O texto da Declaração de Miami, que seria a base do que está sendo chamado de "Alca light", deverá ser aprovado, segundo a expectativa do governo brasileiro. O texto reúne 34 parágrafos que vão determinar como serão as negociações para a criação da Alca nos próximos 12 meses.
Na visão do governo brasileiro, essa minuta, que será entregue nesta quarta-feira aos ministros, supera a "rigidez excessiva" da proposta anterior. "Há divergências, mas vai prevalecer o entendimento", disse Ademar Bahadian, que preside as negociacões ao lado dos Estados Unidos.
Acordo abrangente x "à la carte"
Por divergências, deve se entender a posicão de países como Chile, México e Canadá, que defendem um acordo abrangente, segundo o qual integrantes do bloco que não puderem cumpri-lo integralmente tenham um prazo determinado para se adequar.
É um modelo que contraria os interesses do Brasil de ter uma Alca "à la carte", que traz apenas um cardápio mínimo de obrigações, permitindo que cada país tenha liberdade de escolher pontos adicionais para negociação de acordo com seus interesses.
Essa proposta, defendida pelo Brasil, conseguiu apoio dos Estados Unidos, que, apesar de quererem uma Alca com um cardápio de obrigações mais abrangentes, preferiram buscar o consenso a arriscar o sucesso da Conferência Ministerial de Miami.
A expectativa de que haverá um consenso em torno da proposta, segundo o Itamaraty, pode ser explicada de duas formas: em primeiro lugar, o texto conta com o apoio dos Estados Unidos e do Brasil, que chegaram a um consenso para evitar um impasse.
Além disso, nas palavras de um diplomata do Itamaraty, "apesar das divergências, dificilmente um país ou um grupo de países vai ter peito para bloquear o acordo e ficar com o ônus do fracasso de Miami".
Na prática, a Alca "à brasileira" deixa fora do cardápio obrigatório acordos criando regras para a propriedade intelectual, para os investimentos e para as compras governamentais até que a Organização Mundial do Comércio (OMC) tenha regulamentado essas áreas.
"Ouvimos falar demais aqui em flexibilidade. Espero que o Brasil perceba que não está tomando a decisão certa ao deixar as regras para investimentos fora da Alca, por exemplo. O investimento americano no Brasil está caindo, sem essas regras vai cair ainda mais", disse à BBC Brasil Frank J. Vargo, vice-presidente para assuntos internacionais da National Association of Manufacturers, a maior associação de indústrias dos Estados Unidos, que representa mais de 14 mil empresas.
Mas o coro de descontentes com a atual proposta não vem apenas do empresariado americano, mas também dos produtores agrícolas brasileiros.
Com a "Alca light", os Estados Unidos conseguem deixar a discussão sobre os subsídios aos seus produtores agrícolas para o âmbito da OMC.
Açúcar na "Alca light"
"Essa Alca não está pondo em xeque um problema fundamental, que são os subsídios à producao agrícola americana. Queríamos um pouco mais de açúcar nessa "Alca light". Ficou light demais", disse Gilman Viana Rodrigues, vice-presidente da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária, referindo-se aos beneficios à produção de açúcar nos Estados Unidos que prejudicam exportacões brasileiras.
A expectativa é que, se a minuta for aprovada pelos negociadores, o documento final seja também aprovado pelos ministros na Conferência Ministerial de Miami, que, oficialmente, começa nesta quinta-feira.
"O acordo é uma vitória de todos. O consenso venceu as brigas sem sentido. A partir dessa Alca, vamos continuar buscando um acordo mais ambicioso que vai beneficiar todos os lados, criando um ambiente de prosperidade para todo o continente", disse à BBC Brasil Mark Smith, diretor para o Hemisfério Ocidental da Câmara de Comércio dos Estados Unidos.