Rio de Janeiro, 21 de Novembro de 2024

Medo injustificado

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Terça, 09 de Agosto de 2022 às 06:24, por: CdB

O que deve assombrar os brasileiros é a dependência das corporações militares em armas e equipamentos de potências estrangeiras. Em outras palavras: a incapacidade de defender o país com armas próprias e o permanente beneficiamento de complexos industriais-militares que aterrorizam o mundo.

Por Manuel Domingos Neto – de Brasília

Houve quem arrepiasse de medo ao ler a reportagem da Folha de S. Paulo publicada no último dia 3: “Exército compra equipamento para acessar celulares e silencia sobre motivos”. Nada mais compreensível, neste momento em que a democracia magrinha que nos sobrou está ameaçada.
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Centro de Defesa Cibernética Brasileira
O jornal insinua que o Exército se prepara para extrair “dados de telefones celulares, de sistemas de nuvem dos aparelhos e de registros públicos armazenados em redes sociais como Twitter, Facebook e Instagram”. Ora, isso é comezinho na inteligência militar. O jornal reportou que "a galinha come milho". Impossível corporações armadas se manterem avisadas sem recursos técnicos básicos. O jornalista diz que, “pela primeira vez”, o Exército compra tal tipo de ferramenta. O coronel da reserva do Heraldo Makrakris emendou: trata-se de “mais uma” ferramenta. A reportagem é tão rasteira e enganosa que outro coronel, Marcelo Pimentel, ironizou: "o jornalista devia ganhar um Pulitzer". O repórter fez o leitor pensar em ladroagem ao informar que a compra foi efetuada sem licitação. Não sabia que é bizarro anunciar esse tipo de compra? E que, se houve publicidade, foi intencional, como alertou o coronel Marcelo Pimentel?

Urnas eletrônicas

O repórter fez ainda o pobre leitor imaginar planos terríveis, ao destacar que a compra foi autorizada pelo general Paulo Sérgio, hoje ministro da Defesa dedicado a fustigar o TSE por conta de urnas eletrônicas. Nesses assuntos, as reportagens necessárias deveriam tratar das intenções dos vazamentos de notícias, ensina Piero Leirner, obstinado pesquisador da guerra híbrida. A atuação dos militares está dirigida para condicionamentos da sociedade. Interessa-lhes criar ambientes que chamam de “psicossociais” e, neste sentido, usam sorrateiramente a imprensa desavisada ou de má fé. Não cabe aos brasileiros temer a capacidade de espionagem das corporações militares. Guerreiros, quanto mais informados, melhor se preparam para suas missões. O que deveria preocupar são os propósitos da espionagem. Seria para acompanhar o passo a passo dos numerosos agentes estrangeiros imiscuídos em nossos negócios? O que deve deixar o cidadão inquieto é a obcecada preocupação do militar com o “inimigo interno”, que o transforma, para a alegria do potencial agressor estrangeiro, em caçador de cidadãos descontentes com o ordenamento socioeconômico. O que mete medo é o distúrbio de personalidade do militar brasileiro que, ao se dedicar à manutenção da lei e da ordem, abandona sua função precípua de preparar-se para enfrentar o estrangeiro hostil.

Corporações militares

O que deve assombrar os brasileiros é a dependência das corporações militares em armas e equipamentos de potências estrangeiras. Em outras palavras: a incapacidade de defender o país com armas próprias e o permanente beneficiamento de complexos industriais-militares que aterrorizam o mundo. Ao ocupar a mente dos brasileiros com potocas, jornalistas não ajudam a luta democrática. Atuam como transmissores de desígnios castrenses. Será que um dia veremos grandes jornais enviando repórteres à Washington para nos relatar o que diabo fazem as comissões das Forças Armadas brasileiras nos Estados Unidos? Isso, sim, amedronta. Desde a Segunda Guerra Mundial mantemos escritórios militares permanentes neste país. Os recursos públicos esbagaçados bastariam para mudar o rumo da prosa em política de Defesa. Estivessem as fileiras voltadas para dissuadir possíveis agressores estrangeiros, não lhes sobraria disposição para tutelar o Estado e a sociedade. A democracia estaria melhor protegida.  

Manuel Domingos Neto, é Doutor em História pela Universidade de Paris. Ex-presidente da Associação Brasileira de Estudos de Defesa (ABED). Foi vice-presidente do CNPq.

As opiniões aqui expostas não representam necessariamente a opinião do Correio do Brasil

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