Rio de Janeiro, 30 de Outubro de 2024

Inconstitucionalidade e ilegitimidade

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Quinta, 08 de Setembro de 2005 às 07:28, por: CdB

Propostas que defendem revisão constitucional e convocação de uma nova constituinte, como a recentemente aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, apresentam o insanável vício de inconstitucionalidade e de ilegitimidade.

No último mês foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados a proposta de revisão constitucional, que prevê a Assembléia de Revisão Constitucional e reduz o quórum para a aprovação de emenda à Constituição. A esta proposta somam-se outras, como a que defende a convocação de uma nova constituinte, com o objetivo de elaborar uma nova Constituição.

Estas propostas, contudo, apresentam o insanável vício de inconstitucionalidade e de ilegitimidade.

São inconstitucionais porque a própria Constituição, fruto de Poder Constituinte Originário, estabelece o procedimento para a sua reforma, por meio da adoção de emendas à Constituição, fruto do Poder Constituinte Derivado Reformador. Este Poder Derivado, como não poderia deixar de ser, sofre limitações impostas pelo Poder Originário, nos âmbitos formal, material e circunstancial.

Isto é, para se mudar a Constituição, há que se respeitar a regra do jogo constitucional, não cabendo a um poder derivado e limitado usurpar seus próprios limites, em afronta direta à Constituição e à sua supremacia. Além disso, tais propostas deflagrariam temerária situação de instabilidade institucional, comprometendo os avanços introduzidos pela Carta de 1988. Traduziriam o vício da ilegitimidade de um "poder de desconstituição", sendo um golpe e uma fraude, como bem assinala José Afonso da Silva.

Há que se ressaltar que a Constituição Federal de 1988 simboliza o marco jurídico da transição democrática e da institucionalização dos direitos humanos no país. O texto constitucional demarca a ruptura com o regime autoritário militar, com vistas a resgatar o Estado de Direito, a Democracia e os direitos fundamentais. O valor da dignidade da pessoa humana, como fundamento do Estado Democrático de Direito, impõe-se como núcleo básico e informador de todo ordenamento jurídico.

Consagra a Carta de 1988 um avanço extraordinário na consolidação dos direitos e garantias fundamentais. É a primeira Constituição brasileira a iniciar com capítulos dedicados aos direitos e garantias, para, então, tratar do Estado, de sua organização e do exercício dos poderes. A Constituição Federal de 1988 celebra a reinvenção do marco jurídico normativo brasileiro no campo da proteção dos direitos humanos.

Consagra, assim, o ritual de passagem da lente "ex parte principe", inspirada nos deveres dos súditos, para a lente "ex parte populi", inspirada nos direitos dos cidadãos. Ineditamente, os direitos e garantias individuais são elevados a cláusulas pétreas, passando a compor o núcleo material intangível da Constituição. Há a previsão de novos direitos e garantias constitucionais, bem como o reconhecimento da titularidade coletiva de direitos, com alusão a sindicatos, a associações e a entidades de classe.

Além disso, a Constituição aprimora a tônica democrática, ao delinear a Democracia Participativa, mediante a instituição de mecanismos de participação direta da vontade popular (como o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular) - instrumentos que poderiam ser ainda mais fortalecidos, como propõe o importante projeto de lei n.4718/2004, no marco da Campanha Nacional em Defesa da República e da Democracia. Lembre-se que, de todas as Constituições brasileiras, é a Carta de 1988 a que apresenta o maior grau de legitimidade popular. Como realça Paulo Bonavides: "a Carta de 1988 é a Constituição cidadã, a Constituição da normatividade dos princípios, a mais idônea de todas as épocas republicanas, a mais rica em potencial democrático".

Considerando o grau de legitimidade da Carta de 1988, bem como os significativos avanços por ela introduzidos -- em contraposição com a flagrante inconstitucionalidade e i

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