Rio de Janeiro, 21 de Dezembro de 2024

Outro jornalismo é possível?

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Sexta, 06 de Fevereiro de 2004 às 09:48, por: CdB

Qual a qualidade do jornalismo que estamos fazendo? Essa reflexão se dirige, é importante que se diga logo de saída, a todos os graus do espectro ideológico - com perdão pela expressão. E, de um modo muito particular, dirige-se àqueles profissionais que tentam fazer algo que vamos chamar aqui de "jornalismo crítico" (com todas as limitações e simplificações que essa expressão acarreta). E é por ter uma certa (e arriscada) pretensão de universalidade que ele - o texto - não vai recorrer a exemplos, as "muletas da faculdade de julgar", segundo a formulação do filósofo alemão Immanuel Kant. A leitura diária daquilo que conhecemos como "notícia" é uma oportunidade para refletir sobre a própria natureza do jornalismo, sobre o que ele se tornou enquanto gênero discursivo que pretende informar e formar a opinião da população. Não há aqui a pretensão de apresentar nenhuma novidade exatamente; tampouco de levantar receitas mágicas para os problemas enfrentados. É mais um convite à reflexão, uma proposta de olhar para o próprio umbigo.

Uma das primeiras coisas que chamam a atenção, na enxurrada de textos à nossa disposição diariamente, é a ausência de idéias razoavelmente estruturadas e de argumentos explicitamente formulados. Para além dos conceitos e preconceitos que "inspiram" os textos (e sua edição), há uma permanente tendência em apresentar uma cadeia - mais ou menos aleatória - de "fatos" e depoimentos com uma pretensão de "descrever" o que está acontecendo. As aspas justificam-se aí, pois o que é apresentado como "fato" não passa de uma construção conceitual (muitas vezes tortuosa) do próprio autor (e/ou editor) do texto. Há um certo padrão onde, aparentemente, não existe nenhum: tantas pessoas participaram de tal evento, fulano de tal disse isso, sicrano disse aquilo, uma faixa dizia aquilo outro, a palavra tal foi empregada tantas vezes, etc. O título que sintetiza essa diversidade pretende apresentar a "essência" do que está sendo descrito. Palavras e frases se sucedem sem que a "intenção" do autor do texto seja expressa claramente como uma idéia central que estrutura o discurso. A palavra "intenção" está sendo utilizada aqui, no sentido de construção conceitual, como se tentará explicitar mais adiante.

Há algo oculto no texto?

Esse déficit de transparência não implica, porém, afirmar que o texto "esconde" a realidade. Para o leitor "atento" (palavra utilizada aqui no sentido de desperto, acordado, não entorpecido), não há nada oculto no discurso. A intenção está entranhada nas próprias palavras, na forma pela qual elas são articuladas, nos recursos gráficos de que a notícia dispõe, na escolha das frases, na escolha ou na construção dos fatos, na enunciação da notícia, na forma e no conteúdo da reportagem escrita ou transmitida. Mas, como a figura do leitor atento representa uma esmagadora minoria, pode-se falar de um espaço de ocultamento em um âmbito mais geral do discurso jornalístico.

Talvez um dos elementos estruturantes desse tipo de discurso possa ser encontrado em um mito caro à formação jornalística, a saber, o de que o jornalista limita-se a "reportar" o que vê e ouve, separando a "descrição" da "opinião". O bom texto jornalístico, ensinam os manuais de redação, limita-se a "reportar", a "descrever" o "fato", como se isso fosse possível sem a presença prévia de conceitos (e preconceitos) estruturadores da narrativa. Tudo se passa como se a mais simples escolha de uma palavra para "descrever um fato" fosse abençoada com a marca da inocência. O problema é que, no limite, jamais há uma "descrição" de um "fato", mas sempre uma construção, e que, em nome de uma desejável transparência na relação entre autor e leitor, essa construção deveria ser apresentada de forma mais clara.

O déficit democrático no discurso

Há um, digamos, déficit democrático na relação autor-leitor na medida em que esse processo de construção de fatos mascara-se sob um

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Edições digital e impressa
 
 

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