Esta realidade política, de uma indigência ideológica sem precedentes na História brasileira, é o alvo do senador Roberto Requião (PMDB-PR). Em entrevista exclusiva ao Correio do Brasil, no final da tarde desta terça-feira, o ex-governador paranaense fez um relato sobre o pântano
Por Gilberto de Souza - de Brasília
Pouco antes da derrota da base aliada para o grupo parlamentar que, em seguida, derrubou o governo da presidenta Dilma Rousseff, o deputado Anthony Garotinho (PRB-RJ) afixou, com a delicadeza que lhe é peculiar, a assertiva: “O Congresso é um balcão de negócios”. A afirmativa ocorreu durante a campanha do petista Fernando Chinaglia (SP) à Presidência da Câmara, em 2014. Perdeu para Eduardo Cunha (PMDB-RJ), réu preso por crimes dos mais diversos. Entre eles, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.
Esta realidade política, de uma indigência ideológica sem precedentes na História brasileira, é o alvo do senador Roberto Requião (PMDB-PR). Em entrevista exclusiva ao Correio do Brasil, no final da tarde desta terça-feira, o ex-governador paranaense fez um relato sobre o pântano. Esse em em que o país vê afundar 16 milhões de empregos. Infestado pela inflação. Habitado por mais de 30 siglas partidária. Pontilhado de ações por improbidades distintas. Decoro questionável no Parlamento, em votações espetaculosas de 367 deputados.
Para o senador paranaense, o ambiente fisiológico na política tem gerado um fértil caldo de cultura para um possível confronto social.
— O Estado mínimo é o que desejam os signatários do documento Uma ponte para o futuro. Tende a produzir resultados catastróficos. Um conflito civil de grandes proporções não deve ser descartado no curto, médio prazo. Da forma como se encaminham as reformas neoliberais e ultrapassadas, dentro em breve ninguém mais governa — disse Requião.
Mídia golpista
No gabinete, com uma agenda hiperativa, Requião parece que está em plena campanha eleitoral. Ao longo da semana, recebeu prefeitos de uma gama de Estados brasileiros e de legendas que, em muitos casos, não faz ideia do que representam.
— Para um desses prefeitos, perguntei a que partido estava filiado. Depois que ele disse, questionei qual era a ideologia da legenda. Nem ele soube me explicar. Este é o cenário eleitoral do país, marcado por um declínio acentuado do sentido de nacionalismo. O quadro partidário atual mostra que as legendas, inclusive a do meu partido, se transformaram em cartórios. Isso precisa ser contido — afirmou.
Para o advogado e jornalista paranaense, o Partido dos Trabalhadores (PT), que enfrenta uma crise sem precedentes em sua base, “foi absorvido”. A legenda, afirma, é menor do que seu líder, Luiz Inácio Lula da Silva.
— O PT não se transformou no partido da social democracia brasileira — registrou, em tom irônico.
Os bilhões de reais destinados às empresas do grupo Globo, porém, não impedirão que os brasileiros saiam em apoio ao país, segundo Requião.
— Embora tenha sido aquinhoada com recursos bilionários, nos governos Lula e Dilma, a crise é tão imensa que não impedirá o óbvio. Por mais que veiculem o ponto de vista dos vendilhões do Brasil nas novelas, telejornais, de nada adiantará. Enquanto a Globo vende sua fantasia, na sala, o desemprego, a miséria e a violência entram pela porta da frente dos lares brasileiros — repara.
‘PEC da Morte’
Requião lembra que, ainda no primeiro mandato do presidente Lula, o procurou para repartir com ele a experiência de uma comunicação social mais atuante. Requião, durante seu governo, fortaleceu a TV pública paranaense e apoiou a mídia alternativa e independente. Para sua decepção, a resposta de Lula foi para que ele levasse o assunto ao então ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu.
— Eu fui. Chegando lá, o Dirceu disse que não precisava se preocupar com isso porque o governo petista tinha o melhor canal de TV do país à sua disposição: a Rede Globo. Depois de ouvir tal afirmação, não tive dúvidas de que o PT estava em dificuldades. O resultado está aí — repara.
O apoio das Organizações Globo, como dos setores financeiro e industrial do país, segundo Requião, “está voltado para o verdadeiro golpe, em curso, que é a PEC 241. Conhecida como ‘PEC da Morte’, a medida impõe um teto de gastos à máquina pública por 20 anos. Afeta, sumariamente, setores como Educação e Saúde.
— Essa sim, é um golpe. Entrega o país, de vez, aos interesses estrangeiros, com apoio da mídia e da banca internacional. Não pesa dúvida de que Michel Temer governa o país com essa missão, a de colocar em prática o ideário do (economista neoliberal) Milton Friedman — constata.
Pré-sal
Na análise do senador, a sequencia de erros cometidos, nos dois governos do PT, tem na raiz o profundo desejo de seus líderes de serem aceitos pela elite social e econômica do país. Crítico contumaz da presidenta Dilma Rousseff, o ex-governador ressalta que esse desejo de ser abraçada pela mídia conservadora e as grandes fortunas do país foi a causa de sua deposição.
— Dilma cedeu ao capital. Chegou a contratar o Joaquim Levy (ex-ministro da Fazenda). Se não fosse por ela, o pré-sal ainda seria do Brasil. Partiu da própria Dilma a ordem para o governo aprovar o projeto de Lei do senador José Serra (PSDB-SP). Seus conselheiros, naquele momento, eram o Eduardo Braga (PMDB-PA) e o Romero Jucá (PMDB-RR). Não precisamos ir mais longe do que isso — ressalta.
A onda privatista que varre o país, afirma o senador, representa a perda de soberania em setores como o petróleo, a água, os minerais. Significa entregar aos interesses transnacionais as indústrias estratégicas para o desenvolvimento brasileiro. Na tentativa de conter o que chama de “uma crise avassaladora”, Requião sugere algumas medidas.
— Há no Brasil uma ideologia latente, democrática, que precisa renascer. O nacionalismo, sob meu ponto de vista, aponta a saída para este panorama sombrio que se instalou no Brasil — sugere.
Candidaturas
O senador Requião afirma que não alimenta o desejo de se candidatar à Presidência da República, em 2018. Ele acredita que haverá eleição presidencial, dentro de dois anos.
— Tenho contribuído, naquilo que posso, à formação de um grupo nacionalista, de brasileiros voltados para a defesa do país. Há nacionalistas na maioria dos partidos. Até no PSDB, para se ter uma ideia. O (economista e ex-ministro da Fazenda) Bresser Pereira é um exemplo — adianta.
Quanto ao pré-candidato Ciro Gomes (PDT-CE), Requião desconversa:
— Não tenho informações suficientes sobre os propósitos de Ciro Gomes.
Mas o candidato à prefeitura do Rio Marcelo Crivella (PR-RJ), segundo o senador, “pode surpreender”.
— O Crivella é um nacionalista. Não do jeito que muita gente gostaria, mas tem posições muito mais alinhadas com a defesa do Brasil do que muita gente, aqui no Senado — defende.
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