“Os sindicatos, ditos representativos da categoria e que persistem em arrastar essa greve, são os mesmos que ficaram omissos nos seis piores anos para a educação brasileira.”
Por Luciano Rezende – do Rio de Janeiro
Mais uma greve envolvendo professores das Instituições de Ensino Superior federais se arrasta pelo país. O mais inacreditável nisso tudo é que os sindicatos ditos representativos da categoria, que persistem em arrastar essa greve até o “fim do mundo”, são os mesmos que ficaram omissos nos seis piores anos para a educação brasileira. Cordeirinhos com Temer e Bolsonaro. Leões com Dilma e Lula.
Infelizmente esses sindicatos se degeneraram por completo. Atuam como força auxiliar da extrema-direita. No Brasil, quando Dilma mais precisava de apoio, na antevéspera do Golpe, Andes e Sinasefe faziam uma cruzada pelo país, onde se podia ver faixas e panfletos em que a presidenta era retratada como uma ratazana, entreguista, vendilhona. Veio o Golpe e nossos revolucionários assistiram, debaixo de suas camas, um vendaval que varreu para longe muitas conquistas que levamos anos e anos para serem alcançadas. Agora, exigem uma reconstrução imediata.
A pequena-burguesia assumiu o controle de nossos sindicatos. Suas pautas são extremamente pequeno-burguesas. Foram contrários ao Reuni, à política de cotas e hoje bradam contra a criação de 100 novos institutos federais que, para eles, subtrai recursos que deveriam ser destinados para aumentar seus salários, gratificações e “estrutura” de trabalho. A pauta corporativista se sobrepõe aos interesses da Nação.
Mas nem sempre o movimento sindical foi assim. Pelo contrário.
Não muito tempo atrás, o movimento sindical enfrentava governos fascistas e ditatoriais. Ia para a linha de frente nas passeatas, piquetes ou barricadas. Não hesitava em tomar cacetada, mordida de cachorro ou até mesmo ir para a prisão. Por mais pressão que sofria, mais se mobilizava. Hoje, se compraz em enfrentar governos democráticos e progressistas. Não tem pudor em admitir, abertamente, que se aproveita da queda de popularidade de um governo popular para chantageá-lo com sua pauta oportunista, flertando com o fascismo que o apoia. Aproveita-se do caráter democrático deste governo para fazer suas cirandas e seus piqueniques em frente aos ministérios, no que costuma chamar de “aulas de cidadania”, sem ser incomodado.
Consciência de classe
Antigamente o grevista tinha consciência de classe (classe para si). Sabia que o elemento econômico não se sobressai ao elemento político. Avaliava o todo em detrimento do particular. As reivindicações eram baseadas na análise da correlação de forças e tinha claramente um objetivo tático em mente. O grevista de hoje é movido por interesses particulares (classe em si). Coloca seus desejos pessoais acima das demandas gerais. Usa exemplos generalistas (como o salário de um juiz ou de um policial federal) para justificar sua reivindicação individualizada. Vive no “Fantástico mundo de Bob” onde basta a vontade para fazer acontecer. A regra é colocar uma meta para depois dobrá-la e estender a greve até o fim do arco íris.
E era essa consciência de classe que fazia o sindicalista classista insistir na unidade. O discurso convencia e o seu exemplo arrastava as massas. Presente no dia a dia da categoria, realizava uma série de atividades, assembleias e reuniões, com diversos temas relacionados às demandas dos trabalhadores, para manter a coesão da luta. O sindicalista de resultados aposta na divisão. Seu discurso, além de raivoso, é totalmente descolado da prática. Realiza assembleias esvaziadas (adora atividades virtuais e remotas) onde uma minoria decide pela ampla maioria. Aparece de tempos em tempos para propor a única coisa que sabe defender: “a greve do fim do mundo”. Nesta fragmentação, uma grande parte da categoria vai se afastando e deixando as decisões serem tomadas ou manipuladas por essa cúpula.
Instrumento da greve
O sindicalista classista defendia o instrumento da greve no setor público com um dos últimos recursos. Tinha clareza de que o elemento espontâneo se submete ao elemento consciente. Tinha empatia com a sociedade e consciência dos impactos da paralisação das suas atividades para a população, sobretudo os mais carentes. Quando deflagrada uma greve, era após inúmeras discussões com o conjunto dos trabalhadores, através de seminários, audiências e assembleias. Com a ampla maioria convicta de que todos os canais já haviam se esgotado, aí sim, decidiam pela greve com uma pauta de reivindicação objetiva e exequível. Já a aristocracia operária (termo usado por Lênin) tem como lema “a greve pela greve” ou “o movimento é tudo; o objetivo, nada”. O espontaneísmo é o que lhe move. Como vive em uma bolha, não percebe o sofrimento que impõe ao usuário de seu serviço (que paga pesados tributos por ele) durante a greve. Não raramente, decide-se por uma greve com uma inexpressiva votação, em assembleia esvaziada, com uma pauta reivindicatória quem mescla algumas justas reivindicações com outros pontos totalmente subjetivos e inexequíveis.
Cada membro do sindicato classista atuava de forma voluntária e constantemente estava desempenhando outras atividades políticas fora do sindicato. Não tinha apego ao cargo, inclusive, corria risco de vida se ficasse muito visado pela reação (por isso era comum haver coordenações para não se personalizar em apenas um presidente ou diretor). Como era perseguido pelo patrão, sobrevivia da contribuição dos colegas. O sindicalista “profissionalizado” de hoje é praticamente perenizado no cargo. Não raramente está há décadas enraizado na chamada diretoria executiva. Sua vaidade é cultivada por uma meia dúzia de puxa sacos que adora chamá-lo de “capa”. Está constantemente participando de plenárias, cursos e reuniões financiadas pelo seu sindicato em hotéis à beira do mar. Descarado, suas redes sociais é farta de fotos nestes pontos turísticos, sempre “à serviço da causa”.
Essa estrutura sindical podre e carcomida vai cair. Mas sua queda precisa ser acelerada por todos os que temos compromisso com o povo, com a democracia e com a nação brasileira. Ou derrubamos essa máfia ou ela continuará derrubando projetos e governos progressistas.
Luciano Rezende, é engenheiro agrônomo (UFV), bacharel em Administração Pública (UFF), licenciado em Geografia (UERJ) e Letras (UFF). Professor Doutor do Instituto Federal de Brasília (IFB).
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