Num encontro com empresários e estudiosos nesta 5ª feira, 3, o vice-presidente Michel Temer disse o óbvio ululante: será difícil Dilma Rousseff aguentar-se mais três anos na Presidência se seus índices de popularidade continuarem no fundo do poço.
Mas, tal rasgo de sinceridade é bem suspeito num político habitualmente comedido. Como se trata de reincidência --ainda está entalada na garganta de Dilma a afirmação de que o Brasil precisa de presidente capaz de unir o País--, tudo indica que Temer já esteja em campanha para herdar a cadeira.
Para que não reste dúvida, ele fez questão de reivindicar o mérito de ter sido responsável pelo fracasso da famigerada tentativa de exumação da CPMF.
A nova postura de Temer, distanciando-se do governo a olhos vistos, mais a decisão tomada por vários partidos de somarem forças para o impeachment, sinalizam que a partida se encaminha para o previsível final.
E, por favor, não culpem quem está apenas lançando mais luzes sobre um quadro facílimo de interpretar se o olharmos de forma realista e não com o passionalismo de torcedores de futebol.
POR QUE DILMA NÃO TRANSFERE A SEDE DO GOVERNO PARA A CIDADE DE DEUS?
O presidente do PT, Rui Falcão, convoca seus leitores do Facebook para a Conferência Nacional Popular que o PT e "diversas entidades e partidos políticos" promoverão neste sábado, 5, em Minas Gerais, "em defesa da democracia e por uma nova política econômica".
No site da CUT somos informados de que o objetivo de tal frente é “criticar e fazer ações de massa contra todas as medidas de política econômica e ajuste fiscal que retirem direitos dos trabalhadores e que impeçam o desenvolvimento com distribuição de renda”.
Já a presidenta Dilma Rousseff, depois de se reunir com um homem chamado Trabuco, comunicou que foram estas as ordens que recebeu do Bradesco: manter Joaquim Levy como ministro zumbi da Fazenda enquanto não virar pó em definitivo e continuar apregoando a fantasiosa meta de superavit de 0,7% do PIB em 2016, mesmo correndo o risc
FOI UMA VITÓRIA DE PIRRO. E DILMA ESTÁ PAGANDO POR ELA AGORA.
Como articulista, prezo muito a capacidade de síntese, de alguém esgotar um assunto com poucos e incisivos parágrafos.
É o que me faz recomendar duplamente o artigo desta 6ª feira, 4, do filósofo Hélio Schwartsman: pelo que diz e pela forma como diz.
Trata-se do melhor resumo que conheço da trajetória da presidenta Dilma Rousseff para o fundo do poço no qual ora se encontra, sem nenhuma perspectiva de salvação à vista.
VITÓRIA DE DILMA
Por Hélio Schwartsman |
É do matemático Alfred North Whitehead a afirmação de que toda a filosofia ocidental não passa de notas de rodapé a Platão. Se quisermos exagerar só um pouquinho mais, podemos dizer que a própria vida não passa de variações em torno das histórias e mitos gregos. Dilma Rousseff não é exceção.
Ela parece seguir os passos de Pirro 1º, rei do Épiro, primo de Alexandre, o Grande, que se envolveu num bom número das batalhas na parte europeia do Mediterrâneo no século 3º a.C. Foi numa delas, a de Ásculo, em 279 a.C., que derrotou os romanos, mas com tamanhas baixas –ele perdeu a maior parte de suas forças, bem como seus principais comandantes e amigos mais íntimos– que teria exclamado ao fim do embate:: "Outra vitória igual a esta será o meu fim!". Pirro acabaria expulso da península Itálica, mas conquistou seu lugar na história ao emprestar seu nome à expressão vitória de Pirro.
Dilma venceu a eleição do ano passado, mas é só agora que o preço vai ficando claro. Para não tomar medidas impopulares, ela prolongou para além do limite da responsabilidade uma política econômica fracassada, comprometendo assim a saúde financeira do setor público.
Pior, durante a campanha ela não apenas mentiu sobre a real situação do país e sobre as perspectivas para o futuro como, após a vitória, se apressou a adotar as medidas econômicas que acusara seus adversários de planejar. As insinceridades lhe custaram muitos pontos de popularidade, além dos aliados à esquerda.
Com as finanças públicas e o prestígio pessoal combalidos, viu-se sem recursos para seguir comprando o apoio da chamada base aliada, que agora flerta com a possibilidade de dar o golpe de misericórdia e assumir diretamente o trono, o que precipitou o país numa crise política para a qual não se vislumbra saída fácil.
Outra vitória igual a esta e será o fim do Brasil, é a frase que resume os últimos anos de nossa história.
A INICIATIVA DO HÉLIO BICUDO É POLÊMICA, MAS ELE MERECE RESPEITO.
