Rio de Janeiro, 21 de Novembro de 2024

Como os israelenses não se rebelam

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Terça, 01 de Outubro de 2024 às 09:54, por: CdB

O assassinato, pela extrema-direita israelense, do líder do Hezbollah irá aumentar prevenções na região e no mundo.

Por Milton Rondó – de Brasília

“…a atitude dos estrangeiros para com os russos que vivem na Europa. (Turguiênev) contou, com grande expressão artística, as trapaças inteligentes e mesquinhas que os estrangeiros usavam para esbulhar os russos, para apoderar-se de suas posses, para induzi-los a fazer testamentos a seu favor etc. Mais tarde, lembrei-me muitas vezes dessa conversa e lamentei que essas argutas observações, e naturalmente muitas outras semelhantes a elas, reunidas ao longo de demorada residência no exterior, nunca tivessem sido confiadas à impressão.” – Nikolai Strahov

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O premiê de Israel, Benjamin Netanyahu, discursa na Assembleia Geral da ONU, em 27 de setembro de 2024

Somos poços de preconceitos, que nada mais são do que pré-conceitos. Ou seja, julgamentos açodados, precários, carentes dos elementos minimamente necessários para uma correta avaliação.

Vivemos um reviver de xenofobias, contra latino-americanos, russos, árabes etc.

Além daqueles, contra LGBTIA+s, africanos ou de origem africana, evangélicos e assim por diante.

Vamos fechando nossos mundos, olhando para trás, ao invés de olhar para a frente, restringindo até o próprio ar de que necessitamos para viver.

Interessante notar que, em inglês, os conceitos de preconceito e prejuízo se assimilam em uma única palavra: prejudice.

Em português, preconceito também significa prejuízo, como nos atestam os dicionários. No entanto, quase não utilizamos a palavra com esse sentido, embora devêssemos fazê-lo, para ressaltar o prejuízo que um preconceito causa.

De fato, os preconceitos prejudicam, impedem de ver a verdade e até o amor.

À direita, são mais comuns e quase ditam o ideário conservador, mas tampouco deixam de assombrar a esquerda, embora em grau menor.

Com efeito, boa parte das dificuldades da esquerda passa pela superação de preconceitos: de LGBTQIA+ por russos e árabes; de imigrantes, pelos países do Norte; de evangélicos, por parte dos progressistas brasileiros.

No Oriente Médio, porém, as contradições se agudizam.

O assassinato, pela extrema-direita israelense, do líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah, na última sexta-feira, irá aumentar prevenções na região e no mundo.

Por outro lado, o “preconceito positivo” que a comunidade internacional tinha com relação a Israel, pelos seis milhões de mortos, trucidados pela extrema-direita alemã na Segunda Guerra Mundial, fazia com que não se assimilasse Benjamin Netanyahu, primeiro-ministro de Israel, a Adolf Hitler, quando é exatamente disso que se trata: ambos genocidas; imperialistas, ocupando e bombardeando os países vizinhos; totalmente irresponsáveis com relação ao direito e à comunidade internacional.

Pior, aos sionistas foi permitido até deter armas atômicas, as quais lhes dão retaguarda para terrorizar todos os países e povos da região.

Como as maiorias se deixam dominar por minorias tão abjetas? Como os israelenses não se rebelam? Os ucranianos? Nossos vizinhos argentinos? Nós, por que permitimos tantos golpes de Estado no Brasil, inclusive o mais recente, de 2016?

Talvez, a concentração de renda, riqueza e poder tenha algo a ver com isso: o último relatório da Oxfam, divulgado às vésperas da abertura da Assembleia Geral da ONU, informa que a renda de 1% da população é superior à de 95% dos habitantes desta triste Terra…

Por que não nos revoltamos com um dado tão evidente, de uma injustiça tão brutal? Quem banca a minoria que nos tiraniza?

Sabemos que os meios de controle da população são variados e, cada vez mais, sofisticados.

No Brasil, temos uma combinação de escassa escolaridade, monopólio da “grande” imprensa e restrição de acesso à cultura para as classes populares.

As classes altas estão totalmente hegemonizadas, cultural e politicamente, por EUA, Canadá e Europa Ocidental.

Esse modelo, em maior ou menor grau, é predominante na maioria dos países do Sul.

Em O método ver-julgar-agir (editora Vozes), de Agenor Brighenti, a questão da reflexão, da ação e da prática é ressaltada, como forma ideal de aprendizagem:

“…pelas perguntas relativas ao sujeito social, às condições materiais do conhecimento e a formulação da verdade…A questão dos ‘sujeitos’ rompe com a pretensão de objetivimos dos meios positivistas…Há sempre um sujeito que vê, e sua visão é contingente a pressupostos e supostos inevitáveis.

Oriente Médio

Entretanto, embora marcada pela subjetividade, quando a leitura da realidade está mediada por instrumentos analíticos, não só o subjetivismo é controlado, como temos sujeitos produzindo um conhecimento a respeito deles mesmos. Além disso, o ato de conhecer se constitui, por si só, uma intervenção na realidade que se quer transformar, portanto, em um ato político…A questão dos ‘lugares’, por sua vez, rompe com a pretensão de universalismo ou de um saber essencialista e a-histórico, consciente da relatividade de toda prática”.

No mesmo volume, o autor complementa essa ponderação:

“Dado que a história pessoal do observador vai sempre se realizando através de um processo que inclui o contato com a realidade agora observada, há no objeto um aspecto de sujeito. E como o sujeito não é uma razão pura, mas imerso num contexto sócio-histórico dado, inevitavelmente está movido por interesses pessoais e coletivos.”

Tenhamos claro, portanto, que estamos enfrentados a uma extrema-direita, nacional e internacional, que é a herdeira direta de Hitler e Mussolini, coordenada, operando com os mesmos métodos nazi-fascistas, adaptados, como o fazem Pablo Marçal, Bolsonaro, Milei etc.

O nível de controle e manipulação da realidade, por eles, não pode ser menosprezado, pois atinge os mais altos graus, inclusive em âmbito internacional. Um exemplo: tanto a TV pública francesa France 24 Heures, quanto à agência britânica de notícias BBC, fizeram, em suas imagens, um recorte do plenário da Assembleia Geral da ONU, de forma que não se pudesse perceber que a sala estava praticamente vazia, pela saída das delegações, incluída a do Brasil, em protesto pela fala, naquele pódio, do monstro Adolf Netanyahu Hitler.

 

Milton Rondó, é diplomata aposentado.

As opiniões aqui expostas não representam necessariamente a opinião do Correio do Brasil

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