Rio de Janeiro, 21 de Janeiro de 2025

O custo da falta de ousadia

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Quarta, 01 de Dezembro de 2004 às 08:13, por: CdB


É impossível dar respostas definitivas, sem controvérsias, a perguntas hipotéticas sobre os acontecimentos atuais. No entanto, grande parte do debate internacional atual está centrado justamente numa questão desse tipo: o mundo é um lugar melhor sem Saddam Hussein no poder? Esse tipo de pergunta leva inevitavelmente a outra: o mundo não estaria melhor se o dinheiro e o esforço investidos na guerra no Iraque tivessem sido destina os a outros fins, por exemplo, para ajudar as pessoas pobres?

É difícil acrescentar algo novo à quantidade enorme de informações e comentários que já circulam sobre esses assuntos. Porém, é justamente o que este relatório do Social Watch /Observatório da Cidadania faz, ao iluminar essas questões de outro ângulo - o das organizações populares de todo o mundo que estão na linha de frente da batalha contra a pobreza e a discriminação. Quando prevalece a lógica da guerra, a voz de civis é silenciada, seus sofrimentos são ignorados e até mesmo suas mortes deixam de ser contabilizadas.

A análise da situação do Iraque apresentada neste relatório foi fornecida pela Associação Al-Amal, a única ONG nacional ativa no país. A Al-Amal, antiga integrante da coalizão internacional do Social Watch, já dava informações de dentro do Iraque muito antes da guerra, com uma visão crítica tanto do regime de Saddam como das ameaças dos Estados Unidos contra aquele regime.

Com independência e coragem similares, organizações da sociedade civil da Colômbia denunciam os excessos do governo e da oposição armada na guerra civil de décadas que assola o país, enquanto o Peru dá um exemplo dramático de como o terrorismo e o terrorismo de Estado se combinam para converter pobres e indígenas em vítimas silenciosas e ignoradas de uma "guerra suja". Os meios de comunicação internacionais e nacionais cobriram amplamente essa "guerra contra o terrorismo". Como foi possível que o genocídio contra a população indígena tenha passado despercebido? Essa é a pergunta feita pela sociedade peruana, num exercício saudável para evitar a repetição desses erros.

Da mesma forma, milhares de pessoas morrem diariamente no mundo de causas facilmente evitáveis, sem que isso vire manchetes na mídia. O mundo se perguntará em alguns anos - como o faz o povo peruano agora - por que ninguém tomou as decisões para evitar essas mortes? Se for assim, nenhuma pessoa que governa um país poderá alegar que não foi advertida. Numa entrevista recente à Australian Broadcasting Corporation, o presidente do Banco Mundial (Bird), James Wolfensohn, reclamava da enorme desigualdade entre os gastos governamentais com despesas militares globais e o financiamento de programas de desenvolvimento. "Destinamos cerca de US$ 50 bilhões para gastos com o desenvolvimento e US$ 1 trilhão para despesas militares; acho que há um desequilíbrio", disse ele. Outras vozes têm apontado conseqüências ainda piores: vítimas civis diretas, violações dos direitos humanos em grande escala, crescente xenofobia e desrespeito às leis internacionais.

Ainda é muito cedo para avaliar a extensão dos danos causados por conflitos que mataram milhões de pessoas a um sistema legal e institucional internacional, com a Organização das Nações Unidas (ONU) em seu centro, construído cuidadosamente ao longo de décadas. No entanto, está claro que a desconfiança do público na palavra daqueles(as) que o lideram não contribui para fortalecer a democracia. Quando os governos fazem promessas, uma parte substancial da opinião pública tende a mostrar-se cética. Afinal, há cinco séculos, Nicolau Maquiavel, fundador do que hoje é conhecido como "ciência política", justificou essa incredulidade ao afirmar que "um príncipe nunca carece de razões legítimas para quebrar suas promessas".

Por outro lado, o colunista estadunidense Herbert Agar, ganhador do Prêmio Pulitzer, atribuiu enorme valor às promessas feitas durante os tempos difíceis da Grande Depressão: "A

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