Arthur Dapieve, colunista do jornal O Globo e autor de livros como Brock - o rock brasileiro dos anos 80 e Trovador solitário (sobre Renato Russo), falou à Plano Cultural sobre seu romance de estréia, De cada amor tu herdarás só o cinismo (Editora Objetiva). O livro conta a história de um publicitário, Bernardino, que está em seu terceiro casamento e subitamente tem um caso com a estagiária da agência onde trabalha, Adelaide, que é mais nova que sua filha.
Como surgiu essa iniciativa de escrever um romance?
Na verdade eu decidi escrever, fazer jornalismo, porque eu queria escrever um romance. E aí por conta de urgências da profissão e até de perceber uma certa imaturidade, talvez no texto, os outros livros serviram um pouco de laboratório para esse romance. Eu tenho a idéia desse romance antes de qualquer outro livro que eu tenha escrito. O miolo dele. Uma menina dá Um amor do Dino Buzzati, pro cara e aí o namoro acaba no dia em que ele termina de ler o livro. Os meus três primeiros livros são muito fragmentados, muito jornalísticos. São o do rock brasileiro, o Guia de rock em CD e Miúdos Metafísicos, que são crônicas de jornais, que são naturalmente dispersivas. O quarto já é o Renato Russo, que embora seja uma história, eu tentei misturá-la dramaticamente. Ela começa pelo fim, no dia em que ele morre e aí retoma a história do começo.
Tipo um flashback...
Um flashback clássico. Mas dentro desse flashback todo você tem uma projeção dramática do personagem, da história. No momento, até esse romance, era o livro que eu tinha ficado mais satisfeito. Que tinha informações brutas, sem erro, e estava bem escrito. Tinha uma idéia por trás do livro todo. O livro do rock brasileiro, até por ser divido em capítulos por cada banda, é muito fragmentado. Eu conto uma historinha e paro, conto uma historinha e paro. O quinto livro, que é o Manual do Mané, com Gustavo Poli e Sérgio Rodrigues, é um livro de humor, que já é uma outra coisa. Não é nem ficção e nem não ficção. É uma coisa no meio do caminho. E aí, sobre esse ponto de vista, é quase natural que o outro fosse um romance. Eu estava me aproximando do romance, comendo o romance pelas beiradas. De alguma forma, a vida do Renato, sem nenhuma invenção, foi transformada em um romance, dramaticamente falando. E esse outro livro, O Manual do Mané, é um híbrido, um livro de humor, já não tem ligação direta com fatos. Daí juntou a fome com a vontade de comer. Eu tinha essa idéia e não levava adiante porque todas as outras encomendas apareciam antes. Todos os outros livros foram encomenda. Inclusive esse foi encomenda também. Só que esse casou a encomenda com o fato de eu já ter uma idéia na cabeça. E aí, quando a Objetiva perguntou se eu topava escrever um romance para eles eu disse que topava.
Eles não botaram nenhum tipo de direcionamento, limitações?
Eles queriam um livro que fosse um romance que de alguma forma aproveitasse a minha profissão. Porque seria muito óbvio transformar o jornalista em um protagonista. Eu aproveitei a minha profissão com a informação, com a observação, com coisas factuais, e alguma música - que, afinal de contas, a maior parte dos livros que escrevi foi sobre música -, para não dissociar completamente deles.
Você era um jornalista de música...
Então, eles não queriam perder isso de vista. Essa foi o único papo deles.
O título, De cada amor tu herdarás só cinismo, vem de uma música do Cartola feita para a filha dele (O mundo é um moinho), o que sugere um certo embate de gerações que é o que acontece entre Bernardino e Adelaide, um romance que envolve duas faixas etárias bem distintas.
Eu achava essa uma das letras mais impressionantes da música popular brasileira. Eu já tinha pensado em cantá-la para tantas pessoas que eu pensei que era perfeitamente factível que isso pudesse ser um toque que você d
Arthur Dapieve fala sobre seu romance de estréia à Plano Cultural
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Sexta, 22 de Outubro de 2004 às 06:59, por: CdB