Homem cria máquina que produz absorventes na Índia
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Sexta, 14 de Março de 2014 às 09:09, por: CdB
Um homem simples de uma família pobre na Índia revolucionou a saúde feminina em países de baixa renda ao inventar uma máquina que produz absorventes baratos. Para testar o produto, ele até criou um "útero artificial", com uma bexiga e sangue de cabra. Num país extremamente conservador e supersticioso, os experimentos de Arunachalam Muruganantham para desenvolver sua invenção tiveram grande custo pessoal ele quase perdeu sua mulher, sua mãe e chegou a ser expulso de onde vivia. Mas manteve seu senso de humor.
- Tudo começou com a minha mulher - diz. Em 1998, ele era recém-casado e seu mundo girava em torno de sua esposa, Shanthi, e sua mãe viúva. Um dia ele viu que Shanthi estava escondendo alguma coisa dele. Ficou chocado ao descobrir o que era, "trapos asquerosos" que ela usava durante a menstruação.
Quando ele perguntou por que ela não usava absorventes higiênicos, ela disse que não sobrariam recursos para comprar o leite.
Querendo impressionar sua jovem esposa, Muruganantham foi à cidade para comprar absorventes. O produto foi entregue a ele apressadamente, como se fosse contrabando. Ele o pesou em sua mão e se perguntou porque 10 gramas de algodão, que na época custava dez paise (o equivalente a menos de um centavo de real), eram vendidos por 4 rúpias (cerca de R$ 0,40) - 40 vezes mais. Ele decidiu que poderia fazer absorventes mais baratos.
Ele produziu um absorvente caseiro de algodão e deu a Shanthi, exigindo retorno imediato. Ela disse que ele teria que esperar por algum tempo só então Muruganantham se deu conta de que a menstruação era mensal.
- Eu não posso esperar um mês para cada avaliação, vai demorar duas décadas (para aperfeiçoar o produto)! - afirmou. Ele precisava de mais voluntárias.
O tamanho do problema
Muruganantham descobriu, então, que quase nenhuma mulher nas aldeias vizinhas usava absorventes - menos de uma em cada dez. Suas descobertas foram comprovadas por uma pesquisa realizada em 2011 pela AC Nielsen, encomendada pelo governo indiano, que constatou que apenas 12% das mulheres em toda a Índia usavam o produto.
Muruganantham diz que nas áreas rurais o uso é ainda mais raro. Ele ficou chocado ao saber que as mulheres não só usavam trapos velhos, mas outras substâncias como areia, serragem, folhas e até cinzas.
As mulheres que fazem uso de panos muitas vezes sentem vergonha de secá-los ao sol, o que significa que eles não são desinfectados. Aproximadamente 70% de todas as doenças reprodutivas na Índia são causados por falta de higiene menstrual - que também pode influenciar a mortalidade materna.
Encontrar voluntárias para testar seus produtos não foi tarefa fácil. Suas irmãs se recusaram. Então, ele teve a idéia de se aproximar de mulheres estudantes na faculdade de medicina local.
Apesar dos obstáculos culturais que dificultam esse tipo de abordagem, ele conseguiu convencer 20 alunas a experimentar seus absorventes. Só que no dia em que ele foi recolher os formulários de avaliação, viu três delas respondendo às pressas. Essas opiniões não eram confiáveis, pensou.
Foi então que o inventor decidiu testar os produtos em si mesmo. "Eu me tornei o homem que usava um absorvente", diz ele .
Ele "criou um útero" fazendo alguns furos em uma bexiga de futebol e enchendo-a com sangue de cabra. Um ex-colega de classe, um açougueiro, passava em sua porta e tocava a campainha da bicicleta sempre que ele ia matar uma cabra. Muruganantham recolhia o sangue e misturava com um aditivo que recebeu de outro amigo em um banco de sangue para evitar que coagulasse muito rapidamente - mas isso não melhorava o cheiro.
Muruganantham caminhava, pedalava e corria com a bexiga de futebol debaixo de suas roupas tradicionais, constantemente bombeando sangue para testar as taxas de absorção de seu absorvente. Todo mundo pensou que tinha enlouquecido.
Ele costumava lavar suas roupas ensanguentadas em um poço público e toda a aldeia concluiu que ele tinha uma doença sexual. Amigos passaram a evitá-lo. "Eu tinha me tornado um pervertido", conta o inventor.
Ao mesmo tempo, sua esposa saiu de casa. "Então você vê o senso de humor de Deus", diz ele no documentário Menstrual Man ("Homem Menstruado", em tradução livre). "Eu comecei a pesquisa para minha esposa e, depois de 18 meses, ela me deixou!"
Mas ele perseverou nos seus objetivos e resolveu analisar absorventes usados. Esta idéia trazia ainda mais risco em uma comunidade tão supersticiosa. "Mesmo se eu pedir apenas um fio de cabelo de uma senhora, ela suspeitaria que eu estou fazendo alguma magia negra para hipnotizá-la", observa.
Ainda assim, ele conseguiu ajuda mais uma vez das estudantes de medicina. O problema é que sua mãe, ao vê-lo trabalhando com aquilo, ficou horrorizada, chorou e também o deixou. "Foi um problema. Eu tinha que cozinhar minha própria comida", disse.
Mais ainda estava por vir. Muruganantham teve que abandonar a cidade para evitar ser pendurado de cabeça para baixo em uma árvore por seus vizinhos que acreditavam que assim o currariam dos maus espíritos que o haviam possuído.
A descoberta
O maior mistério para ele era descobrir do que os absorventes que funcionavam com sucesso eram feitos, mas era difícil conseguir que a indústria revelasse seu segredo. Ainda assim, mandou algumas mostras para análises em laboratório, fez contato com empresas do setor e, após dois anos e três meses, descobriu que o insumo necessário era a celulose, retirado de casca de árvore.
Mas ainda havia um obstáculo - a máquina necessária para transformar este material em pastilhas custava milhares de dólares. Ele teria que criar o seu próprio.
Quatro anos e meio depois, ele conseguiu criar um método de baixo custo para a produção de absorventes. O processo envolve quatro etapas simples. Em primeiro lugar, uma máquina semelhante a um moedor de cozinha transforma a celulose dura em um material esponjoso, que é em seguida embalado em bolos retangulares com outra máquina. Os bolos são então envoltos com uma espécie de tela e desinfectados em uma unidade de tratamento ultravioleta. Todo o processo pode ser aprendido em uma hora.
O objetivo da Muruganantham era criar uma tecnologia fácil de usar. O objetivo não era apenas aumentar o uso de absorventes higiênicos, mas também para criar empregos para as mulheres na área rual - mulheres como sua mãe.
Após a morte de seu marido em um acidente de estrada, a mãe de Muruganantham teve que vender tudo que possuía e trabalhar como lavradora. Ganhava apenas US$ 1 por dia, que não era suficiente para sustentar quatro filhos. É por isso que, com 14 anos, Muruganantham deixou a escola para encontrar trabalho.
As máquinas criadas pelo inventor são deliberadamente simples e têm estrutura aberta para facilitar a manutenção pelas mulheres. Quando ele mostrou o primeiro modelo, feito basicamente de madeira, os cientistas do Instituto Indiano de Tecnologia (IIT) foram céticos.
- Como este homem vai competir com as multinacionais? - questionaram.
Mas o objetivo não era realmente competir. "Estamos criando um novo mercado", disse.