Rio de Janeiro, 22 de Dezembro de 2024

<i>Que se vayan todos!</i>

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Quinta, 28 de Julho de 2005 às 19:49, por: CdB

"Quanta verdade suporta, quanta verdade ousa um espírito?
Cada vez mais essa se tornou para mim a autêntica escala de aferição de valor".
Friedrich Nietzsche, "Ecce Homo"

Junho e julho foram meses muito difíceis. Todos os que se preocupam com o futuro do Brasil ficaram desalentados e até deprimidos. Fomos obrigados a encarar a verdade, sem rodeios e sem fantasias: a degradação e a desmoralização da atividade política no nosso país alcançaram níveis alarmantes, comprometendo gravemente os interesses nacionais. Escrevo regularmente para a imprensa há dez anos. Não me recordo de ter tido, em nenhuma outra época, tanta dificuldade para escrever.

Num primeiro momento, as denúncias e os escândalos tiveram como resultado a eliminação de focos de contestação às políticas do Ministério da Fazenda e do Banco Central. A existência desses focos dentro do governo ainda alimentava a expectativa, provavelmente ilusória, em todo o caso cada vez mais débil, de que o presidente Lula pudesse caminhar aos poucos para políticas macroeconômicas menos acovardadas e mais condizentes com o desenvolvimento da economia.

Pior foi a sensação de que a crise política serviria apenas para destroçar o PT e o governo Lula, deixando intactos partidos como o PSDB e o PFL, que foram os principais veículos da implantação de uma agenda antinacional nos anos 90. Poderia estar se criando um cenário que permitiria a eleição, em 2006, de um Fernando Henrique Cardoso ou equivalente.

Esse cenário parece agora menos provável. A crise é sistêmica. As denúncias e indícios de corrupção estão se espalhando para todos os lados. Todos os principais partidos, PT, PSDB, PFL, PMDB, vêm sendo atingidos. Algum desses partidos, pergunto, resistiria a uma investigação?

Evidentemente, nada disso desculpa falcatruas e irregularidades do PT e do atual governo. E digo mais: não é o tipo de argumentação que possa evitar o impeachment, caso o envolvimento do presidente da República venha a ser comprovado.

Mas, convenhamos, as investigações têm que ser amplas e irrestritas. Um dos pontos altos do ridículo nacional foi a declaração do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso sobre a conveniência de manter o foco das investigações no atual governo. Confrontado com evidências e indícios de que o seu partido também andou participando de esquemas de corrupção e financiamento irregular de campanhas eleitorais, FHC saiu-se com o seguinte: "A crise é hoje. O que aconteceu no passado, no meu governo, é coisa da História".

Declaração curiosa, que suscita a pergunta: o governo Fernando Henrique Cardoso resistiria a uma investigação?

A pretensão de poupar o passado é descabida. Tanto mais que estão se acumulando informações que apontam para o seguinte: os esquemas do sr. Marcos Valério, em formato muito semelhante ao que foi montado com o PT, têm antecedentes nas relações do publicitário com o PSDB e com o PFL, principalmente com os tucanos mineiros.

Estamos chegando aos poucos à conclusão de que a identidade entre PT e PSDB é bem maior do que se pensava. Não se limita à política macroeconômica, mas envolve também os métodos e modalidades de financiamento de campanha. Continuidade na economia, continuidade na corrupção.

Chega! Vamos nos apropriar do grito de guerra dos argentinos: Que se vayan todos!

Paulo Nogueira Batista Jr., economista e professor da FGV-EAESP, é autor do livro "O Brasil e a Economia Internacional: Recuperação e Defesa da Autonomia Nacional" (Campus/Elsevier, 2005). Escreve às quintas-feiras, a cada quinze dias, na Agência Carta Maior. E-mail: pnbjr@attglobal.net

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