Cameron diz que resistência a antibióticos pode levar medicina 'de volta à Idade Média'
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Quinta, 03 de Julho de 2014 às 11:40, por: CdB
O mundo poderá ser "lançado de volta à Idade Média da medicina" caso não sejam tomadas medidas para enfrentar a crescente resistência aos antibióticos, disse o primeiro-ministro britânico David Cameron. Ele anunciou a criaçãon de um grupo para analisar por que tão poucos medicamentos do tipo têm sido criados nos últimos anos.
O renomado economista Jim O'Neill, criador das sigla Bric, vai liderar uma comissão sobre o assunto com especialistas das áreas de ciência, finanças, indústria e saúde global.
Esse grupo vai definir planos para incentivar o desenvolvimento de novos antibióticos.
Liderança
- Se não agirmos, a perspectiva é de um cenário quase impensável em que antibióticos não funcionam mais. Voltaremos à Idade Média da medicina, em que infecções e lesões tratáveis vão matar de novo - afirmou Cameron.
Cameron disse que discutiu a questão no início deste mês em uma reunião de líderes do G7, em Bruxelas, e tem apoio específico do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, e da chanceler alemã, Angela Merkel.
A expectativa é que as propostas desse grupo de análise sejam discutidas no encontro do G7 do próximo ano, na Alemanha.
- A penicilina foi uma grande invenção britânica de Alexander Fleming em 1928 - disse Cameron à agência britânica de notícias BBC. "É bom que a Grã-Bretanha esteja tomando a liderança nesta questão para resolver o que poderia ser realmente um grave problema de saúde global."
Ele disse que o grupo iria analisar três questões fundamentais: o aumento de bactérias resistentes aos medicamentos, a "falha do mercado" em apresentar novos tipos de antibióticos nos últimos 25 anos e o uso exagerado de antibióticos globalmente.
'Bomba-relógio'
Estima-se que o aumento da resistência das bactérias a antibióticos seja responsável por 5 mil mortes na Grã-Bretanha e 25 mil mortes na Europa por ano.
A diretora geral de Saúde da Inglaterra, a professora Sally Davies, tem sido uma figura-chave para ajudar a colocar esse assunto na agenda global.
No ano passado, ela descreveu a crescente resistência aos antibióticos como uma "bomba-relógio" e disse que as ameaças que isso traz deveriam ser consideradas tão perigosas quanto o terrorismo.
- Estou muito contente de ver o primeiro-ministro assumindo a liderança global (nesta discussão) - disse.
- Novos antibióticos produzidos pelas indústrias de biotecnologia e farmacêutica serão fundamentais para resolver esta crise, o que terá impacto sobre todas as áreas da medicina moderna.
A instituição filantrópica de investigação médica Wellcome Trust forneceu 500 mil libras (quase R$ 2 milhões) de financiamento para O'Neill e sua equipe, que ficarão baseados em sua sede no centro de Londres.
A resistência aos antibióticos tem sido uma questão chave para Jeremy Farrar desde que ele se tornou diretor do Wellcome Trust, no ano passado.
- Bactérias, vírus e parasitas resistentes aos medicamentos estão levando a uma crise de saúde global - disse ele.
- É uma ameaça não só a nossa capacidade de tratar infecções mortais, mas a quase todos os aspectos da medicina moderna: desde o tratamento do câncer às cesarianas, as terapias que salvam milhares de vidas todos os dias contam com antibióticos que em breve podem parar de funcionar - destacou.
'Falha de mercado'
Os antibióticos têm uma incrível história de sucesso, mas as bactérias desenvolveram resistência por meio de mutações.
Um exemplo é a MRSA, na sigla em inglês, bactéria que há anos tem sido uma grande ameaça em hospitais. É resistente a quase todos os antibióticos, exceto os mais poderosos, e a principal arma contra ela é a melhoria da higiene, que evita que a infecção se espalhe.
Sem antibióticos, toda uma série de procedimentos cirúrgicos estaria em risco, de implantes nos quadris à quimioterapia e transplante de órgãos.
Antes dos antibióticos, muitas mulheres morriam após o parto ao desenvolver uma infecção bacteriana simples.
O'Neill é um economista renomado, mais conhecido por cunhar os termos do Bric e Mint - siglas para descrever os países emergentes e potenciais motores da economia mundial.
Ele não é, no entanto, um especialista em antibióticos ou micróbios.
Cameron, porém, disse à BBC que era importante ter um economista coordenando o grupo: "Há uma falha de mercado. A indústria farmacêutica não tem desenvolvido novos tipos de antibióticos, por isso precisamos criar incentivos."
- Este não é apenas um desafio científico e médico, mas econômico e social, que exigirá a análise dos sistemas de regulação e mudanças comportamentais para resolvê-lo - disse Jeremy Farrar.
O'Neill vai começar a trabalhar em setembro e deve entregar suas recomendações em março.
No mês passado, a resistência aos antibióticos foi escolhido como tema para o prêmio de 10 milhões de libras (cerca de R$ 38 milhões) do Longitude Prize, criado para enfrentar o maior desafio de nosso tempo.