Rio de Janeiro, 22 de Dezembro de 2024

CPI dos Bingos ofende o Estado de Direito, diz jurista

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Terça, 21 de Março de 2006 às 08:26, por: CdB

A CPI dos Bingos, também conhecida como CPI do Fim do Mundo, nos moldes em que está sendo conduzida, representa uma ofensa e um atraso para a democracia e deveria ser suspensa. A avaliação é de Pedro Estevam Serrano, professor de Direito Constitucional da PUC de São Paulo, que criticou o comportamento dos parlamentares que conduzem os trabalhos da CPI. Segundo Serrano, a CPI tem dois problemas centrais: ela não está investigando o fato determinado que a originou (investigação de jogos de azar e lavagem de dinheiro) e padece de um problema técnico fundamental, a saber, a notícia do dia virou alvo de investigação.

- Qualquer investigador sabe que, quando se investigam muitos fatos, não se investiga nenhum. Uma CPI que quer investigar tudo, não investiga nada e acaba virando um circo - criticou. Para o jurista, autor do livro O desvio de poder na função legislativa (Editora FTD), essa CPI está afrontando a Constituição brasileira e o Estado de Direito.

Pedro Serrano criticou também a postura de parlamentares que vêm atacando decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e denunciando uma suposta politização por parte de seus juízes. Segundo o jurista, confundir a atuação do STF com interferência de poderes é uma demonstração de imaturidade, ignorância e autoritarismo.

- Não há nenhuma interferência de poder. O Legislativo é um Poder constituído e não um Poder constituinte, devendo estar submetido à Constituição e ao controle de constitucionalidade, que é exercido pelo Supremo Tribunal Federal. Na realidade, esse tipo de manifestação por parte de parlamentares manifesta a imaturidade que existe no Brasil quanto ao significado do Estado de Direito. Há uma grande dificuldade de conviver com a natureza do Estado de Direito, que é o governo das leis e não o governo dos homens - disse.

Neste sentido, ele classifica como um abuso a postura de legisladores que vêm ameaçando o Judiciário.

Império do Legislativo

A crítica do professor da PUC-SP é dura e direta. Para ele, o papel que o Judiciário vem desempenhando, em especial o STF, é exatamente o que deve desempenhar: impedir a violação de direitos por parte de qualquer poder, seja ele qual for.

- A democracia não é o império do Legislativo, mas sim o Império da Lei - resume.

Serrano identifica causas culturais históricas ao falar do comportamento de certos parlamentares.

- Durante a ditadura, o Judiciário existia apenas como perfumaria e adereço. Não tinha essa postura de controlar os atos dos demais poderes. O Judiciário vem fazendo isso aos poucos e tem melhorado aos poucos. Está fazendo o que deve fazer. Ele estaria substituindo o Legislativo se estivesse produzindo leis, o que não está fazendo. O que está fazendo é procurando coibir atos autoritários e indevidos por parte do Legislativo e protegendo os direitos individuais de quem está sendo acusado e chamado a depor na CPI - afirmou.

As críticas de parlamentares da CPI dos Bingos ao Judiciário subiram de tom com a decisão do STF, que suspendeu o depoimento do caseiro Francenildo dos Santos Costa. Nesta segunda-feira, o presidente do STF, Nelson Jobim, manteve a decisão do ministro Cezar Peluso, que determinou a suspensão do depoimento, atendendo pedido de liminar apresentado pelo senador Tião Viana (PT-AC). Ainda não foi julgado o mérito da ação, que tenta restringir a atuação da CPI ao fato determinado para a qual foi criada: investigação de jogos de azar e de lavagem de dinheiro.

Que a CPI se tornou um espaço de disputa política, até as pedras já o sabem. Mas, para Pedro Serrano, o problema é mais grave e está afrontando a Constituição brasileira.

- Há uma série de fraudes em curso na CPI dos Bingos. Pessoas estão sendo convocadas como testemunhas e tratadas como rés. São acusadas e parlamentares querem obrigá-las a se incriminarem - protesta, indignado.

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