Falta de professores leva a disputa por profissionais, especialmente no leste alemão. Rede pública oferece mais atrativos do que escolas privadas, como estabilidade de emprego e aposentadorias mais altas.
Por Redação, com DW - de Berlim
A falta de professores na Alemanha está gerando uma acirrada disputa por profissionais no país, e quem mais deverá sair prejudicado são os professores da rede privada de ensino.
A maior parte dos alunos do ensino primário e secundário no país visita escolas da rede pública, que são gratuitas e administradas pelos respectivos governos estaduais. E são os estados que, com ofertas mais atraentes de emprego e incremento expressivo de salários, agora tentam corrigir a falta de docentes. A carência no setor se explica por vários fatores, como aumento da natalidade, influxo de estrangeiros no país e busca por trabalhos melhor remunerados, consequência do bom desempenho da economia alemã nas últimas décadas.
A campanha para atrair professores acontece especialmente no leste da Alemanha, onde a ausência de profissionais é mais dramática. O estado federado da Saxônia, por exemplo, quer conquistar pedagogos em formação com mil euros (valor bruto) a mais por mês, para que atuem em escolas de áreas rurais mais afastadas. Com um salário bruto máximo de 2.500 euros mensais a partir de janeiro de 2019, esses estudantes seriam os mais bem pagos profissionais em formação da Alemanha.
A Saxônia também estuda concursar os professores mais cedo, reduzindo a idade mínima de acesso ao funcionalismo público para 42 anos. A região é um dos estados da antiga República Democrática Alemã (RDA) que passou a integrar o país após a Reunificação, em 1990 – naquela época, a maioria dos chamados "novos" estados quis enxugar a máquina estatal e apostou na contratação de profissionais privados para as escolas.
Segundo o jornal Die Zeit, 200 mil dos 800 mil professores que atuam na Alemanha não são concursados e recebem menos dinheiro pelo mesmo trabalho dos funcionários públicos – em média, 500 euros a menos por mês, diz o semanário.
O argumento de economia dos estados, porém, é falho, diz o jornal. "Ao empregar professoras e professores em vez de concursá-los, o estado não economiza, só distribui os gastos de outra maneira. Os custos salariais adicionais somam quase 30% do salário bruto – o que não acontece com os funcionários públicos. Quem é contratado também contribui privadamente para a seguridade social – esse é o principal motivo pelo qual essas pessoas têm menos dinheiro no final do mês", escreve o diário.
Segundo o jornal, se os 200 mil professores privados fossem concursados, faltariam as contribuições para a seguridade social, mas elas seriam compensadas pelos 32 milhões de contratos com contribuições obrigatórias que existem no país.
Embora outras regiões, como Berlim e Saxônia-Anhalt, também estejam adotando medidas para conquistar professores, os pedagogos que atuam em escolas privadas não deverão ser beneficiados por elas. Muitos temem que essas instituições serão especialmente prejudicadas pela falta de professores.
Mais escolas privadas
Desde 1992, o número de escolas privadas praticamente dobrou na Alemanha, segundo um estudo da Fundação Friedrich Ebert divulgado em março deste ano e citado pela revista Der Spiegel. Porém, a qualidade do ensino da rede pública é considerada alta e, de acordo com a pesquisa, não há grandes diferenças no desempenho dos alunos da rede pública e do setor privado.
Mas, apesar do aumento de alunos em escolas privadas, na Alemanha, elas continuam sendo uma exceção, cerca de 9% dos alunos alemães frequentam uma instituição privada de ensino.
A tendência é de crescimento das escolas privadas, que perfazem 14% de todas as escolas o país. Especialmente nas áreas rurais no leste, muitas delas garantem que os alunos não tenham que viajar 20 quilômetros para ir às aulas.
Udo di Fabio, ex-juiz do Tribunal Constitucional alemão, disse em parecer escrito para o Sindicato de Associações de Escolas Privadas da Alemanha que existe uma "concorrência assimétrica" entre escolas públicas e privadas no país. Segundo o ex-juiz, os secretários estaduais de Educação prejudicam as escolas privadas de forma reiterada – com concursos públicos, aumentos unilaterais de salários ou auxílios financeiros especiais.
Especialistas também criticam o fato de professores da rede privada não serem incluídos nem nos processos seletivos das escolas públicas, nem nos processos de capacitação dessas instituições.
Outro problema enfrentado pelos profissionais contratados pelas escolas privadas é a falta de alternativas para substituir os docentes. Recentemente, o sistema público considerou suprir a ausência de professores com pessoas sem formação pedagógica. "Ao mesmo tempo, os professores das escolas privadas estão ameaçados de não obterem permissão de ministrar aulas" em outras matérias que não sejam as de sua especialização, o que dificulta manter as aulas, avalia Di Fabio.
Financiamento das escolas privadas
As escolas privadas, por sua vez, não podem simplesmente decidir pagar salários mais altos, já que o financiamento dessas instituições é considerado muito volátil. Dependendo do estado, as Secretarias de Educação repõem entre 60% e 80% dos custos dessas escolas. Instituições recém-fundadas precisam esperar três anos, em geral, para receber ajuda. Ao mesmo tempo, a Constituição alemã diz que a mensalidade das escolas privadas não pode ser muito alta para "evitar o estímulo de exclusão consequente do patrimônio dos pais" do aluno.
Atualmente, segundo o Spiegel, a mensalidade escolar fica entre 170 e 300 euros nas escolas privadas do país – o Estado de Baden-Württemberg, por exemplo, definiu por lei um valor máximo de 160 euros mensais.
Para Di Fabio, atualmente professor de Direito Estatal na Universidade de Bonn, o governo tem um duplo papel na política escolar: ao mesmo tempo em que financia escolas, também regula a política de educação. "Por isso, o Estado precisa atuar como juiz imparcial, tratando os dois tipos de escola de forma absolutamente igual", afirma.
Na Saxônia, por exemplo, a conversão de professores para o funcionalismo público poderá fazer com que especialmente os mais jovens migrem das áreas rurais para escolas financiadas pelo estado. Associações de escolas privadas temem um êxodo maciço nessas regiões, já que, em alguns casos, as diferenças de pagamento chegam a mil euros – valor líquido – por mês. E uma saída em massa de professores levaria também os pais a deixarem as instituições. Alguns especialistas temem até que, com a migração para a rede pública, algumas localidades não conseguirão cumprir a escolarização obrigatória no país.