construídas no período.

Mesmo o governo tendo cortado os recursos para a habitação popular, movimentou um orçamento bilionário entre os anos de 2003 e 2004, chegando a R$ 1,33 bilhão neste período. Por outro lado, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) suspendeu por três anos os direitos políticos do prefeito eleito em Piracicaba (SP). A sentença em segunda instância prevê ainda multa de R$ 253,5 mil. A decisão não é definitiva. A assessoria do político afirmou que vai recorrer e que a medida não impedirá sua posse em janeiro de 2017.

O processo foi movido pelo MP, que viu irregulares na contratação da empresa Concivi para obra da Policlínica do bairro Vila Sônia em 2006.Absolvido em primeira instância pela Justiça de Piracicaba, e o MP recorreu e levou o caso para o TJ.

Barjas Negri, que vem sendo noticiado fartamente pela imprensa, é uma figura historicamente ligada ao PSDB, seu currículo: uma folha de crimes sucessivos que cometeu e comete e que, não todos, mas os mais significativos, estão ligados ao seu mentor, Jose Serra.

CPI dos 'Sanguessugas'

A divulgação sobre as investigações da PF comoveu o mundo político. Notícias da imprensa à época registravam: "Cidadãos de verdade não podem aceitar nem que supostos crimes de tucanos deixem de ser investigados, nem que petistas forjem acusações contra os adversários. Aqui se trata de uma questão de justiça. A Comissão Parlamentar de Inquérito sobre a privataria precisa ser instalada para que se saiba qual dos lados agiu criminosamente.

Segundo Humberto Costa (líder do PT na Câmara, os documentos falam por si só ao tornar público esquema de lavagem de dinheiro com a participação de líderes do PSDB e pessoas próximas do ex-governador José Serra que “conseguiram mandar para fora do país e trazer para o Brasil dinheiro supostamente proveniente de propinas”, disse.

Tráfico de pessoas

“O livro vale a leitura e, imagino, será objeto de algumas providências legais a serem tomadas por procuradores da República. Até porque muitos dos crimes descritos no livro não prescreveram”.

Logo,inicia-se a operação "apaga incêndio". O presidente da Câmara, Marco Maia, explicou que as assinaturas serão conferidas pela Secretaria Geral da Mesa no início de 2012 e, se o pedido cumprir todas as exigências regimentais, a CPI será criada no próximo ano juntamente com as comissões parlamentares de inquérito sobre o tráfico de pessoas e sobre trabalho escravo. (Carta Capital).

O PT ganhou tempo, protelou e ajudou a arquivar o assunto. Em discurso feito no plenário da Câmara dos Deputados, o deputado Protógenes Queiroz (PCdoB-SP) afirmou que a Casa “faltou com o respeito ao povo brasileiro” . “Primeiro foi o presidente do PT, Marco Maia quem engavetou” disse Protógenes “. E agora o atual presidente Henrique Eduardo Alves, que é do PMDB, que tem a vice-presidência da República deu o golpe final, engavetando a CPI de vez. Isso é uma indignidade, uma falta de respeito para com o povo brasileiro e para com este parlamento”.

Privataria

Em seguida, o deputado Candido Vaccareza, líder do governo na Câmara dos Deputados, o presidente daquela Casa, deputado Marco Maia, e a própria presidente Dilma Rousseff deram declarações contrárias à instalação da CPI da Privataria, proposta pelo deputado comunista Protógenes Queiroz, que já contabilizara mais assinaturas do que as 171 necessárias. O que registrou a imprensa naquele momento: "Que a grande mídia e o PSDB agora minimizem as denúncias contidas no livro A Privataria Tucana depois de tentarem (sem sucesso) escondê-las, é compreensível.

Ambos estão envolvidos nas denúncias – os tucanos por terem conduzido o processo e a mídia por ter feito grandes negócios com o que foi privatizado. Resumindo: a impressão que se tem, quando as autoridades supracitadas se manifestam contrariamente à investigação da privataria, é a de que têm o rabo preso de alguma forma, ainda que não se saiba qual”.

Cassação

Fim de junho de 2006, e criada a CPI Mista dos Sanguessugas com finalidade de concluir as investigações sobre o esquema de fraude em licitações para a compra de ambulâncias. Esta, composta por 17 deputados e 17 senadores, e presidida pelo deputado Antonio Carlos Biscaia (PT-RJ). A vice-presidência era do deputado Raul Jungmann (PPS-PE), e a relatoria do senador Amir Lando (PMDB-RO). A CPI investigou um total de 90 parlamentares (87 deputados e 3 senadores). Além disso, 25 ex-parlamentares também são suspeitos de pertencer a "máfia das ambulâncias".

Em 10 de agosto de 2006 aprovou um relatório parcial em que foi recomendada a abertura de processo de cassação de 72 parlamentares. A lista seguiu para os Conselhos de Ética de cada uma das casas do legislativo, aos quais caberia decidir sobre a abertura dos processos de cassação de mandato. Destes, nenhum foi cassado.

‘Moneicred’

Em agosto , a corregedoria do senado abriu uma investigação sobre os três senadores supostamente envolvidos no escândalo: Magno Malta (PL-ES), Ney Suassuna (PMDB-PB) e Serys Slhessarenko (PT-MT). Por 9 votos a 4, o Conselho de Ética da Câmara decidiu nesta quinta-feira que não irá abrir processos contra parlamentares acusados de irregularidades em legislaturas anteriores. A decisão beneficia diretamente os deputados Paulo Rocha (PT-PA), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e João Magalhães (PMDB-MG).

