A juventude perdida de Zurique

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Publicado segunda-feira, 8 de agosto de 2005 as 09:28, por: CdB

Quase na metade do seu percurso, surge, no Festival de Locarno, um segundo filme digno de um Leopardo de Ouro. Trata-se de Snow White ou Branca de Neve, co-produção suíço-austríaca, dirigida pelo conhecido cineasta de Zurique, Samir, vindo de Bagdá para a Suíça aos sete anos, onde se dedicou ao cinema e criou uma empresa de produção fornecedora de filmes para a televisão suíça.

Curado do esquerdismo do passado, para poder sobreviver, Samir ainda conserva nos seus filmes uma análise social da juventude. Assim acontece com Snow White, retratando uma filha da alta sociedade de Zurique, a cidade podre de rica, no dizer de Paco, o cantor de rap, ao chegar nesse centro financeiro suíço, onde iria conhecer Branca de Neve.

Não é preciso se recorrer a Jean Ziegler, o inimigo número um do segredo bancário, para se saber que a Suíça desfruta de uma surpreendente riqueza, por abrigar mais de um trilhão de dólares aspirados do terceiro mundo por seus bancos. As famílias que gerenciam essas riqueza se distanciam da noção do valor das coisas e se perdem em depressões ou continuam multiplicando seus lucros, enquanto a juventude suíça é uma das líderes em suicídio e consumo de drogas.

O comércio livre da droga da Platzspitz, dos anos 80, se deslocou para as festas e discotecas dos filhos da abastança. Essa a sociedade mostrada pelo filme de Samir, onde Branca de Neve encontra o rappeur Paco, filho de imigrantes espanhóis em Genebra, orgulhoso de sua moral esquerdista anti-drogas e anti-detentores de riquezas de origem duvidosa:

– Eu quis criar um filme para os expectadores refletirem, diz Samir, oposto a um cinema Ovomaltine, no qual tudo vai bem, tudo é justo na Suíça. Prefiro o cinema de contradições. São nossas vidas que criam as histórias de filmes. Os filmes são os contos modernos e meu objetivo é o de comprimir muitas histórias de vidas numa história para fazer refletir nossa sociedade.

Samir é cauteloso ao responder se o filme tem alguma relação com a praça financeira enriquecida com o dinheiro roubado do terceiro mundo, mas reconhece que suas preocupações esquerdistas da juventude nele se manifestam, mesmo se o objetivo principal do filme foi o de contar uma história. Falando de Jean Ziegler, o cru analista da sociedade suíça, Samir diz preferir manter distancia, pois um filme sobre ele representou um corte de um milhão nas subvenções para o cinema.