Os exames que atestaram a boa condição dos órgãos foram realizados pelo PCS Lab Saleme, um laboratório privado contratado por R$ 11 milhões em uma licitação emergencial, em dezembro de 2023.
Por Redação, com agências de notícias – do Rio de Janeiro
A Polícia Civil do Rio de Janeiro deu início, nesta segunda-feira, a uma operação para tentar prender pessoas envolvidas no caso de transplantes de órgãos infectados pelo HIV.
Segundo informações do portal G1, o sócio da PCS Lab Saleme, Walter Vieira, foi preso. Ele é médico ginecologista e assina um dos lados que apontou o falso negativo para HIV em órgão transplantado.
“As investigações indicam que os laudos, falsificados por um grupo criminoso, foram utilizados pelas equipes médicas, induzindo-as ao erro, o que levou à infecção dos pacientes. Um dos pacientes veio a falecer, com as causas da morte ainda sob investigação”, explicou a polícia em nota.
Na operação desta segunda, os agentes também cumprem 11 mandados de busca e apreensão.
Em meio às investigações, os policiais apuram se o PCS Lab Saleme teria falsificado laudos em procedimentos médicos, além de transplantes. “Diversas diligências complementares estão sendo realizadas para identificar toda a cadeia de profissionais envolvidos nesse esquema criminosos, e todos serão prontamente responsabilizados na medida da sua respectiva culpabilidade”, disse a Delegacia do Consumidor (Decon).
O caso
Os exames que atestaram a boa condição dos órgãos foram realizados pelo PCS Lab Saleme, um laboratório privado contratado por R$ 11 milhões em uma licitação emergencial, em dezembro de 2023.
A primeira inspeção da vigilância sanitária mostrou que o PCS Lab não possuía kits para a realização dos exames e não apresentou documentos que comprovassem a compra dos materiais necessários. Essas condições colocaram em dúvida a veracidade dos laudos emitidos para os órgãos infectados.
As autoridades de saúde descobriram a infecção por HIV quando uma pessoa transplantada no mês de janeiro buscou atendimento hospitalar no início de setembro. Durante o atendimento, os exames mostraram a presença do vírus. Os demais pacientes foram identificados neste mês.
Falsificação
A Delegacia do Consumidor também investiga se o laboratório falsificou laudos em outros casos. “Determinei imediatamente a instauração de inquérito, atendendo determinação do governador para que os fatos fossem investigados com maior rigor e rapidez. Conseguimos elementos para representar pelas cautelares junto à Justiça em tempo recorde, para que os culpados sejam punidos com a maior celeridade”, afirmou o secretário estadual de Polícia Civil, Felipe Curi, por meio de nota.
Por meio de nota, as defesas de Walter e Mateus Vieira, sócios do PCS Lab Saleme, repudiaram “com veemência a suposta existência de um esquema criminoso para forjar laudos dentro do laboratório, uma empresa que atua no mercado há mais de 50 anos. Ambos prestarão todos os esclarecimentos à Justiça”, disseram.
Anvisa: prioridade foi monitorar os receptores dos órgãos
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), em conjunto com as Vigilâncias Sanitárias Estadual e Municipal do Rio de Janeiro e o Sistema Nacional de Transplantes (SNT), do Ministério da Saúde, coordenam ações para investigar a contaminação por HIV em seis pacientes transplantados no Estado do Rio de Janeiro.
O caso “é uma ocorrência grave”. Em nota, a Anvisa informou que “a prioridade foi monitorar os receptores dos órgãos transplantados e determinar a realização de novos exames pré-transplante no Instituto Estadual de Hematologia Árthur de Siqueira Cavalcanti (Hemorio), no Rio.”
Adicionalmente, como medida preventiva, o Laboratório de Patologia Clínica PCS Lab Saleme foi interditado pela Vigilância Sanitária local, com orientação técnica da Anvisa, até a conclusão das investigações, com foco na segurança dos transplantes.
A Anvisa anunciou, ainda, que as investigações estão em curso envolvendo autoridades estaduais e municipais do Rio, incluindo as Vigilâncias Sanitárias, o Ministério da Saúde e a Anvisa. Essas instituições estão trabalhando em conjunto para elucidar a situação em prol da segurança dos transplantes. Todos os requisitos técnicos correlacionados devem ser rigorosamente cumpridos em cada fase, visando a saúde dos pacientes e o bem-estar coletivo.
