Porém, no último dia 5 de agosto, o diretor do filme chamado Prédio da Caixa, Arthur Moura, foi surpreendido por uma notificação extrajudicial, em nome da Caixa Econômica Federal, solicitando que a palavra “Caixa” fosse suprimida do título da obra e de todas as publicações nas redes sociais.
Por Redação, com Brasil de Fato - do Rio de Janeiro
O despejo dos moradores do Edifício Nossa Senhora da Conceição, no centro de Niterói, na região metropolitana do Rio de Janeiro, completou dois anos em 2021. A história da remoção das famílias virou documentário e será lançado no próximo dia 2 de setembro pela produtora independente 202 Filmes.
Porém, no último dia 5 de agosto, o diretor do filme chamado Prédio da Caixa, Arthur Moura, foi surpreendido por uma notificação extrajudicial, em nome da Caixa Econômica Federal, solicitando que a palavra “Caixa” fosse suprimida do título da obra e de todas as publicações nas redes sociais.
O documentário tem uma hora de duração e conta com 15 depoimentos de ex-moradores e defensores de direitos humanos que denunciam a situação precária em que muitas das famílias despejadas do edifício encontram-se atualmente. Desempregados e sem acesso ao aluguel social, o destino de pessoas em situação de extrema vulnerabilidade social que habitavam o prédio acabou sendo as ruas.
Moura começou as filmagens em 2019 e foram concluídas somente dois anos depois. Como estratégia de divulgação do documentário, o cineasta e historiador liberou algumas entrevistas do filme nas redes sociais. Segundo ele, logo depois da publicação dos vídeos recebeu a notificação extrajudicial. Entre os pontos elencados no documento, está a solicitação de retirada do nome “Caixa” do filme.
“Deste modo, ante o potencial risco de lesão à imagem desta Empresa Pública Federal, assim como a possibilidade de o título em questão induzir em erro os espectadores fazendo-os crer que a Caixa Econômica Federal possui alguma responsabilidade sobre os fatos apresentados nos vídeos, o que por evidente geraria responsabilização de V.Sa. pelos danos observados em regresso, serve a presente para notificar os destinatários para que suprimam imediatamente o nome da Caixa do título do filme, bem como dos vídeos já existentes na rede social YouTube ou em quaisquer outras redes sociais ou veículos de comunicação”, diz o documento que ressalta ainda que medidas judiciais serão tomadas caso o pedido não seja acatado.
Silenciamento
O diretor do filme recebeu a notificação como uma tentativa de censura e de criminalizarção do filme num contexto político ultraconservador.
– Eu não vou tirar o nome, isso é um absurdo, é uma atitude extremamente perigosa porque se você chega ao ponto de criminalizar uma produção artística que não é uma produção do cinema rico, é do cinema pobre, que foi feito com R$ 1 mil, isso também mostra o desespero e o caráter de justiça dessas instituições burguesas que se incomodaram. Significa que a gente está no caminho certo – ressalta o cineasta.
Com o apoio de um advogado que está acompanhando o caso, Moura enviou uma contra-notificação à Caixa Econômica Federal. Nela, o diretor alega que o documentário não desabona a imagem da instituição pública e que o Edifício Nossa Senhora da Conceição é conhecido popularmente como “Prédio da Caixa”, possivelmente pela proximidade do banco que fica ao lado do imóvel e que a denominação já foi amplamente divulgada pela imprensa.
“No que respeita à vossa impertinente necessidade de que seja suprimido “o nome da Caixa do título do filme etc., vale esclarecer que o meu documentário não contém o “nome da Caixa”, ou referência a essa Empresa/Banco Público Federal, como vossas senhorias sublinham, mas a denominação popular emprestada ao prédio do Condomínio do Edifício Nossa Senhora da Conceição, naturalmente pelas circunstâncias geográficas”, diz um dos trechos do documento enviado pelo cineasta.
Moura ainda não obteve retorno da resposta enviada à Caixa, mas garantiu que o lançamento do filme vai acontecer em breve. A previsão é que no dia 2 de setembro ocorra a pré-estreia no canal do YouTube e Facebook do portal Esquerda Online a partir das 12h30. No dia seguinte, o lançamento será feito no canal da 202 Filmes, às 19h.
Outro lado
A reportagem procurou a Caixa Econômica Federal para um posicionamento sobre o caso. A empresa enviou a seguinte nota ao Brasil de Fato:
“A Caixa é a principal agente promotora de políticas públicas de habitação no país. O intuito da notificação extrajudicial foi advertir a produtora da utilização do nome “Caixa” no título do filme a fim de não gerar aos espectadores, ou destinatários da publicidade/divulgação do filme, a falsa ideia de que a Caixa possui relação com o empreendimento objeto do documentário, com isso causando danos à imagem desta instituição financeira”.
A empresa não respondeu a respeito das medidas judiciais que poderão ser tomadas caso o nome do filme não seja alterado.
Relembre o caso
O prédio foi desocupado no início do mês de junho. O edifício possui 382 unidades habitacionais e 13 lojas. Cerca de 1500 pessoas chegaram a morar no local que há anos é palco de conflitos de interesses em Niterói.
A decisão judicial que interditou o edifício alegou que o local encontrava-se em situação de risco. O fornecimento dos serviços de água e eletricidade foram cortados em março de 2019 sob a alegação de risco de incêndio pela precariedade das instalações.
A juíza Andrea Gonçalvez Duarte Joanes acolheu na íntegra o pedido do Ministério Público do Estado do Rio (MP-RJ) por meio da Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Defesa da Cidadania do Núcleo Niterói/Maricá e determinou que o município promovesse a retirada dos moradores do prédio e a proibição da circulação de pessoas.