Rio de Janeiro, 21 de Dezembro de 2024

O bolsa-madame e o bolsa-família

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Quinta, 19 de Fevereiro de 2015 às 13:00, por: CdB
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Mulheres de deputados querem uma boquinha: passagens pagas pelo governo para acompanhar os maridos nas viagens
Um grupo de mulheres de deputados reúne-se num chá oferecido por uma delas. O convidado de honra é Eduardo Cunha. No cardápio, um pedido para que volte um benefício que garante às madames passagens de graça para acompanhar os maridos. O que isso diz sobre a sociedade brasileira? Machismo em alto grau partindo de mulheres. Hipocrisia de uma elite carcomida que combate políticas públicas para os mais pobres, mas não se acanha em usar e abusar das mordomias do Estado. A uma ex-catadora de papelão, que se tornou presidente da Petrobrás, não é permitido roubar. Se roubou ou não pouco importa. Não é com isso que as madames bem-nascidas estão preocupadas. Ela simplesmente não pode roubar. Os maridos iluminados podem. Num mundo em que todos comam, onde todas as classes, cores e credos sejam julgados da mesma maneira, como madame poderá ser madame? Como aeroportos poderão ter o vazio sepulcral dos lugares reservados a privilegiados? É dolorosamente atual a frase de Raymundo Faoro: “Eles querem um país de 20 milhões de habitantes e uma democracia sem povo”. E como dói constatar que, depois de tantas lutas por direitos iguais, elas também querem isso. Não são todas, é claro, para alívio da nação, mas a composição do Congresso que toma posse neste domingo, 1º de fevereiro de 2015, não deixa dúvidas quanto ao caráter conservador, machista, preconceituoso, da maior parte da sociedade brasileira. O dinheiro pode ser livre – para quem convém que seja livre. Seres humanos têm que viver presos. Presos à moral alheia, presos a dogmas. E, aqueles que “não deram certo”, presos a grades. Quiçá, mortos. Num país de senzalas inconfessas, não é de se espantar que distintas senhoras não se contentem em viver à custa de homens. Querem mamar nas tetas do erário. Não lhes envergonha em nada receber o “bolsa-madame”. Faz parte da nossa tradição secular. Se forem vistas por aí em alguma passeata contra a roubalheira na Petrobras e contra o bolsa-família, dirão que estão lutando para salvar o Brasil. E serão capa da maior revista semanal, como já foi o “caçador de marajás”. A honestidade dos que dizem lutar contra a corrupção me comove.
Ana Helena Tavaresjornalista, conhecida por seu site de jornalismo político Quem tem medo da democracia?, com artigos publicados no Observatório da Imprensa e na extinta revista eletrônica Médio Paraíba. Foi assessora de imprensa e repórter dos Sindicatos dos Policiais Civis e dos Vigilantes. Universitária, entrevistou numerosas pessoas que resistiram à ditadura e seus relatos (alguns reproduzidos na Carta Capital e Brasil de Fato) serão publicados brevemente num livro. Direto da Redação é um fórum de debates com jornalistas de opiniões diferentes, editado pelo jornalista Rui Martins.
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