Não sendo jurista, vou abster-me de um posicionamento sobre os aspectos legais do pedido de impedimento da presidenta Dilma Roussseff que Hélio Bicudo acaba de protocolar na Câmara Federal.
Apenas lembro que, seja ou não cabível o impeachment, Bicudo fez o que, numa democracia, qualquer cidadão tem o direito de fazer. Golpista é quem violenta a Constituição, não quem exerce um direito que a Carta Magna lhe confere.
A reação de muitos petistas nas redes sociais me deixou profundamente enojado: ao mesmo tempo em que partiam para a satanização de praxe, evidenciaram desconhecer um dos maiores heróis brasileiros!
Bicudo, hoje com 93 anos, foi o procurador de Justiça que travou luta dramática contra o Esquadrão da Morte em São Paulo, conquistando uma vitória que lavou a nossa alma numa fase em que só amargávamos derrotas.
O delegado Sérgio Fleury, tocaieiro de Carlos Marighella, tinha suas digitais impressas nos crimes cometidos por tal grupo de extermínio na segunda metade da década de 1960 (o Esquadrão nasceu no seio da Polícia Civil e foi liderado pelo Fleury quando este ainda comandava o radiopatrulhamento).
Por haver depois se tornado um dos principais assassinos e torturadores da repressão política, Fleury era ostensivamente protegido pelos militares. A ditadura chegou a criar uma lei unicamente para evitar sua prisão imediata quando virou réu de um processo do Esquadrão.
Lula e Bicudo na fase de 'lua de mel' |
Com extrema coragem, Bicudo assumiu os riscos de levar sua cruzada até o fim; o incisivo apoio que recebia do jornal O Estado de S. Paulo deve ter dissuadido o Esquadrão de atentar contra ele, pois a repercussão seria enorme, no País e no exterior, provavelmente obrigando a ditadura a responder com medidas enérgicas, ainda que a contragosto.
Bicudo deu o xeque-mate ao conseguir provar que o Esquadrão não agia com fins de faxina social, mas sim para fazer jus à mesada de um grande traficante, que contratou seus préstimos para eliminar a concorrência.
Os militares não tinham restrições morais quanto a proverem um escudo protetor para torturadores e assassinos covardes, mas a coisa mudou de figura quando se tornou público e notório que se tratava, ademais, de capangas do narcotráfico. Então, os milicos deixaram Fleury e os outros carrascos do Esquadrão entregues à própria sorte.
O primeiro sabia demais e foi dormir com os peixes, caso único de dono de barco que se afoga no ancoradouro. Os demais, acabaram condenados ou transferidos para o quinto dos inferno (ou seja, para localidades as mais distantes possíveis da capital...).
Em seguida, Bicudo ajudou a fundar o PT e foi um de seus maiores patrimônios morais até que, como vice de Marta Suplicy, assumiu a Prefeitura paulistana no final de 2004, quando ela se licenciou para disputar o governo do Estado.
Ao invés de simplesmente ficar esperando o tempo passar, resolveu governar de verdade e suas iniciativas foram muito elogiadas pela imprensa, provocando ciumeira no grupo da Marta, que o hostilizou de tal forma que a ruptura com o partido se tornou mera questão de tempo. Ocorreria no ano seguinte.
Sua decepção, contudo, vinha de longe. Em 1998 (videaqui), presidira a Comissão de Ética que o PT criou para apurar as denúncias do economista e ex-guerrilheiro Paulo de Tarso Venceslau contra o empresário Roberto Teixeira, responsável pela montagem do primeiro esquema de desvio de recursos públicos para os cofres do partido.
Foi uma satisfação à opinião pública, pois Venceslau, depois de passar dois anos recorrendo em vão à direção do PT, levara suas acusações ao Jornal da Tarde.
Os grãos petistas certamente esperavam que Bicudo fizesse um jogo de compadres. Ele, contudo, optou por uma justiça salomônica. Recomendou a expulsão de Teixeira como maçã podre e de Venceslau por ter vazado à imprensa um assunto interno do partido.
Lula, compadre do Teixeira, ameaçou desligar-se do PT. Chantageada, a Executiva Estadual avocou a decisão final e, desautorizando a comissão de ética, livrou a cara do corruptor. Bicudo teve de engolir um sapo gigantesco.
Depois do desligamento, ele se tornou um crítico contundente do PT, ao qual acusa de ter virado um partido de direita.
Apoiou José Serra na eleição presidencial de 2010 e Marina Silva na de 2014.
Suas justificadas mágoas o levaram, na minha opinião, mais longe do que deveria ter ido. Mas, mesmo que eventualmente discordemos de alguns dos seus posicionamentos recentes, temos uma dívida de gratidão para com ele. Quando mais necessário se fazia, foi um titã. Merece respeito.