O significado da reeleição do Brasil nos Direitos Humanos da ONU
Por Rui Martins - O Brasil foi reeleito hoje, no Conselho de Direitos Humanos da ONU, um órgão contraditório de cuja composição sempre participam países violadores dos direitos humanos.
Apesar do envio de um manifesto de entidades brasileiras de direitos humanos a todos os países e da denúncia da Ordem dos Advogados do Brasil com o Instituto Vladimir Herzog sobre violações de direitos humanos, o Brasil foi reeleito como um dos membros representantes da América Latina no Conselho de Direitos Humanos na ONU.
Por Rui Martins, de Genebra:
O contraditório Conselho de Direitos Humanos da ONU
Ao mesmo tempo, no contraponto, foi também eleita a Venezuela, apesar de haver igualmente contra ela denúncias de violações de direitos humanos. Essa contradição, que coloca juntos Brasil e Venezuela, eleitos por países que votaram tanto pelo Brasil como pela Venezuela, mostra a dificuldade de se entender como funciona o Conselho de Direitos Humanos na ONU. Mesmo porque já se tornou comum a eleição de países, acusados de violarem os direitos humanos, para defenderem a aplicação dos direitos humanos no mundo.
O próprio Brasil, para não fazer inimigos e perder votos, deixou de atacar a Venezuela durante os dias que precederam as eleições de hoje. Tática vitoriosa, pois o Brasil conseguiu mais votos, 153, que há dois anos. Com isso, exultou a ministra Damares, achando ter sido essa reeleição do Brasil uma aprovação do presidente Bolsonaro e de seu discurso há algumas semanas na ONU.
Entretanto, essa é uma declaração apressada, pois a contradição do Conselho de Direitos Humanos de eleger países violadores dos direitos humanos não é de hoje, vem desde sua criação. Na verdade, esse Conselho não tem força jurídica para decidir por sentenças coercitivas. E muitos países buscam se eleger para se sentirem a salvo das denúncias.
Mas não é só isso. Os países negociam acordos e votos entre si, tendo em vista candidaturas em outros órgãos da ONU. Essa situação é sempre muito criticada pela hipocrisia nela inerente, porém os países são muito diferentes com valores e interpretações variáveis em termos de direitos humanos.
Em todo caso, o Brasil mudou de campo e se tornou conservador. Isso significa que perdeu o apoio dos países progressistas, mas ganhou o voto dos países totalitários, países com estritas leis religiosas que, não importa qual seja o credo dominante, são parecidas. A política homofóbica do governo brasileiro, com sua misoginia, seu zelo pela família e seus valores, coincide com a dos países religiosos muçulmanos.
Hoje eles apoiam o Brasil, porque esperam do Brasil o apoio na defesa de suas políticas religiosas repressivas.
O Brasil que vinha sempre se destacando por sua política progressista em matéria de comportamento, passará agora a votar e decidir segundo a cartilha conservadora e reacionária.
Embora país cristão, o Brasil passará a votar em favor das leis dos países que cerceiam a liberdade das mulheres, perseguem os homossexuais e aplicam mesmo a pena de morte.
E o Brasil estreará nessa nova posição política no Conselho de Direitos Humanos, votando pelo embargo de Cuba, contrariando o que fazia há 27 anos.
Por Rui Martins, de Genebra