Por João Negrão e Vitoria Carvalho, da Sucursal de Brasília
O economista Márcio Pochmann, presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), em audiência pública no Senado, negou a existência de crise no órgão, explicou a necessidade de criação de condições de financiamento das atividades do instituto e a modernização de suas operações. Pochmann foi convidado pela Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor (CTFC). A audiência aconteceu na tarde desta quarta-feira (23.04).

Pochmann apresentou na audiência um relatório da situação atual do IBGE, pontuando as iniciativas que manteve desde o início de sua gestão, em agosto de 2023, junto aos funcionários do órgão. Este estremecimento da relação dele com os servidores, aliás, foi, junto com sua proposta de criação da Fundação IBGE+, para angariar recursos para o órgão, motivou a solicitação da audiência pelos senadores Dr. Hiran (PP-RR), presidente da CTFC, e da senadora Tereza Cristina (PP-MS). Nenhum dos dois compareceu e a audiência acabou sendo presidida pela senadora Damares Alves (Republicanos-DF).
O presidente do IBGE enfatizou o diálogo e participação propositiva com os servidores do órgão. “A atual gestão do IBGE tomou posse em 18 de agosto de 2023, em Brasília, com a presença do presidente e vice-presidente, ministros e autoridades, e, menos de uma semana depois, em 24 de agosto, foi realizada a primeira reunião entre a direção do sindicato nacional e a direção recém-empossada no Instituto. Logo após, a nova gestão teve seu primeiro encontro com os servidores, colaboradores, aposentados e sindicalistas, em 30 de agosto, na sede do sindicato dos trabalhadores do Instituto, lançando o projeto ‘IBGE 90 Anos’”, relacionou Pochmann.
Pochmann destaca o que vem sendo feito no IBGE
Segundo ele, “dando prosseguimento a uma gestão participativa, foram realizadas no primeiro ano de gestão mais quatro reuniões oficiais, além de reuniões conjuntas das direções do sindicato e do Instituto com representantes do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI), para apoio a pleitos históricos, como plano de carreira e reajuste salarial dos servidores e servidoras temporários, este obtido em setembro de 2024, elevando os rendimentos em 77% para esta categoria”.
Ele destacou ainda a realização, em novembro de 2023, do I Encontro Nacional de Servidores. “O evento aconteceu na unidade de Parada de Lucas, zona norte da capital fluminense, reunindo mais de 500 ibgeanos e ibgeanas chamados a debater as diretrizes de norteamento da ação do IBGE até 2026. Em maio de 2024 o IBGE realizou o segundo encontro de servidores, no Palácio da Fazenda, centro do Rio de Janeiro (RJ), no qual nove grupos debateram os caminhos estratégicos para o desenvolvimento do SINGED”, acrescentou o presidente do IBGE.
Respondendo às questões dos senadores, apresentadas por escrito por Damares Alves, Pochmann, na mesma linha de refutar a alegada falta de diálogo com o servidores, segundo carta divulgada por alguns servidores, elencou ainda a realização, em julho de 2024, da Conferência Nacional dos Agentes Produtores e Usuários de Dados, no Campus Maracanã da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), reunindo representantes da academia, dos três poderes, das esferas municipais, estaduais e federais, empresas de tecnologia nacionais e internacionais, organizações da sociedade civil e movimentos sociais e com a participação de todos os agentes produtores e usuários de dados.
Pochmann alertou os senadores que a grande questão envolvendo o órgão atualmente é a carência de recursos para as atividades operacionais, o que pode levar ao “esgotamento do modelo brasileiro de instituição nacional de estatística e geografia”. Ele relatou a involução do gasto público no IBGE. “Desconsiderando gastos com o Censo, o orçamento da instituição cai de maneira contínua de 2018 a 2023, apresentando leve recuperação em 2024. No ano de 1986, por exemplo, o orçamento do IBGE equivaleu a 0,32% do total do orçamento federal e a 0,06% do Produto Interno Bruto. Em 1992, o IBGE realizava 81 operações estatísticas, sendo sete censos nacionais (demográfico, agropecuário, industrial, construção, comércio, serviços e transportes), e quatro grandes programas de informações geográficas que contemplavam 25 projetos e sistemas nacionais”, pontuou.
