Rio de Janeiro, 21 de Novembro de 2024

A Petrobras e a sanha do financismo

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Quinta, 21 de Março de 2024 às 09:55, por: CdB

Durante longos períodos o Brasil ocupou a primeira posição dentre as nações que ofereciam a maior taxa de juros do planeta. Esse trágico atributo guardava uma relação direta com a definição dos patamares da taxa de juros oficial, a Selic.


Por Paulo Kliass – de Brasília


A voracidade do capital financeiro é um fenômeno patológico que tem causado prejuízos muito graves para o conjunto da sociedade brasileira. Há décadas que a ambiente econômico em nossas terras é amplamente conhecido no universo da gestão de patrimônio e fortunas como sendo o paraíso do financismo global.




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Desde o primeiro dia do terceiro mandato do Presidente Lula até os dias de hoje, as ações da Petrobrás na Bolsa passaram por uma valorização superior a 100%

Durante longos períodos o Brasil ocupou a primeira posição dentre as nações que ofereciam a maior taxa de juros do planeta. Esse trágico atributo guardava uma relação direta com a definição dos patamares da taxa de juros oficial, a Selic. O órgão da autoridade monetária sempre respondeu muito mais aos interesses do grande capital associada às finanças e menos a qualquer projeto de retomada de um projeto de desenvolvimento econômico e social. Afinal, com o custo financeiro na estratosfera, qualquer tipo de empreendimento produtivo, ampliação da capacidade operacional ou atividade no setor real ficam bastante prejudicados.


Ora, como a taxa referencial de juros opera como o patamar mínimo para qualquer tipo de cálculo de rentabilidade, o fato é que a sociedade brasileira acabou como que “naturalizando” esse absurdo financista. Aliás, essa capacidade que temos de nos acostumarmos como coletivo social a situações disfuncionais, para dizer o mínimo, se manifestou também no período de taxas de inflação elevadas. A sociedade internalizava os distintos ciclos de crescimento acelerado de preços e tudo se passava como se aqueles patamares fossem considerados “normais”. Porém, os setores do topo de nossa pirâmide da desigualdade econômica e social sempre conseguiam se defender da perda de poder aquisitivo da moeda. Foram necessárias várias tentativas de plano de estabilização monetária, com criação de novas moedas, para que finalmente o Plano Real lograsse êxito em 1994.



Capital especulativo sempre quer mais


Pois, agora, ao longo dos últimos dias, a turma do financismo volta ao ataque em defesa de seus interesses rentistas e parasitários. Trata-se da tentativa de desqualificar o governo Lula e a equipe do Ministério das Minas e Energia por conta da recente decisão envolvendo a distribuição de lucros e dividendos da Petrobrás. A nossa maior empresa estatal tem sido utilizada ao longo dos últimos anos para direcionar vultosos recursos para os seus acionistas. A tabela abaixo nos oferece os dados relativos à distribuição desse tipo de valores efetuados ao último triênio:



Petrobrás – Distribuição Lucros e Dividendos


Ora, não satisfeitos com essa quantidade enorme de recursos públicos distribuídos para os detentores de títulos da empresa durante os últimos 3 anos, os porta vozes do financismo avançam sobre uma outra parcela que seria distribuída também a essa conta. Trata-se de “lucros e dividendos extraordinários”. Ocorre que, exatamente pela característica de não ser uma remuneração “ordinária”, o Conselho houve por bem não promover a distribuição imediata dos valores. Eles ficaram aprovisionados em uma conta interna da Petrobrás, para posterior decisão a esse respeito.