Se o entendimento fosse outro, eles poderiam ser processados por suposta participação nos escândalos do ‘mensalão’ e do sanguessugas. A maioria dos deputados concordou com o relator, Dagoberto (PDT-MS), de que se foram reeleitos, os parlamentares não podem ser punidos politicamente porque receberam a absolvição das urnas. Todos os representantes da base aliada no conselho votaram a favor do relator.

Saúde

Apenas a oposição se manifestou contrariamente (licitação, crime contra a ordem tributária, corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha). Nesse momento, tivesse o PT agido com ética, não iria mais adiante afundar na lama que procurou ocultar. Caso Dilma Rousseff tivesse tido a sua defesa mais bem feita, a decisão dos deputados, alegando a absolvição pelas urnas, seria posta, como inviabilização do pedido de Janaina Paschoal.

Em 2 de novembro de 2006 a imprensa informava: "A Polícia Federal está de posse de um conjunto de informações que estabelecem uma clara ligação do empreiteiro de Piracicaba, Abel Pereira, com o esquema de ambulâncias na gestão de Barjas Negri, braço direito e sucessor de José Serra no Ministério da Saúde, durante o governo FHC. Em entrevista à revista IstoÉ, Luiz Antônio e Darci Vedoin, chefes da máfia dos sanguessugas, revelaram que Abel “operava dentro do Ministério da Saúde para nós”.

Sanguessugas

“Era ele quem conduzia todo o processo e fazia sair todos os empenhos... Era um operador, uma pessoa indicada e muito ligada ao Barjas Negri, secretário executivo do Ministério quando José Serra era o ministro e seu sucessor”. “Quando o Serra saiu, ele assumiu o Ministério e foi indicado o Abel para continuar a operar”, disse Darci Vedoin. O grupo de Abel controla 11 empresas que incluem uma pedreira, uma companhia de limpeza urbana e até uma empresa factoring. E é justamente na Ativare, antiga Moneicred factoring, hoje em nome da mulher de Abel, Raquel, que a Polícia Federal suspeita que o dinheiro vindo da Planam era lavado.

Nos últimos 18 meses, as empresas de Abel Pereira faturaram R$ 10,4 milhões em Piracicaba, equivalente a 40% de tudo o que a Prefeitura gastou em obras.Ele não era funcionário do Ministério da Saúde, mas se utilizava de um crachá de “terceirizado permanente”, emitido pelo ministro e, com isso, ele tinha trânsito livre a qualquer dia e qualquer hora no prédio do Ministério da Saúde. “Logo que Barjas assumiu o Ministério, o esquema mudou”. “O que era feito com os parlamentares passou a ser operado pelo Abel.

Família Vedoin

Ele liberava todos os recursos no Ministério e nós pagávamos a ele 6,5% do que recebíamos” disse Darci. Entre os documentos entregues à justiça pelos donos da Planam, estão cópias de pelo menos 15 cheques emitidos pela Klass (empresa dos Vedoin) e que foram entregues a Abel Pereira. O que a imprensa noticiou então: “A Polícia Federal já tem em mãos também gravações de várias conversas realizadas entre Abel Pereira e a família Vedoin. Segundo a Polícia Federal, as fitas mostram que Abel Pereira teria oferecido R$ 4 milhões para tentar comprar o silêncio dos Vedoin.

A PF anunciou que vai abrir esta semana um inquérito policial específico para investigar toda a documentação e as gravações que envolvem sua atuação durante a administração Barjas Negri e José Serra no Ministério da Saúde. Todas essas evidências da atuação criminosa junto à máfia dos sanguessugas não vêm recebendo a devida atenção por parte de 'certa' mídia. Ao invés de cobrar explicações sobre as propinas, comprovadas pelos donos da Planam com farta documentação, incluindo cópias de cheques e depósitos bancários, ela tergiversa e, para encobrir os crimes dos tucanos, concentram suas páginas apenas na divulgação da operação de compra do “Dossiê Serra”.

Ambulâncias

Na sede da prefeitura, Abel transita com a mesma desenvoltura que fazia no Ministério da Saúde. "As empresas da família de Abel conseguiram nada menos do que 37 obras . Suas empresas faturaram R$ 10,4 milhões nos últimos 18 meses, o equivalente a 40% de tudo o que a prefeitura gastou em obras.

Em uma delas, cuja licitação foi vencida pela empresa Concovi, de propriedade de seu irmão, o edital da prefeitura estipulou um critério sui generis. A licitação, ocorrida em outubro de 2003, exigia que as empresas que participassem da concorrência deveriam ter a fábrica de asfalto distante no máximo 20 Km da sede da prefeitura. Naturalmente só a empresa da família de Abel cumpria esta exigência”.

Serra x Lula

Darci Vedoin revelou ainda que o esquema das ambulâncias se intensificou muito no período que vai da derrota de Serra até a posse de Lula na Presidência em 2003. “Depois que eles perderam a eleição, o Abel me procurou e passamos a fazer muitas liberações”. E, realmente, como observou a IstoÉ, As coisas saíam muito rápido”.

Perguntado pela revista se o ministro José Serra sabia que nos bastidores dos eventos de entrega de ambulâncias em que ele participou, um em Cuiabá e o outro em Sinop, havia um esquema de propinas, Luiz Antônio Vedoin respondeu:

— Era nítido a todos.

Todos sabem, provas se produziram e se acumularam. Brasília jamais desejou que se tomassem providências: nem o PSDB, nem o PT. Será, agora? Duvido.

Maria Fernanda Arruda é escritora, midiativista e colunista do Correio do Brasil.

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