Segunda, 07 de Dezembro de 2020 às 10:03, por: CdB
Em 12 de novembro, Bolsonaro indicou o tenente-coronel reformado do Exército Jorge Luiz Kormann para assumir um dos cinco cargos de diretoria da Anvisa. Sem experiência em medicina ou desenvolvimento de vacinas, Kormann deve liderar a unidade encarregada em dar sinal verde aos imunizantes.
Por Redação - de Brasília
O presidente Jair Bolsonaro tenta assumir o controle da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), em uma articulação que alguns especialistas em saúde temem ser capaz de politizar o órgão regulador e conceder ao mandatário neofascista — um dos mais proeminentes céticos em relação ao coronavírus, no mundo — as rédeas sobre aprovações de vacinas contra a covid-19. A denúncia foi publicada, nesta segunda-feira, pela agência inglesa de notícias Reuters, uma das mais influentes do mundo, e levanta um sinal de alerta para os países que produzem e testam as vacinas contra o novo coronavírus.
“Em 12 de novembro, Bolsonaro indicou o tenente-coronel reformado do Exército Jorge Luiz Kormann para assumir um dos cinco cargos de diretoria da Anvisa. Sem experiência em medicina ou desenvolvimento de vacinas, Kormann deve liderar a unidade encarregada em dar sinal verde aos imunizantes. Caso o nome seja confirmado pelo Senado, como se espera, aliados de Bolsonaro ocuparão três das cinco diretorias da Anvisa, o que lhes dará maioria em todas as decisões da agência”, acrescenta o portal de notícias.
— A Anvisa hoje esta sendo aparelhada por diretores aliados com a postura negacionista e irresponsável do ponto de vista sanitário do Bolsonaro — disse o deputado Alexandre Padilha (PT-SP), ex-ministro da Saúde.
Antivacinação
A agência entrevistou mais de uma dezena de autoridades antigas e atuais, governadores e parlamentares sobre os planos de Bolsonaro para a Anvisa, um órgão regulador responsável pela aprovação de medicamentos, dispositivos e tratamentos.
Muitos afirmaram ter preocupação de que a crescente influência do presidente na Anvisa esteja politizando a agência, que vai ter a função de aprovar diferentes vacinas em teste no Brasil. Embora não tenham citado evidências específicas, alguns têm receio de que Bolsonaro, de olho na reeleição em 2022, possa usar as aprovações da Anvisa para acelerar as vacinas a aliados e retardar a chegada aos rivais.
Outros temem que a resistência de Bolsonaro às vacinas contra o coronavírus se infiltrará na Anvisa, minando a credibilidade e alimentando o crescente fervor antivacinas no país. A Anvisa disse que é prerrogativa de Bolsonaro indicar diretores, cabendo ao Senado confirmá-los. “A Anvisa não tem ... participação nesse processo”, afirmou em nota, recusando-se a fornecer mais comentários.
Anticientífico
O Palácio do Planalto não respondeu às tentativas de contato do Correio do Brasil, para que confirme, ou negue, as informações da Reuters. O Ministério da Saúde, onde Kormann trabalha atualmente como secretário-executivo adjunto, também não quis comentar. O executivo não respondeu às solicitações enviadas pela agência, ao seu email.
Bolsonaro tem repetidamente minimizado a gravidade da covid-19 e elogiado o medicamento contra a malária hidroxicloroquina, que não tem comprovação científica contra a doença e que ele diz ter tomado quando contraiu o coronavírus em julho. Na semana passada, ele disse que não tomaria qualquer vacina contra o coronavírus que se tornasse disponível. Bolsonaro afirmou que a recusa é seu “direito” e que não espera que o Congresso determine a obrigatoriedade das imunizações.
O apoio público à vacinação contra covid-19 está caindo em todo o Brasil, de acordo com pesquisa Datafolha de novembro com moradores de quatro grandes cidades. Em São Paulo, por exemplo, 72% dos entrevistados disseram que tomariam a vacina, queda de 7 pontos em relação ao mês anterior, enquanto o apoio à imunização obrigatória caiu 14 pontos, para 58%.
Sem experiência
Silvia Waiãpi, 2ª tenente do Exército e secretária especial de saúde indígena do Ministério da Saúde, disse esperar que a formação militar de Kormann fortaleça a Anvisa.
— O presidente Bolsonaro está colocando o país em ordem. A Anvisa é um órgão importante no Brasil e observa-se o extremo zelo e cuidado pra gerir as coisas ali — afirmou Waiãpi, à Reuters.
No entanto, a Univisa, associação dos trabalhadores da Anvisa, e o Sinagências, sindicato nacional dos servidores das agências de regulação, se opuseram publicamente à indicação de Kormann por falta de experiência relevante.
Os presidentes brasileiros sempre nomearam diretores da Anvisa. Mas a agência, tradicionalmente, tem agido de forma independente, e seus diretores escolhidos pela experiência, segundo funcionários atuais e antigos entrevistados pela agência.