Crise irreversível na Igreja Católica

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Publicado quarta-feira, 4 de maio de 2005 as 23:29, por: CdB

A eleição de Joseph Ratzinger como sucessor de João Paulo II nos revelou, finalmente, qual é a crise que a Igreja Católica realmente vive; porém, ao mesmo tempo, nos esclarece sobre qual é nossa proposta positiva de construir uma nova maneira de ser Igreja. 

Na atualidade, existem duas maneiras diferentes de ser Igreja. “A Igreja” é somente um conceito teológico que não existe na realidade, o que existe historicamente são modelos, tendências ou maneiras diferentes de ser Igreja. De maneira simples e provisória, atualmente, poderíamos distinguir uma maneira conservadora de ser Igreja e outra maneira diferente, alternativa, libertadora. Não falamos aqui de duas Igrejas, mas de duas tendências ou modelos existentes no interior da própria Igreja Católica.

A interpretação crítica que proponho é que a eleição do Cardeal Ratzinger como Papa está em plena continuidade com os 26 anos do Papa João Paulo II. O teólogo Ratzinger, braço direito de João Paulo II para questões doutrinárias e Prefeito durante 23 anos da Congregação para a Doutrina da Fé, é eleito para dar continuidade teológica e dogmática ao modelo de Igreja construído por João Paulo II. O mais importante na minha interpretação é que esta continuidade entre João Paulo II e Bento XVI torna evidente a crise irreversível e final do atual modelo conservador de Igreja.

Crise irreversível significa uma crise que já não pode ser solucionada com reformas parciais ou com mudanças puramente teológicas ou de linguagem. Uma crise irreversível é uma crise final. Não há marcha atrás; seu aperfeiçoamento somente consegue acelerar sua morte. Toda tendência conservadora ou processo de contra-reforma na Igreja gera a longo prazo uma igreja em estado permanente de crise. Não sabemos quanto tempo durará a crise. Não é importante, pois no interior da própria Igreja podem estar presentes as duas tendências ou maneiras diferentes de ser Igreja, uma conservadora em processo permanente de crise, e outro modelo alternativo e libertador de Igreja que cresce com sua força espiritual e profética que lhes é própria. Os modelos não são paralelos, mas se entrecruzam. A crise irreversível de um modelo determinado de Igreja não impede que surja outra maneira de ser Igreja. Haverá tensões, porém, não necessariamente divisões. Quanto mais consciência adquirimos de que a Igreja atual é já irreversível, mais evidente se faz a necessidade de construir uma nova maneira de ser Igreja e discernir qual é a força que temos para construí-la.

Creio que a eleição (designação) de Ratzinger como Papa foi uma decisão errada, motivada pela necessidade de dar continuidade ao projeto eclesial já existente e motivada também pelo medo ao “relativismo”. Como já afirmou o próprio cardeal Ratzinger em sua homilia, no início do conclave, existe o perigo de que a Igreja vá à deriva, ao sabor de qualquer vento de doutrina. É um sinal de crise que a eleição de um Papa tenha acontecido por uma necessidade de continuidade e por medo à autêntica diversidade e pluralidade.

Minha proposta positiva e construtiva neste momento de crise irreversível da Igreja Católica é a possibilidade real de construir outra maneira de ser Igreja, outro modelo de Igreja, no interior da Igreja atualmente existente. Temos a força teológica e espiritual suficiente para construir essa nova maneira libertadora de ser Igreja. Não creio que a solução seja sair da Igreja, mas criar uma nova maneira de ser Igreja no seu interior. A motivação para continuar lutando dentro da Igreja não é o medo ou a necessidade, mas a responsabilidade pastoral de caminhar com o povo pobre e excluído, para quem, muitas vezes, a Igreja é sua única esperança. Seria muito fácil abandonar agora a Igreja, quando o Povo de Deus, mais do que nunca, necessita de teólogos da libertação e pastores comprometidos. O próprio Povo de Deus tem esta intuição: quando estávamos celebrando no dia 2 de abril o 25o. Aniversario de Monsenhor Romero, alguém disse: “