Pois essa suposta “frustração” de expectativas dos acionistas levou a que os grandes grupos de investidores do capital privado orquestrassem uma chantagem imensa sobre a empresa, provocando uma queda artificial e especulativa da cotação dos papéis no pregão da bolsa. E as manchetes e as telinhas estampavam que a empresa havia sofrido uma perda patrimonial de x bilhões de reais em algumas poucas horas. A responsabilidade, obviamente, aos olhos desse pessoal, seria creditada ao Presidente Lula por sua visão estatista, intervencionista, antimercado e blábláblá. O pequeno “detalhe” é que ninguém esclareceu aos leitores que a baixa especulativa em um único dia seria restabelecida pela alta na cotação das ações no pregão da Bolsa no dia seguinte. E vida que segue.


Para esse pessoal não interessa lembrar que, desde o primeiro dia do terceiro mandato do Presidente Lula até os dias de hoje, as ações da Petrobrás na Bolsa passaram por uma valorização superior a 100%. Esse tipo de ganho, que não tem paralelo com nenhuma outra grande petroleira do mercado internacional, representa uma rentabilidade que não se encontra em nenhum outro tipo de atividade econômica em nosso País para o período considerado. A linha do gráfico se inicia com o valor de R$ 17,90 e termina em R$ 36,40.



Evolução da cotação das ações da Petrobrás na Bolsa – 1/1/23 a 14/03/24



A Petrobrás é uma empresa estatal e a maior parte de seu capital pertence ao governo brasileiro. Além disso, a União possui mais de 50% do total de ações com direito a voto. Assim, os investidores que optaram por adquirir títulos do grupo estavam cientes a respeito da natureza pública do grupo e da possibilidade de que, em algum momento, os ganhos fossem redirecionados para o necessário aumento de investimento e da capacidade produtiva da mesma. Essa opção é ainda mais compreensível em uma conjuntura em que o Ministério da Fazenda atua duramente pela consecução da meta de zerar o déficit primário e que o Novo Arcabouço Fiscal elaborado por Fernando Haddad impede a capitalização de empresas estatais pelo Tesouro Nacional. A austeridade fiscal impede a expansão das atividades da Petrobrás.


Esse comportamento ávido e ganancioso do financismo parece mesmo não ter limites. O primeiro aspecto a ser ressaltado é que a distribuição de lucros e dividendos continua senso isenta do pagamento de imposto de renda. Uma loucura! Trata-se de uma benesse oferecida por Fernado Henrique Cardoso aos detentores de capital em 1999 e que continua valendo até os dias de hoje, sem nunca ter sido excluída. O governo foi dirigido por representantes do Partido dos Trabalhadores por mais de 15 anos e a regra não foi seque alterada.


As demais fontes de drenagem de recursos públicos para o capital financeiro podem ser observadas pelo volume das despesas com pagamento de juros da dívida pública. Trata-se de um verdadeiro orçamento paralelo da União, sem nenhum controle do Congresso Nacional ou dos demais órgãos do Poder Executivo. O Banco Central registra os volumes crescentemente escandalosos a esse título. São gastos sobre os quais não existe nenhum limite, nem teto, nem contingenciamento.



Brasil – Despesas com pagamento de juros


A chantagem levada a cabo pelos grupos associados ao financismo nacional e internacional colocam em cheque a natureza essencial da Petrobrás. Ela é uma empresa estatal e, portanto, deve responder aos desejos estabelecidos pelo acionista majoritário, o governo federal. Não se trata aqui de decisões casuísticas ou marcadas por algum tipo de oportunismo. A realidade é que as dimensões da empresa afetam de maneira significativa o ambiente econômico. Exatamente por isso é que a recuperação de seus investimentos se converte em uma necessidade premente para que o Brasil reencontre o caminho do desenvolvimento social, econômico e ambiental.


A choradeira dos especuladores parasitas é conhecida. Mas o governo deve ter força e firmeza necessárias para reafirmar a natureza pública da Petrobrás e a confirmar a prioridade das necessidades do conjunto da sociedade na comparação com o punhado de acionistas privados ávidos por resultados no curto prazo.


 

Paulo Kliass é doutor em economia e membro da carreira de Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental do governo federal.


As opiniões aqui expostas não representam necessariamente a opinião do Correio do Brasil




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