Rio de Janeiro, 21 de Dezembro de 2024

Especial Carnaval - Baterias surpreendem e cadência do samba levanta arquibancadas

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Domingo, 22 de Fevereiro de 2004 às 06:59, por: CdB

O mestre apita. Cerca de 250 componentes fazem as manobras para o recuo. Ele coloca os dedos nos ouvidos. Sinal de contrariedade? Não. Esta é uma técnica para identificar a harmonia de todos os integrantes e instrumentos da ala considerada o coração das escolas de samba -- a bateria.

"É para sentir somente o som da bateria e ver se ela realmente está afiada e harmonizada", disse Maria José Campos, artesã, 61 anos de idade e 20 anos de Carnaval.

O tamborim e o surdo são os dois instrumentos que sustentam o ritmo na avenida. Geralmente eles ficam nas laterais da bateria, misturados com as caixas e repiques, também considerados instrumentos pesados, presos ao corpo por alças.

Por ser grande e ter som grave, o surdo pode deixar a cadência do samba bem carregada se não tocado em linha com os outros instrumentos, como pratos, cuícas, pandeiros, agogôs, chocalhos e reco-recos, considerados leves por serem segurados com as mãos.

Quando todos os sons se misturam as pessoas de empolgam com as batidas, porém os veteranos carnavalescos identificam detalhes não percepitíveis por qualquer um.

"Achei a bateria da Gaviões (da Fiel) muito pesada. Você não consegue ouvir o samba nem distinguir os outros instrumentos. Só dá para escutar o barulho do surdo", afirmou Betânia de Sousa, funcionária pública, 43 anos, de São Vicente, que está no carnaval há 32 anos acompanhando a bateria e outras alas da Vai-Vai.
Todos têm um papel importante, assim como numa orquestra. É preciso muitos meses de ensaio para que haja harmonia e ritmo na hora da grande festa.

"Na madrugada do sábado, acredito que a bateria da Águia de Ouro foi a mais equilibrada. Ela veio numa rítmica do início ao fim", afirmou Leandro André, analista financeiro, 22 anos, que faz parte da ala musical da Imperador do Ipiranga.

As paradas da bateria e do cantor de samba podem ser boas estratégias para cativar e levantar o público, mas também são consideradas fatores de risco.

O músico e também integrante da ala dos compositores da Salgueiro, Celso Viáfora, 43 anos, disse que "as paradas de alto risco acontecem quando a bateria interrompe a batida e depois de alguns segundos volta a tocar. No caso do cantor, isso acontece quando ele pára e deixa o público cantar. O alto risco está na volta, quando pode perder o ritmo e a afinação".

Para Viáfora, as baterias da Vai-Vai e Rosas de Ouro foram as de maior destaque e impacto sobre a arquibancada. "O importante é manter a pulsação e inovar nos movimentos", acrescentou.

"Eu sinto a bateria pelo movimento do meu corpo. E se todo mundo levanta, significa que a bateria está sacudindo o povo", disse Nair Aparecida de Oliveira Dias, escrevente técnica judiciária, 45 anos de idade e 30 de samba.

Grande parte das baterias entra de costas no recuo, lugar onde ela estaciona para o resto da escola passar. Porém, algumas são ousadas e, cada vez mais, preparam coreografias e malabarismos para diversificar o movimento.

A bateria do Acadêmicos do Tucuruvi provocou o público quando ajoelhou na avenida e continuou tocando. A Águia de Ouro organizou um coração com alguns integrantes, que depois se juntaram aos ritmistas. A surpresa foi da Mocidade Alegre, que coreografou toda a bateria e recebeu aplausos do público.

É na dispersão que a bateria solta toda sua energia. Pulsando nas veias de todos os integrantes, emocionados pelo desfile, repiques ousados anunciam o fim do espetáculo carnavalesco -- o mestre apita de novo.

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