Os maiores índices de contaminação foram registrados em Roraima (onde fica a maior parte da reserva indígena Yanomami): cerca de 40% dos peixes analisados tinham níveis do metal altamente tóxico acima dos limites recomendados.
Por Redação, com Brasil de Fato - de Brasília
Um estudo revelou detalhes de mais um problema grave causado pelo garimpo na região amazônica: a alta concentração de mercúrio em peixes consumidos por pessoas que vivem na região. Segundo a pesquisa, o volume de mercúrio encontrado em peixes coletados nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia e Roraima é 21,3% acima dos níveis permitidos, o que pode trazer graves consequências à saúde de quem os consome.
Enquanto a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) estabelece o limite de 0,5 micrograma de mercúrio por grama de alimento, em algumas amostras de peixes coletadas pelos pesquisadores o potencial de ingestão chegou a ser 27 vezes maior que esse valor.
A pesquisa foi conduzida por cientistas da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca da Fundação Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz), da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA) e das organizações Greenpeace, Iepé, Instituto Socioambiental e WWF-Brasil.
Os maiores índices de contaminação foram registrados em Roraima (onde fica a maior parte da reserva indígena Yanomami): cerca de 40% dos peixes analisados tinham níveis do metal altamente tóxico acima dos limites recomendados. Em análises isoladas em municípios amazonenses, esse índice passou de 50%, mas no total do estado os peixes com mercúrio acima do limite eram 22,5%.
"Os garimpos utilizam amplamente o mercúrio metálico no processo de separação do ouro. Porém, este mercúrio é despejado no ambiente sem qualquer cuidado e se acumula no sedimento dos rios. Ali, converte-se em metilmercúrio (a forma química mais perigosa), onde é incorporado aos organismos aquáticos", explica o estudo.
Riscos à saúde
Doutor em saúde pública e pesquisador da Fiocruz, o professor Paulo Basta foi um dos participantes da equipe que realizou o estudo. Em conversa com o Brasil de Fato ele explicou que as principais consequências são relativas ao sistema nervoso.
– A pessoa pode perder a capacidade de visão, o campo visual fica diminuído, a pessoa fica a com olhar tubular, pode ter sinais de dor de cabeça crônica e irritabilidade, labilidade moral, depressão, insônia. Então são sinais variados que pode se confundir com outras doenças – alertou.
Também há chance de problemas motores. Perda de força das mãos, dificuldade de caminhar ou subir escadas são algumas das dificuldades apresentadas. Em casos graves, a evolução da doença pode fazer com que a pessoa passe a depender de cadeira de rodas.
O risco para mulheres grávidas é ainda maior. O mercúrio consumido tem capacidade de passar pela barreira placentária e ser transmitido para o cérebro do feto. Os efeitos variam muito, mas em casos graves de contaminação, é grande a chance de aborto ou de má formação congênita do bebê, caso a gestação vingue.
Mais de mil peixes analisados
Os pesquisadores coletaram as amostras de peixes em locais como mercados públicos, feiras livres ou diretamente com os pescadores. Os peixes carnívoros, que são mais consumidos pela população, apresentaram níveis de contaminação até 14 vezes maiores que os das outras espécies.
Para os pesquisadores, os resultados do levantamento deixam ainda mais claras as consequências negativas da atividade garimpeira ilegal. "O garimpo acaba, no final das contas, sendo um indicador de injustiça, de desigualdade social, de concentração de renda e isso tudo acaba aumentando ainda mais a a pobreza que é verificada nessas regiões", complementou Paulo Basta.