Rio de Janeiro, 21 de Dezembro de 2024

Formação franciscana deixou marca em dom Cláudio Hummes

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Terça, 05 de Abril de 2005 às 11:54, por: CdB

Foi no final dos anos 1970, quando os brasileiros buscavam melhores condições de trabalho durante a ditadura militar, que o cardeal dom Cláudio Hummes envolveu-se na luta dos trabalhadores.

Como líder da Igreja Católica em Santo André, na Grande São Paulo, Hummes foi lançado ao cenário nacional ao apoiar trabalhadores do setor automobilístico em greve.

Quando os militares fecharam instalações de sindicatos para impedir os trabalhadores de se reunir, Hummes, então bispo de Santo André, permitiu aos grevistas que se encontrassem em suas igrejas. A ação dele foi elogiada pelos setores mais progressistas da Igreja naquela época.
Nesses dias, porém, na qualidade de arcebispo de São Paulo, seu nome vem sendo citado como um dos "principais candidatos para suceder o papa".

Filho de imigrantes alemães do Rio Grande do Sul, o cardeal, 70, seria o primeiro papa vindo da América Latina.

Pessoas familiarizadas com o Vaticano afirmam que a nacionalidade dele seria importante a fim de aproximar a Igreja do mundo em desenvolvimento.

A América Latina é lar de alguns dos cenários mais desiguais de distribuição de renda do mundo e é um terreno fértil para o crescimento de religiões responsáveis por tirar fiéis do catolicismo, historicamente dominante na região.

Estudos indicam que a porcentagem de protestantes na América Latina duplicou durante o papado de João Paulo II (1978-2005), passando de 5 a 10% da população, com o surgimento de grupos evangélicos e pentecostais. No Brasil, as religões evangélicas passaram, no mesmo período, de 6,2% para 15,4%.

Os católicos que esperam do sucessor de João Paulo II mais flexibilidade em relação a assuntos como o aborto, os métodos anticoncepcionais e a homossexualidade podem se desapontar com o passado do cardeal brasileiro.

Mesmo que continue defendendo os direitos dos trabalhadores e seja um crítico contumaz da pobreza, especialistas em religião dizem que o cardeal ficou mais conservador com o passar dos tempos.

Fernando Altemeyer, um ex-padre que trabalhou como porta-voz do arcebispo por dois anos, disse que as idéias de Hummes foram bastante influenciadas pela formação dele como franciscano, uma ordem conhecida por seu voto de pobreza.

- O fato de ser franciscano é como um DNA que o faz um conservador liberal, o que não é muito comum, mas existe - afirmou Altemeyer, que dá aulas na Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo.

Ao menos em público, Hummes, segundo Altemeyer, sempre defendeu as idéias do Vaticano.
Cinco anos atrás, ele decepcionou liberais e católicos mais progressistas ao censurar o padre Valeriano Paitoni. Paitoni, que dirigia um abrigo para doentes de Aids no Brasil, defendia publicamente o uso de preservativos.

Recentemente, o cardeal também criticou medidas adotadas pelo governo para tornar menos restrito o acesso ao aborto.

Ainda assim, defende Paulo Carneiro de Andrade, um professor de teologia na PUC do Rio de Janeiro:

- Uma coisa é ele enquanto bispo dentro de uma Igreja em um momento que tenha uma orientação mais conservadora e outra coisa é se ele como papa manteria uma linha mais conservadora ou se tomaria posições mais abertas.

Hummes deu sinais de que, independente de quem suceda João Paulo II, a Igreja Católica precisa continuar engajada com os debates da vida moderna a fim de se preservar como uma força na sociedade.

- Ele (o futuro papa) deveria continuar com os diálogos; com as ciências, as religiões, a sociedade, a biotecnologia, a biologia, a bioética. Todas essas áreas estão avançando rapidamente e há nelas muitas coisas que precisam ser discutidas - afirmou Hummes a repórteres.

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