A primeira reação foi esconder a camisa. Baixou a cabeça, levantou devagarinho e caminhou em direção ao corredor
Por Theófilo Rodrigues - do Rio de Janeiro
Aconteceu com uma amiga. Baiana, residente no Rio há bastante tempo, ela estava doida para assistir um “Bahia versus Flamengo”. Anos aqui sem nunca ter ido ao Maracanã, já estava inconformada com a situação.
Um dia, finalmente decidiu: “hoje eu vou”. Uma tarde de sol forte marcou aquele domingo. Ela vestiu sua camisa do Bahia e foi ao Maraca. Sentou em seu lugarzinho na arquibancada. O estádio estava lotado. Felicidade no rosto como nunca havia sentido.
O jogo começou e já no primeiro lance o Flamengo veio para cima. A bola chutada de fora da área passou pertinho da trave. Ao seu lado todos gritaram: “Uuhhhhh”. Um suspirou com orgulho: “Que beleza de chute!”. Outro asseverou: “Começamos bem!”.
Epa! Tinha algo de errado. A emoção de estar no templo do futebol foi tanta que ela não reparou que tinha entrado na arquibancada errada. E agora, o que fazer?
A primeira reação foi esconder a camisa. Baixou a cabeça, levantou devagarinho e caminhou em direção ao corredor. “Moço, entrei na arquibancada errada, como faço para mudar de lado?”
Certamente o fato de ser mulher a protegeu naquele ambiente. Fosse um rapaz talvez tivesse levado uma coça, ou, no mínimo, um saco de xixi na cabeça.
Tanto na política, como no futebol, é preciso estar sempre atento para saber em que arquibancada estamos. Pode ser que a emoção turve nossos olhos. Mas se pararmos para olhar direitinho em nossa volta, pode ser que a gente perceba algo estranho.
Pode ser que ao nosso lado esteja um Malafaia ou um Marco Feliciano. Pode ser que atrás da gente, esteja um Eduardo Cunha ou um Cesar Maia. Ou na nossa frente, toda a família Bolsonaro. Epa! Pode ser que a gente tenha entrado no lado errado da arquibancada...
Mas calma. Não está tudo perdido. Na política é sempre possível dar um passo atrás.
Reconhecer nosso erro ou efetivar uma autocrítica é o primeiro passo.
Não é vergonha para ninguém mudar de opinião. Vergonha é não ter opinião para mudar, já disse certa vez um sábio.
Ainda há tempo de mudar de lado na arquibancada.
Ainda há tempo de reencontrar aqueles com quem compartilhamos nossos melhores sonhos.
Ainda há tempo de defender as justas causas. Lutar contra a homofobia, o machismo, o racismo e o autoritarismo. Lutar contra a pobreza e a desigualdade social.
Ainda há tempo de defender a democracia.
Antes que o jogo acabe.
Theófilo Rodriguesé cientista político.
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