"A salvação da esquerda brasileira está na formação da nova militância. Nunca a classe trabalhadora esteve tão mal e o presidente da República é de esquerda. O governo manteve o modelo econômico do neoliberalismo e nunca levantou um clips para reacender o movimento de massa. Isso é arte do imobilismo." A crítica foi feita por João Pedro Stedile, coordenador nacional do MST, durante encontro com bate-papo com jornalistas cariocas, no início da semana.
Economista formado pela PUC-RS com pós-graduação no México, Stédile criticou "a essência claramente neoliberal" do governo Lula.
- A economia nacional está em crise, vai mal, e isso está relacionado com a forma de fazer, com o modelo neoliberal adotado pelo governo. O Estado brasileiro foi seqüestrado pelo capital estrangeiro e a taxa de juros é muito alta. E não tem nada de mercado, como dizem. É espoliação pura. Nem a própria esquerda tem noção do que isso representa. Lula não está no centro da decisão política deste país. Ele lê nos jornais as taxas de juros. Não manda bosta nenhuma.
Stédile participa da luta pela reforma agrária desde 1979 e é um dos fundadores do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), o mais importante movimento social das últimas décadas no Brasil. Filho de pequenos agricultores de origem italiana, nasceu em Lagoa Vermelha (RS) e teve participação ativa na Comissão Pastoral da Terra (CPT). Para o dirigente, a crise da esquerda e do governo é trágica.
- Há uma crise ideológica, já que a forma partidária entrou em crise. Parte disso está relacionada à falta de continuidade da esquerda em fazer política. Sou filiado ao PT e, nos últimos 10 anos, em que participei de muitas reuniões do partido, nunca foi discutido o projeto de governo. Eles apequenaram o projeto de governo. A política ideológica passou longe do processo eleitoral e, por isso, o quadro, no momento, é trágico. A esquerda brasileira está brincando de faz de conta - afirmou.
Desafios
À vontade, no Bar Aparelho (como é chamado a série de eventos que conta com convidados na sede do sindicato dos jornalistas do Rio) - "não é aquele ambiente enfadonho" - Stédile disse que, após muita reflexão sobre a crise, o MST identificou cinco desafios que devem ser vencidos para contorná-la. O primeiro é estimular todo tipo de luta social, pois, "se não lutarmos, só vamos para trás". Em segundo, é preciso formar militantes.
- A esquerda brasileira é uma merda, já que abandonou a formação de militantes de quadros. A Igreja, o Exército, a burguesia, todos ainda formam seus quadros, mas a esquerda, não. Precisamos fazer uma autocrítica séria. A revolução só vai ser feita se tivermos quadros preparados para isso. É uma medida vital para a sobrevivência da esquerda. O terceiro desafio é construir os meios de comunicação da classe trabalhadora, adequando-os aos avanços tecnológicos. A classe trabalhadora tem que ter seus próprios meios de se comunicar com a massa popular. O quarto é a construção, com muito debate, de um projeto para o Brasil - disse.
A burguesia, segundo Stédile, já tem o seu modelo, neoliberal:
- E a esquerda? Temos de promover um debate entre as forças populares sobre esse projeto, acumulando forças em torno das idéias. Por último, temos de modificar o método de fazer política na esquerda brasileira, que abandonou o trabalho de base e não tem mais paciência para ser reunir com vizinhos, jovens, comunidades - disse.
Indagado sobre o que poderia ser feito para mudar esse quadro, Stédile foi taxativo ao afirmar que a juventude trabalhadora das grandes cidades é o ator mais importante.
- A energia da mudança é da juventude. Os cabeças brancas, que fazem a 'revolução cotonete', servem para passar experiência para os jovens, para que eles não repitam determinados erros. Mas a velha guarda da esquerda está se aposentando ou morrendo e não estamos respeitando essa inteligência e essa experiên