Inquéritos policiais, ou qualquer documento relativo à Segurança Pública, podem ficar sob sigilo por até 100 anos, é o que propõe o projeto do deputado Moroni Torgan (PFL-CE). A proposta de lei, que vem sendo discutida na Câmara Federal, dá aos governadores o poder de transformar em ultra-secretos quaisquer documentos relacionados a operações policiais.
A proposta já foi aprovada pela Comissão de Segurança Pública da Câmara e, depois de passar pela de Constituição e Justiça (CCJ), deverá ir ao plenário para votação.
O texto de Torgan é um substitutivo ao projeto de lei 4.004/2001, do deputado Lincoln Portela (PL-MG), que previa o sigilo de documentos sobre o planejamento e execução de operações policiais por até 72 horas após a conclusão das ações. Ao relatar o projeto, Torgan, que é delegado da Polícia Federal (PF), alterou totalmente o texto, transformando-o em uma proposta abrangente sobre sigilos de documentos públicos.
Críticas
- Ele matou o meu projeto - critica Lincoln Portela.
- Minha proposta era simples, só para evitar o vazamento de informações sobre ações policiais. Agora corremos o risco de virar uma ditadura da Segurança Pública - completa o deputado. Ele acredita, porém, que na CCJ a proposta será rejeitada.
O texto do deputado cearense amplia os prazos de sigilo de todos os documentos públicos, definidos por portaria de 2002, do ex-presidente Fernando Henrique. Os ultra-secretos passam de 30 para 50 anos; os secretos, de 20 para 30; os confidenciais, de 10 para 20; e os reservados, de cinco para 10. Os prazos podem ser prorrogados por igual período.
Professor de Sociologia Jurídica da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Geraldo Tadeu considera o projeto uma ameaça aos direitos humanos, à medida que a lei poderia ser interpretada como uma espécie de "licença" para todo tipo de desvio de conduta e crime.
- Bastaria que um superior hierárquico configurasse o caso como sigiloso e isentaria o criminoso de punição por 100 anos - disse.
Para ele, a classificação de documentos não pode ficar ao arbítrio de uma só autoridade, mas de grupo com participação da sociedade civil e do Ministério Público.
Vítimas temem a impunidade
Especialistas em Segurança Pública e vítimas da violência policial condenam a aprovação do projeto de lei.
- A impunidade vai atravessar o século. Quantas gerações vão esperar por justiça para os crimes cometidos por policiais? - criticou a jornalista Zilmar Basílio, 47 anos, da Associação Mães do Rio. Seu irmão foi morto a tiros, há dois anos, em Pendotiba, Niterói, na Região Metropolitana do Rio de Janeiro.
Para o sociólogo Gláucio Ary Dillon Soares, especialista em mortes violentas, a medida é absurda.
- Cercar a atividade policial de uma nuvem de silêncio é cegar a população para uma era de violência sem limites que não cabe no estado democrático - acredita.