Contrato encerrado
Por meio de nota, a Secretaria Municipal de Saúde de Nova Iguaçu (Semus) informou que o contrato com a empresa PCS Laboratório Saleme foi encerrado em fevereiro deste ano, passando a ser administrado pelas organizações sociais (OS) responsáveis pela rede de atenção básica do município.
Já o contrato entre o PCS e a OS terminou na última quinta-feira, assim que a Semus recebeu a notificação sobre a interdição cautelar feita pela Anvisa no laboratório sediado em Nova Iguaçu.
A Semus vai abrir sindicância. Qualquer paciente do SUS que tenha feito algum exame no PCS Saleme pode voltar à unidade de saúde que solicitou o teste para requisitá-lo novamente. Até o momento, não há registro de pacientes contestando resultados de exames.
Para evitar a interrupção do serviço prestado aos pacientes que estão com exames agendados, um novo laboratório está sendo contratado emergencialmente.
Afastamento
A prefeitura de Nova Iguaçu também informou que o médico Walter Vieira, ginecologista concursado do município, é sócio do laboratório PCS Lab Saleme. De acordo com a prefeitura, Vieira exercia o cargo não remunerado como presidente do Comitê Gestor de Vigilância e Análise do Óbito Materno Infantil e Fetal de Nova Iguaçu. Por ser um dos sócios do laboratório PCS Saleme, interditado pela Anvisa, o ginecologista foi afastado do cargo nessa sexta-feira.
O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) instaurou inquérito civil para apurar as irregularidades noticiadas no programa de transplantes do Estado do Rio de Janeiro. Um trecho do documento informa que, “na data de hoje, inúmeras reportagens foram publicadas na imprensa dando conta de supostas contaminações de seis pacientes transplantados pelo vírus do HIV, a partir de exames falso-negativos de dois doadores, realizados pelo laboratório de Patologia Clínica Doutor Saleme – PCS de Nova Iguaçu/RJ, contratado pela Fundação Saúde/Secretaria Estadual de Saúde em dezembro do ano de 2023”.
O Ministério Público (MP) estadual pediu que a Secretaria de Estado de Saúde envie – em 15 dias – a cópia do laudo de inspeção da Vigilância Estadual de Saúde feita no Laboratório de Patologia Clínica Doutor Saleme – PCS que ensejou a suspensão de suas atividades, bem como das sindicâncias instauradas a partir de notificações dos eventos adversos de contaminação dos transplantados, devido a resultados falso-positivos emitidos pelo laboratório. O MP deseja, ainda, que a Anvisa também forneça – no prazo de 15 dias, a cópia do laudo de vistoria no laboratório.
O inquérito civil foi instaurado considerando a política pública de saúde que compete ao Ministério Público.
O MP esclareceu que o procedimento está sob sigilo, em razão do envolvimento de dados sensíveis dos pacientes. E que está à disposição para ouvir as famílias afetadas, receber denúncias de quem se sentir lesado e prestar atendimento individualizado às partes envolvidas. As denúncias podem ser encaminhadas à Ouvidoria por formulário ou pelo telefone 127.
A respeito de notícias de que o Laboratório de Patologia Clínica Doutor Saleme – PCS, é de prima do ex-secretário de Saúde do Estado, doutor Luizinho, que exerce mandato de deputado federal pelo PP, o Ministério Público disse que vai investigar a contratação, encaminhando o caso aos promotores de Justiça de Cidadania. A investigação deve abarcar a análise do dano pelo serviço não prestado adequadamente e possíveis irregularidades na licitação em decorrência de vínculos mencionados.
Rigor na apuração
O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, determinou rigor e rapidez nas investigações no serviço de transplantes do Estado.
Em nota, ele disse que “é uma situação inadmissível e sem precedentes a falha no serviço de transplantes no estado. Determinei total rigor e celeridade nas investigações. Além das sindicâncias em andamento na Secretaria de Saúde e na Fundação Saúde, a Polícia Civil já abriu inquérito para chegar aos responsáveis”.
Castro disse ainda que, “desde o início, tomamos todas as medidas necessárias e vamos até o fim para que este erro jamais se repita. Quero assegurar apoio irrestrito aos transplantados afetados. O Estado tem o dever de assumir sua responsabilidade no caso.
Reitero meu compromisso em preservar a segurança do sistema estadual de transplantes, que já salvou as vidas de mais de 16 mil pessoas”, lamentou o governador.