O atual cenário
“Depois de quase quatro décadas, em 2024, o orçamento do IBGE equivaleu a apenas 0,05% do total do orçamento federal (84,4% inferior ao ano de 1986) e a 0,02% do Produto Interno Bruto (66,6% inferior ao ano de 1986). Atualmente, o IBGE somente realiza dois censos nacionais (demográfico e agropecuário) e mesmo assim sem conseguir cumprir o período temporal disciplinado pela legislação existente”, agregou.
Neste cenário de orçamento decrescente, alertou Pochmann, muitas vezes as pesquisas estruturais têm sido realizadas com recursos orçamentários insuficientes. “A situação das pesquisas conjunturais – preços, emprego e desemprego, Produto Interno Bruto e outras – não se apresenta diferente. Entre os anos de 2001 e 2021, por exemplo, os recursos orçamentários para a realização das pesquisas conjunturais do IBGE foram reduzidos em 80,2%”, complementou.
A discrepância entre os gastos com pessoal e os com a atividade fim do IBGE e a carência de recursos humanos foram outros pontos enfatizados pelo presidente do órgão. “Atualmente, apenas 3% do orçamento total do Instituto são destinados à realização de pesquisas”, informou aos senadores.
Pochmann ainda informou sobre a condição laboral no IBGE, na qual, segundo ele, há “um conjunto de sinais importantes de esgotamento do modelo de instituição nacional de estatística herdado do regime político autoritário”. E exemplificou: “O quantitativo de servidores permanentes decresce de maneira contínua, passando de 12 mil em 1990 para os atuais 3.647. Atualmente, o IBGE detém mais de dois terços do conjunto de sua força de trabalho submetidos à instabilidade ocupacional diante da existência dos diversos regimes de trabalho, como temporários, terceirizados e consultores”.

Em buscas de novos recursos
Tal situação, voltou a alertar Pochmann, tem levado ao exercício de funções equivalentes por profissionais com diferentes remunerações e condições de trabalho, com riscos concretos às operações com dados sensíveis e de sigilo estatístico. Além disso, emendou, “a pressão orçamentária sobre as despesas de pessoal tem aumentado consideravelmente. Nos últimos 20 anos (2004 e 2024), por exemplo, a participação do gasto de pessoal no total das despesas do IBGE subiu 7%, fazendo com que 92% do total dos recursos orçamentários da instituição estivessem comprometidos com folha de pagamento no ano de 2024”.
Diante desse quadro, Pochmann disse que, para evitar o estrangulamento do órgão, é urgente buscar outras fontes de recursos para além do orçamento público. É neste ponto que entra a proposta da Fundação IBGE+, criada de forma totalmente transparente, ouvindo os servidores do órgão e recorrendo ao Ministério do Planejamento, ao Tribunal de Contas da União, ao Ministério Público Federal e à Advocacia-Geral da União para avaliação do modelo de fundação proposto. “Que não seja a fundação, mas que, aqueles que são críticos a ela, ajudem o IBGE a encontrar outras formas de financiamento de suas atividades”, conclamou.
Outro ponto importante na pauta da audiência com Márcio Pochmann na Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor do Senado foi a “governança de dados”. Ele disse que outro grande desafio do IBGE é em relação à transformação do padrão brasileiro de governança de dados em um ambiente democrático. É neste sentido que ele enfatiza a necessidade de implantação do Sistema Nacional Soberano de Geociência, Estatística e Dados (Singed), que possibilitará a centralização dos dados aferidos por todos os órgãos governamentais.
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