À esquerda de Lula e do PT e com uma posição definida em favor de um processo revolucionário, o ex-candidato à Presidência da República pela legenda do Partido da Causa Operária (PCO), jornalista Rui Costa Pimenta, tem alguns senões à proposta petista
Por Redação - de São Paulo
O líder petista Luiz Inácio Lula da Silva, em entrevista à emissora de televisão "TRT World", da Turquia, transmitida nesta quarta-feira, defende eleições diretas. Para o ex-presidente, a convocação das ‘Diretas Já!’ para a Presidência da República seria a melhor saída para o Brasil, no momento.
— O que é que o povo imaginava? O povo imaginava que se você tirasse a Dilma, você ia ter a escolha de um outro presidente pela via direita. E é isso que nós achamos que deve acontecer. O Brasil não pode ficar mais 2017, mais 2018, nesta situação como está, com um presidente rejeitado como o Temer é — disse Lula.
Lula apresenta a solução para o impasse político.
— Eu acho que a melhor solução agora é os partidos políticos conversarem e, quem sabe uma PEC, uma emenda constitucional, e recuperar o direito do povo escolher seu Presidente da República outra vez pelo voto direto — acredita.
Em uma longa entrevista, o ex-presidente falou ainda sobre outros pontos que considera cruciais para o país. Ele destacou as conquistas econômicas e sociais de seu governo e deixou em aberto a possibilidade de concorrer a um novo mandato em 2018.
Voz dissonante
À esquerda do PT e com uma posição definida em favor de um processo revolucionário, como forma de avançar nas conquistas sociais, o ex-candidato à Presidência da República pela legenda do Partido da Causa Operária (PCO), jornalista Rui Costa Pimenta, tem alguns senões à proposta petista. Em recente artigo publicado na página da agremiação política, Pimenta lembra que “desde o início do processo eleitoral, assinalamos que se tratava de uma armadilha para toda a esquerda e o movimento operário e popular. Eleições em tempo de golpe, vitória dos golpistas”.
Segundo o dirigente partidário, a orientação fundamental para a militância é “a denúncia do golpe de Estado e, logicamente, do processo eleitoral organizado e controlado pelos golpistas”.
“A atividade eleitoral da esquerda mostrou claramente que, para a maioria, golpe é uma espécie de metáfora política, ou seja, não é um verdadeiro golpe. Isso já tinha sido colocado em evidência pela tentativa de atenuação do impacto da palavra golpe por adjetivos como “palaciano”, “parlamentar”, “institucional”, ou seja, a denominação golpe de Estado não descrevia o fato. Essa confusão levou à reivindicação oportunista de eleições, diretas ou gerais, política esta esconjurada pelo resultado eleitoral”, afirma Rui Pimenta.
Ironia política
Para o editor do diário Causa Operária, “o resultado eleitoral foi inesperado para a esquerda dominada pela fantasia do golpe de faz-de-conta. Toda a esquerda retrocedeu em número de votos em relação à eleição de quatro anos atrás, com a única exceção do PCO, que obteve um crescimento de 72%. Um caso notável, que mostra o sentido da crise da esquerda, é enorme retrocesso do PSTU, que perdeu mais da metade dos seus votos, fazendo uma campanha sistemática em defesa do golpe”.
O crescimento eleitoral do PCO, uma verdadeira ironia política, no entanto, precisa ser compreendido claramente, porque não representa nenhuma verdadeira vitória da luta pelo voto e sim um fortalecimento partidário que se manifesta apesar das limitações impostas pelas eleições. Primeiramente, o crescimento deveu-se a um fortalecimento do Partido que nada tem a ver com as eleições, mas com a luta política dos dois últimos anos contra o golpe”.
Direta no STF
Apesar das advertências do PCO, o desejo do ex-presidente Lula pode estar mais perto do que ele imagina. Uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF), que cochila na gaveta do ministro Luís Roberto Barroso, tem o poder de, uma vez aprovada, mudar o curso da história. Em caso de queda do presidente de facto, Michel Temer, por qualquer razão que seja, seriam convocadas eleições diretas para os cargos de presidente e vice.
O ministro relator, Luís Roberto Barroso, já liberou a ação. Basta que presidente do STF, Carmén Lúcia, coloque o assunto em pauta para que o STF avalie e vote, no Pleno do Tribunal. Quando voltar do recesso, em início de fevereiro, o Tribunal Superior Eleitora (TSE ) tende a julgar se a chapa presidencial eleita em 2014, composta por Dilma Rousseff e Temer, cometeu ilegalidades na campanha e, por isso, deve ser cassada. Caso ocorra o julgamento, o Supremo terá um bom motivo para avaliar o voto do relator Barroso.
De acordo com o artigo 81 da Constituição Federal, caso os cargos de presidente e vice fiquem vagos após a metade do mandado de quatro anos, o presidente que concluirá o tempo restante deve ser eleito pelo Congresso, pela via indireta. Mas este mesmo Congresso aprovou, no ano passado, uma alteração no Código Eleitoral. Estabeleceu que, caso a cassação pela Justiça Eleitoral ocorra faltando ao menos seis meses para término do mandato, a eleição deve ser direta.
Pesquisa
É essa a questão em julgamento no Supremo. O primeiro voto em contrário às eleições diretas partiu do procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Ele moveu, em maio, uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) em que pede que a corte considere a mudança do Código Eleitoral incompatível com a Constituição. Sustenta, assim, que a eleição teria que ser indireta caso a chapa presidencial seja cassada a partir de 2017.
Para a Clínica Direitos Fundamentais da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), no entanto, a mudança na legislação eleitoral seria, sim, compatível com a Constituição. A instituição solicitou, em outubro, participar da ação como amicus curiae (amigo da corte) com esta argumentação contrária à PGR.
A maioria da população, no entanto, acompanha a sugestão do ex-presidente Lula. Pesquisa do Instituto Datafolha, da semana passada, aponta que 63% dos entrevistados são favoráveis à renúncia de Temer neste ano para que haja eleição direta antes de 2018.
Argumentação
Ouvido pela agência britânica de notícias British Broadcasting Company (BBC), nesta manhã, o professor titular de direito constitucional da UERJ Daniel Sarmento é o advogado que elaborou a argumentação da Clínica de Direitos.
“Seu principal argumento é que a nova redação do Código Eleitoral cria uma distinção entre a situação em que os cargos ficam vagos por decisão da Justiça Eleitoral e as demais situações, como afastamento por impeachment, morte ou doença. Dessa forma, se presidente e vice forem afastados por questões não eleitorais (impeachment, morte, etc) após metade do mandato, o artigo 81 da Constituição continuará a ser aplicado e a eleição deverá ser indireta”, conclui a BBC.