Uma década depois do caso Rodney King, motorista negro espancado por policias brancos, pessoas de etnias diferentes ainda não conseguem conviver em paz na cidade de Los Angeles.
Essa é a mensagem de Crash - No Limite, estréia do diretor Paul Haggis, cuja première aconteceu no Festival Internacional de Cinema de Toronto.
A trama envolve histórias e personagens ligados uns aos outros pelos desentendimentos raciais e estereótipos estúpidos.
Apelo sincero à tolerância e à gentileza civil, o filme conta com alguns ótimos trabalhos do elenco, que inclui Don Cheadle, Thandie Newton, Sandra Bullock, Matt Dillon e Ryan Phillippe.
Infelizmente, o longa também passa a sensação de ser mais um exercício de consciência de classe média em promoção multicultural. Essa é a má notícia.
A boa notícia é que esse tipo de filme branco e liberal deve despertar muitas críticas positivas e atrair uma massa de audiência mais lucrativa que, digamos, um filme racial/político de Spike Lee.
Em um ano parado, o longa pode até mesmo ganhar alguma atenção para o Oscar. No Brasil, o longa estréia na sexta-feira.
No início do filme, há um acidente rodoviário sem gravidade. Uma mulher oriental começa a gritar com a latina com a qual bateu.
Pouco depois, um casal branco tem o carro roubado por dois jovens negros, um vendedor iraniano é agredido verbalmente por um intolerante quando tenta comprar uma arma para se proteger, e um executivo de TV negro e sua mulher são molestados por policiais brancos que tiveram um dia ruim.
Cada incidente provoca mais ódio e ressentimento, com as vítimas perpetuando a sua própria ignorância e preconceito na próxima pessoa etnicamente diferente que encontram pela frente.
Embora não se possa discordar dos temas honestos do filme, como redenção coletiva e perdão, a mensagem não é nova.
A narrativa parece um território já coberto pelos dramas televisivos como NYPD Blue, Third Watch e outros com os quais Haggis já trabalhou, como Plantão Médico", L.A. Law e thirtysomething.
As histórias individuais no filme têm seu mérito e pode-se imaginar se cada segmento não seria mais eficaz se fosse expandido para um filme inteiro.
Mas no lugar disso, o público deve se concentrar na bela luminosidade da cinematografia e nas maravilhosas performances de um elenco bastante comprometido com a causa.
Cheadle está ótimo, como sempre, no papel de um policial que tem um irmão envolvido com gangues e uma mãe viciada em drogas.
Bullock está surpreendentemente bem interpretando uma dona de casa que acredita que todo latino tem más intenções. Dillon equilibra simpatia e arrogância como o policial estressado com a doença do pai.
Também digno de nota está Terrence Howard como o executivo de Hollywood negro cuja integridade é questionada após um encontro com policiais de Los Angeles.
À sua maneira, Crash consegue fazer uma reflexão tocante sobre a alienação social moderna e a paranóia. Se tivesse aparecido há 10 anos, talvez ainda pudesse ser considerado um trabalho original e corajoso.