A resolução do Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores pedindo mudanças na política econômica deu nova moldura à boa discussão, e lançada em boa hora, pela ministra Dilma Roussef sobre as posições da equipe que comanda as regras governamentais da economia nacional.
Afinal de contas, o PT e o governo chegaram à discussão a que chegam todos os governos brasileiros, aquela entre monetaristas e desenvolvimentistas, num quadro cujas tintas são definidas, faz muito tempo, pelos primeiros. Pensar que um governo de esquerda - este ou outro - também não chegaria a essa discussão, seja mesmo no capitalismo surreal em que vivemos ou num hipotético socialismo real, é desconhecer o país, eternamente comprimido entre uma poupança continuamente pulverizada e uma privatização secular dos espaços públicos, o que conformou uma cultura política renitentemente conservadora entre nós, aplicada em preservar os gordos anéis dos ricos, as pequenas alianças dos remediados e a capacidade mínima de amealhar migalhas dos dedos magros dos mais pobres. Não há novidade nisso. Até mesmo durante os governos da ditadura militar, até mesmo durante os oito anos de FHC, amplamente dominados pelas teses neo-liberais, desenvolveu-se essa discussão.
No caso do governo petista, ela ficou relativamente abafada pelo afã em demonstrar governabilidade graças ao esforço de construir uma imagem de ortodoxia econômica e à subordinação da discussão partidária às conveniências de governo.
A tal da governabilidade revelou não ter bases sólidas, construída que foi por alianças improcedentes e impertinentes, além de intempestivas, no plano político, e solapada pela falta de uma real política de comunicação do governo, que não conseguiu sequer capitalizar os inegáveis avanços nas políticas sociais, ainda que tímidos em relação ao possível. O governo não conseguiu nem mesmo capitalizar ainda os aspectos positivos de sua própria política econômica. Ainda que de um modo inteiramente ortodoxo, o famoso "fora FMI" das esquerdas acaba de concretizar-se, com a quitação da dívida com aquele organismo internacional que monitorou quase todo o governo anterior. Resta a pergunta se haveria outro caminho de livrar-se desse monitoramento que não passasse por esta quitação; que me conste, salvo melhor juízo, e peço ser informado a respeito, a própria Argentina, que negociou a redução da dívida com outros credores, respeita seus pagamentos e acordos com o Fundo Monetário.
Mas há uma novidade nesta boa discussão entre monetaristas e desenvolvimentistas, ainda que feita nesse momento em geral mau para o governo. As oposições, salvo por uma ou outra voz isolada de economista atento, inteiramente engolfadas no seu afã (golpista sim senhor) de arrasar a governabilidade do Palácio do Planalto, antecipando o processo eleitoral por nocaute técnico, as oposições, repito, ausentaram-se inteiramente dessa discussão. Ela antes englobava forças no interior do governo, e tinha ressonância na oposição feita pelo PT. Agora isso acabou; é verdade que as oposições estão parcialmente comprimidas pela obrigação que sentem em conceder validade aos aspectos conservadores da política econômica do governo, que são os da ortodoxia monetária. Ao mesmo tempo elas também se sentem parcialmente paralisadas diante da ousadia e dos sucessos obtidos pela política externa brasileira, que, no momento, é o braço esquerdo, junto com o MDA, mais em evidência do governo, e que também, no longo prazo, tem reflexos econômicos. Mas a ausência das oposições nessa discussão é sintoma de algo maior: ela mostra que, ao longo dos oito anos de governo de FHC, elas se despiram, e despudoradamente, de qualquer projeto de país para o Brasil. Seu projeto, se é que se pode chamar isso de projeto, é inteiramente gestionário; talvez o único projeto mesmo que as oposições tenham seja o de neutralizar a política externa do Itamaraty, devolvendo-a ao paradoxal bom mocismo de comportamento aparentemente sisudo e g