O que será de nós, os ficantes no PT? Não sabemos. A batalha vai em meio, e esta batalha é apenas a primeira de muitas que virão. Que será de vós, os saintes? Ninguém sabe. Podereis formar nova esquadra, ou vos dispersareis no Cabo das Tormentas que é a fundação de um novo partido?
O título - que não volte ninguém - é a minha contrapartida ao que se vayan todos!, que volta e meia leio como comentário sobre a presente crise política do governo, do Congresso e do PT. Endereço-o de coração aberto a vós, que saís agora do partido, nesse momento, aparentemente para vós, tão bem escolhido. Companheiros e companheiras, ou ex-, por favor, amarrai (ou desamarrai, se assim for melhor) os cintos e boa sorte!, neste novo caminho, ide sem olhar para trás e como dizia minha avó, de santos dizeres, que les vaya bien y que no les piquen los mosquitos.
Vamos combinar uma coisa, entretanto: momentaneamente, vamos abolir o uso da palavra "traidor" entre nós. Esta é uma palavra vetusta, das de registro mais antigo na língua portuguesa, sob a forma de "traicion", ainda no século XII, antes mesmo da consolidação política do Condado Portucalense.
Ela vem de um verbo latino trádëre, que quer dizer "entregar", "dar em mão", "passar a outro", "confiar", "dar" (estou citando o Houaiss). Tem parentesco com a palavra "tradição", que significa um "legado" que é "entregue" de geração em geração. Também isso explica o uso corrente da palavra "entregar" com o significado de "trair" e também a idéia da "traição" conjugal no caso do adultério: o ou a "trainte" vai "dar", "entregar" a outrem o que deveria legar apenas ao traído.
E nós estamos assistindo, hoje, no país, o festival da traição: X entregou Y que entregou Z, cuja secretária entregou A, se bem que a ex-mulher de B entregou ele próprio mais D e E e no meio disso alguém entregou o alfabeto inteiro e C entregou Jefferson que entregou Dirceu que não entregou Lula, como torcia a imprensa conservadora.
A semana vai terminando bem em meio a esse festival de entregas: essa mesma imprensa teve de engolir - regorgitando vitupérios - a eleição de Aldo Rebelo, antes avacalhado como azarão irremediável, o PMDB rachou mais ainda (se é possível geléia rachar), PSDB e PFL tiveram de cantar uma fraca "vitória na derrota", dizendo que o deputado Nonô fizera bonito, e novamente para desgosto daquela mesma imprensa, quem foi para o segundo turno no PED foi o imperturbável e ínclito Raul Pont, depositário dos dezesseis anos de sucesso da administração petista em Porto Alegre. Lembremos aos que gostam, hoje, de apregoar que na última eleição o PT foi "varrido" daquela prefeitura que alternar vitórias e derrotas é normal numa democracia, e que antes do PT, em eleições livres, jamais aquele eleitorado tinha confirmado uma situação, preferindo sempre a sucessão de oposições.
Neste quadro, quando digo que devemos suspender momentaneamente, saintes e ficantes, o uso da palavra "traidor" entre nós, me refiro não só a uma questão de cortesia (estou tentando atravessar essa crise, ao contrário de outras que já vivi, sem perder um único amigo) mas ao fato de que uns e outros na verdade não sabemos o que está sendo "entregue" por outros e uns. O que será de nós, os ficantes? Não sabemos. A batalha vai em meio, e esta batalha é apenas a primeira de muitas que virão. Que será de vós, os saintes? Ninguém sabe. Sereis felizes na procela que vos aguarda? Podereis formar nova esquadra, ou vos dispersareis no Cabo das Tormentas a contornar que é a fundação de um novo partido na presente circunstância? Ou sereis apenas um aglomerado de pequenas embarcações, tentando manter o mesmo rumo, mas sem organicidade? Impossível dizer. Mas me arrisco a fazer alguns comentários sobre vosso gesto, assim, de bom humor, e sem ofender o caráter nem a família de ninguém. Vamos falar de política entre nós, não de moralismo.
O primeiro comentário é o de que sa