Rio de Janeiro, 06 de Dezembro de 2025

Suspeita de crime de guerra desafia Judiciário e Congresso dos EUA

Investigação sobre ataque dos EUA a embarcação no Caribe levanta questões de crime de guerra e legalidade. Saiba mais sobre as declarações do almirante Bradley e as reações políticas.

Sábado, 06 de Dezembro de 2025 às 15:38, por: CdB

Bradley afirmou que, segundo informações coletadas pelo serviço de inteligência norte-americano, a embarcação se aproximaria de outra maior e os tripulantes transfeririam um carregamento de drogas para ela.

Por Redação, com Reuters – de Washington

O barco destruído em ataque dos Estados Unidos no Caribe no dia 2 de setembro estava a caminho de outra embarcação maior, que tinha como destino final o Suriname, não o território norte-americano, como o governo de Donald Trump declarou na ocasião da ofensiva, que teria matado 11 pessoas. Nem sequer há qualquer prova de que transportavam alguma carga de narcóticos. A declaração é do próprio almirante que conduziu a operação, Frank Mitchell Bradley, a parlamentares durante depoimento realizado na quinta-feira, segundo fontes ouvidas pela rede de TV norte-americana CNN.

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Bradley afirmou que, segundo informações coletadas pelo serviço de inteligência norte-americano, a embarcação se aproximaria de outra maior e os tripulantes transfeririam um carregamento de drogas para ela. As Forças Armadas norte-americanas, porém, não conseguiram localizar o segundo barco ou sequer provar que um dia realmente existiu.

O almirante alegou que o carregamento poderia chegar às ruas de seu país depois da passagem pelo Suriname. Agentes norte-americanos que atuam na repressão ao narcotráfico, no entanto, afirmam que as rotas de carregamentos de drogas que partem do Suriname costumam ter a Europa como destino final, e não os EUA.

 

Sobreviventes

Este ataque em particular está na mira de parlamentares e tem sido foco degrande controvérsia para o governo Trump; houve sobreviventes do primeiro ataque ao barco, bombardeado em seguida novamente. A Casa Branca afirmou que os ataques e o assassinato de sobreviventes foram necessários para proteger o território norte-americano de uma ameaça iminente. Os EUA, no entanto, ainda estão sob as regras do direito internacional e o país não está imune a um processo, dentro e fora de suas fronteiras.

O argumento de que embarcações supostamente ligadas ao narcotráfico e em direção aos EUA são uma ameaça iminente está na base da fundamentação jurídica que o governo norte-americano elaborou para justificar as ações.

A gestão Trump acredita que os EUA estão em situação de conflito armado contra organizações narcotraficantes, muitas delas classificadas por Washington como terroristas.

 

Imagens

Governos não alinhados a Washington na América Latina; além de especialistas do direito internacional e, cada vez mais, opositores da Casa Branca, têm criticado as operações e afirmado que elas são ilegais. O governo Trump divulga as evidências que diz possuir e conectariam os barcos ao narcotráfico — algo que, por si só, não autorizaria os EUA a explodirem as embarcações à luz do direito internacional.

Mesmo que os EUA estivessem em guerra contra os traficantes, a segunda ordem também poderia ser interpretada como um crime de guerra, uma vez que combatentes feridos em conflito têm direito a proteção. O vídeo completo da operação foi mostrado a alguns parlamentares norte-americanos e a reação foi negativa à Casa Branca. De acordo com a descrição do ataque do dia 2 de setembro, a ofensiva começou com o uso de munição que explodiu no ar antes de atingir os 11 tripulantes, formando um guarda-chuva de estilhaços. Quando a fumaça se dissipou, dois homens que de alguma forma haviam sobrevivido à explosão apareceram agarrados a um pedaço da proa da embarcação.

Eles estavam sem camisa, desarmados e não carregavam nenhum equipamento de comunicação visível. Também pareciam não ter ideia do que havia acabado de atingi-los ou de que as Forças Armadas dos EUA estavam considerando matá-los. Segundo uma das pessoas que falou com a agência inglesa de notícias Reuters sobre as imagens, o vídeo os acompanha por cerca de uma hora tentando virar o barco de volta, em vão. Eles foram posteriormente mortos por novo ataque.

 

Almirante

O governo norte-americano também tem mudado a atribuição de responsabilidade na cadeia de comando relativa ao bombardeio. Ao anunciar a ofensiva no dia 2 de setembro, o presidente afirmou que o ataque foi feito por ordem dele. “Nesta manhã, seguindo minhas ordens, as Forças Armadas dos EUA conduziram um ataque cinético contra narcoterroristas do ‘Tren de Aragua”, escreveu Trump, citando uma das principais gangues venezuelanas e acusando, na mesma mensagem, o ditador Nicolás Maduro de comandar a organização.

“O ataque ocorreu quando os terroristas estavam em águas internacionais transportando drogas ilegais em direção aos EUA. Como resultado, 11 terroristas morreram e nenhum soldado (norte-)americano foi ferido. Que isso sirva deaviso a qualquer um pensando em levar drogas aos EUA. CUIDADO!”, acrescentou Trump.

No final de novembro, reportagem do jornal norte-americano The Washington Post revelou que o secretário de Defesa, Pete Hegseth, havia dado uma ordem verbal para matar todos os tripulantes da embarcação. Em meio a pressão de congressistas sobre a ofensiva, a Casa Branca usou o argumento que o ataque foi determinado por Frank “Mitch” Bradley, o almirante que informou parlamentares sobre o destino do barco, nesta semana.

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