O presidente da Rússia, Vladimir Putin, aumentará seu controle sobre o governo com um recente plano de reforma, mas corre o risco de minar o regime democrático instalado depois do fim da União Soviética, disseram analistas e liberais nesta terça-feira.
Um dia depois de Putin invocar o violento sequestro ocorrido na escola de Beslan e o combate ao terrorismo para justificar a implementação de mudanças no sistema eleitoral, o canal estatal de TV mostrou entrevistas com autoridades elogiando as medidas.
As reformas podem terminar com a escolha por voto popular de governadores. Os candidatos seriam selecionados pelo presidente e aprovados pelas assembléias regionais. Também seriam eliminados os distritos eleitorais para o Parlamento, uma forma importante de os partidos oposicionistas conquistarem cadeiras. Os legisladores seriam eleitos no futuro apenas com base em listas nacionais.
Segundo adversários de Putin, as mudanças propostas são mais uma prova de que o ex-espião, que desde sua posse, quatro anos atrás, calou os meios de comunicação independentes e transformou o Parlamento e o governo em meros confirmadores de suas políticas, está fazendo o regime democrático andar para trás.
Analistas que publicam artigos em jornais, alguns deles críticos mas menos influentes que a TV, descartaram a idéia de que as mudanças poderiam unir a sociedade após o drama de Beslan.
Mais de 300 reféns morreram, metade deles crianças, depois de separatistas chechenos terem invadido a escola no começo do mês.
Alguns analistas contestaram a garantia dada por Putin de que as mudanças propostas não violavam a Constituição pós-soviética.
- As mudanças não resolvem os problemas do terrorismo - disse um especialista próximo do governo ao jornal Vedomosti.
- As autoridades estão apenas usando essa oportunidade para aumentar seus poderes e não há nada de incomum nisso - sentenciou.
Segundo Stanislav Belkovsky, chefe do Instituto de Estratégia Nacional, as medidas de agora não seriam mais eficientes que as reformas feitas anteriormente pelos dirigentes para consolidar seus poderes.
- Nosso atual sistema de poder é muito parecido com uma gangue de crime organizado em toda a Rússia - escreveu no Vedomosti.
- O principal objetivo de tais gangues é coletar dinheiro em territórios específicos e garantir a segurança dos que fornecem o dinheiro. Claro, mesmo gangues precisam de estabilidade. Mas uma estabilidade ao estilo delas, em que os líderes continuam no poder por décadas - ressaltou.
Outros analistas concordaram que as reformas aumentariam o controle do governo central, mas advertiram sobre a possibilidade de um revés na forma de perda de confiança da opinião pública.
- Essas reformas vão destruir os intermediários entre Putin e o povo. Alguns países vão bem sem essas pessoas, mas apenas se os partidos políticos gozarem de confiança. Nunca houve confiança nos partidos políticos da Rússia e as coisas estão piorando- disse Boris Makarenko, do Instituto de Tecnologias Políticas.