Rio de Janeiro, 22 de Dezembro de 2024

Biodiversidade em disputa

Arquivado em:
Sexta, 14 de Outubro de 2005 às 08:43, por: CdB

O reconhecimento da sociodiversidade é inseparável da conservação da biodiversidade. O manejo, os fluxos e os intercâmbios de recursos biológicos e genéticos e os conhecimentos associados a eles, determinados pelas pautas e valores culturais tanto dos povos indígenas, quanto de segmentos do campesinato, como também de imigrantes, têm sido uma base fundamental do processo de conservação e criação da biodiversidade, como tem acontecido na Amazônia.

A noção de um mercado aberto, sem barreiras como condição e motor da sustentabilidade está citada na Convenção da Biodiversidade e na Agenda 21. Dois problemas se apresentam nesta teoria: o mercado se interessa por produtos e não por ecossistemas; o tempo das suas estratégias não se compatibiliza com o tempo da manutenção ambiental.

As empresas de biotecnologia mais parecem empreender uma corrida aos garimpos genéticos antes que acabem. A artificialização e a homogeneização das sementes e mais recentemente, com a imposição crescente, por parte dos grandes monopólios, das sementes transgênicas provocam a erosão genética e uma nova forma de poluição - a poluição genética - com sérios danos ao meio ambiente.

Como a mesma Agenda 21 afirma que a promoção do crescimento econômico, sustentado e sustentável, faz parte do combate à pobreza, poderíamos deduzir que se supõe que o mercado garanta que os benefícios do acesso aos recursos genéticos da biodiversidade serão repartidos de forma socialmente justa.

Não é o que podemos constatar em geral. O mercado continua tendo como referência principal a distribuição de dividendos aos acionistas das empresas. Sem uma intervenção independente do Estado, a economia de mercado, por si só, hoje como no Século XIX, não será capaz de gerar maior igualdade.

O reconhecimento pela Convenção da Biodiversidade dos países sobre seus recursos genéticos significa tão somente o direito de negociá-los, não de os subtrair às regras do mercado tais como definidas pela Organização Mundial do Comércio (OMC). A evolução do trabalho legislativo no Brasil, nestes últimos anos, parece reforçar, salvo raras exceções, essa tendência. A Lei das Patentes (Lei n. 9.279/96), que regula a propriedade industrial e a Lei de Cultivares (Lei n.9.456/97), que cria direitos de propriedade intelectual sobre variedades comerciais de plantas, reforçaram a submissão dos recursos biológicos e genéticos à lógica do mercado.

Medidas provisórias, tais como a MP nº 2052/2000, que regula o acesso ao patrimônio genético em favor das empresas, atropelam os Projetos de Lei em debate, como a lei de Acesso aos Recursos Genéticos e o Estatuto do Índio. A abertura do mercado brasileiro às sementes e produtos transgênicos, "empurrada" pelo legislativo e pelo executivo, em particular pelos Ministérios da Agricultura e de Ciência e Tecnologia, é exemplar do modo como prevalecem interesses empresariais, e, no caso, antes de tudo das empresas transnacionais. É bastante reveladora a criação apressada, pela Medida Provisória 2.137 de 28 de dezembro de 2000, da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), atribuindo-lhe poderes que tendem a ferir a Constituição.

Desde 10.000 anos atrás, as sementes agrícolas foram produzidas e melhoradas por gerações de camponeses através do mundo, bem como gerações de sábios indígenas aprenderam a selecionar e manipular ervas medicinais. A detenção do conhecimento desses recursos deveria garantir um direito coletivo, mas a legislação não atribui valor a esse trabalho e não o reconhece. A proposta substitutiva do deputado Luciano Pizzatto ao projeto de lei No 2.057/91 que institui o Estatuto do Índio, na mesma linha, não reconhece os direitos coletivos dos povos indígenas.

Cabe remarcar alguns avanços e inovações. A Carta de São Luiz, documento de conclusão do encontro de Pagés, iniciativa de lideranças indígenas, apoiada pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial e da Funai, que será entregue à Organi

Tags:
Edições digital e impressa
 
 

Utilizamos cookies e outras tecnologias. Ao continuar navegando você concorda com nossa política de privacidade.

Concordo